O direito de dissolução das câmaras eletivas dos parlamentos foi genericamente consagrado nas constituições liberais europeias do século XIX como uma das prerrogativas dos chefes de Estado no exercício do poder executivo que lhes era atribuído. Em Portugal, a Carta Constitucional de 1826 instituiu um quarto poder – o Poder Moderador – que acrescentou aos tradicionais poderes legislativo, executivo e judicial e que pertencia exclusivamente ao monarca, em acumulação com o poder executivo, do qual era o chefe. Por influência de Benjamim Constant, uma das competências régias no âmbito do poder moderador era a da dissolução da Câmara dos Deputados, que o monarca podia decretar quando o exigisse “a salvação do Estado”. Tratava-se de uma medida excecional que deveria ser utilizada apenas em casos extremos da vida política nacional. Mas esta prerrogativa régia viria a ser banalizada, tornando-se um expediente político utilizado pelos governos para obterem maiorias parlamentares através do recurso a eleições fraudulentas. As práticas políticas afastaram-se significativamente da norma constitucional e as dissoluções da câmara eletiva viriam a desempenhar um importante papel no funcionamento do regime.
Neste texto abordam-se as normas constitucionais e analisam-se as dez dissoluções da câmara dos deputados decretadas entre 1834 e 1865, evidenciando-se o enorme intervalo que separa a constituição formal da constituição real, resultando esta das práticas políticas dos agentes do poder e das próprias instituições.