Professor Luís Moita, inspiração Humanista e UALista
O Professor Luís Moita dedicou-se à Universidade Autónoma de Lisboa (UAL) em 1988, aqui iniciando a sua atividade pedagógica no Departamento de Sociologia e assumindo depois as funções de Vice-Reitor, entre 1992 e 2009 e de Diretor do Departamento de Relações Internacionais, entre novembro de 2007 e setembro de 2019.
Professor Catedrático em Relações Internacionais, esta área científica beneficiou enormemente das suas atividades académicas e científicas, incluindo pelas diversas unidades curriculares de que foi responsável (desde “Sociologia das Relações Internacionais” ao Seminário doutoral sobre “Questões Epistemológicas, Metodológicas e Analíticas”, “Teoria das Relações Internacionais” ou “Seminário de Promoção da Paz”); os vários cursos que ajudou a construir (incluindo várias pós-graduações, os Mestrado em Estudos da Paz e da Guerra e Mestrado em Relações Internacionais e o Doutoramento em Relações Internacionais: Geopolítica e Geoeconomia); a criação do programa de Cátedras destinado a trazer à UAL prestigiados professores nacionais e estrangeiros (Cátedra H. Mackinder de Geopolítica, Cátedra J. Schumpeter de Economia Internacional, Cátedra F. Braudel de Teorias das RI e Cátedra N. Bobbio de Direitos Humanos); ou os projetos de investigação coletivos que liderou, destacando-se “Aliança das Civilizações: Uma Possibilidade?” (elaborado em estreita colaboração com a Iniciativa das Nações Unidas, inicialmente como “dossiê temático” para o Anuário Janus e cuja versão em inglês foi distribuída aos participantes do 2º Fórum da Aliança das Civilizações, em Istambul, em abril de 200); “Metamorfoses da Violência”; “Estudo da Estrutura Diplomática Portuguesa”; “Cidades e Regiões – Paradiplomacia Portuguesa”; os três estudos associados ao 4º Congresso Internacional do OBSERVARE – O Multilateralismo, Condição de Governação Global (“O Conceito de Nova Ordem e os Regimes Institucionais”, “Democracia Cosmopolita e Constitucionalismo Global” e “Uma Arquitectura Multi-Nível para a Governação Global”); ou ainda “Movimentos Sociais Transnacionais” em que estava a trabalhar quando partiu.
São, de facto, muitas as iniciativas e atividades que o Professor Luís Moita idealizou e concretizou na UAL. Exemplos disso são o Instituto Sócrates para a Formação Contínua e, em particular, o Observatório de Relações Exteriores que fundou, em 1996 e recriaria depois como verdadeiro centro de investigação com a designação internacional abreviada de OBSERVARE, em 2010. Outros exemplos paradigmáticos são as publicações periódicas editadas pelo OBSERVARE: o Anuário Janus, em 1996, que criou sob o mote de ser uma publicação “de especialistas para não especialistas” e que congrega dezenas de artigos em cada edição revisitando os temas centrais de cada ano em textos de análise objetivos e ilustrados por infografia selecionada; e a revista científica JANUS.NET, e-journal of International relations criada, em 2010, segundo critérios de rigor comprovados pela avaliação por pares e reconhecida pelas múltiplas indexações internacionais, incluindo a Scopus. E tal como o Professor Luís Moita sempre defendeu, como parte serviço à comunidade, quer o Anuário quer a Janus.net quer outras publicações e estudos estão disponíveis em acesso livre no website do OBSERVARE.
Foi também iniciativa do Professor Luís Moita, e sob a sua coordenação, a organização dos quatro Congressos Internacionais do OBSERVARE realizados até ao momento (2011, 2017, 2017 e 2021) e que acompanharam as grandes problemáticas internacionais, reunindo uma multiplicidade de parceiros institucionais e prestigiados especialistas nacionais e estrangeiros, Congressos esses que se afirmam como a mais relevante conferência realizada em Portugal na área das Relações Internacionais. E por ocasião desses Congressos, foi ele que concebeu o “Prémio OBSERVARE” destinado a homenagear pessoas individuais e coletivas que sejam exemplos inspiradores, seja pelos contributos intelectuais, seja pela ação dirigida à solidariedade entre os povos ou à resolução pacífica dos conflitos. Reconhecidos com esse Prémio OBSERVARE foram a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e o Professor Mariano Aguirre, em 2014; o Conselho Português para os Refugiados (CPR) e a Doutora Catarina de Albuquerque, em 2017; e o Instituto da Defesa Nacional (IDN) e o Secretário-Geral da ONU, António Guterres, em 2021.
O legado académico e científico do Professor Luís Moita é imenso, contribuindo de forma ímpar para o reforço do prestígio, da visibilidade e da internacionalização da UAL e dos seus Departamento de Relações Internacionais e OBSERVARE.
Independente da área científica de maior paixão e labor, o Professor Luís Moita foi reconhecido por todos como um estudioso e conhecedor profundo de muitas outras áreas, da Ética (área em que se doutorou, em 1967, pela Universidade Lateranense de Roma) à Sociologia, da Teologia a História, Ciência Política, Geografia, Geopolítica ou Epistemologia nas Ciências Sociais. Questionava-se sempre e procurava sempre saber mais sobre questões conceptuais e teóricas, de política nacional e internacional ou acerca de problemas sociais com base na sua própria experiência. Para ele, a vida, a sociedade e a Academia eram processos inacabados de aprendizagem que estavam sempre em construção. Por outro lado, o conhecimento científico deveria estar ao serviço da comunidade, do mesmo modo que o estudo da realidade deveria servir, quando possível, para intervir numa sociedade e num mundo sempre possíveis de melhorar.
O seu carácter afável e cordial, o sorriso fácil e aberto, e a forma simples de se relacionar com os outros aproximava as pessoas que com ele se cruzavam, fossem colegas, alunos, funcionários ou colaboradores. Para uns, Luís Moita era o modelo supremo de Professor, Académico, Vice-Reitor ou Diretor; para outros, representava o acolhimento e a cordialidade; para outros ainda, a experiência que uma vida rica e tão diversificada proporcionou, incluindo momentos difíceis quando confrontou o velho regime do Estado Novo. E para muitos, o Professor Luís Moita era tudo isto.
Era um homem de esperança, de relações e de construções. Em tudo, a sua essência revelava a forma extraordinária de entender a pedagogia, o trabalho académico e científico e as relações humanas e sociais. O Professor Luís Moita era um negociador de vontades, procurando focar-se no melhor de cada um, entendendo diferentes maneiras de ser e procurando compatibilizar todos. A sua humildade intelectual, a invulgar capacidade de ouvir e atender o outro, respeitando as diferentes perspetivas e com elas tentar apreender, ao mesmo tempo que atraía com o seu vasto conhecimento e visão humanista, ou ainda de decidir coletivamente caracterizavam os dias de trabalho deste Professor. Com todos prevalecia a amizade que cultivava, e o exemplo que era sem o pretender ser.
Ser professor requer, entre outras características, ter curiosidade científica, procurar o conhecimento, criar um pensamento lógico, possuir capacidade de comunicação, seguir o rigor metodológico, demonstrar e estimular espírito crítico, ter dedicação e interesse pelas matérias, manifestar atenção pelos estudantes e envolvimento com os temas que se estuda e ensina. Mas, além destas qualidades que o Professor Luís Moita reunia e que a vida lhe permitiu aprimorar, um outro traço de personalidade se destacou, e que talvez melhor o definiu ao longo da vida: o humanismo. O Professor Luís Moita foi, antes de mais, um humanista, sempre focado nas pessoas, porque eram as pessoas que mais lhe interessavam. Por tudo, o Professor Luís Moita foi, e será sempre, para todos, uma inspiração.
Luis Tomé e Brígida Brito
Diretor e Subdiretora do Departamento de Relações Internacionais da UAL
Texto publicado na Revista Autónoma, nº 2 e no livro “Em torno do Pensamento de Luís Moita. Humanismo e Relações Internacionais”, pp. 467-471, https://doi.org/10.26619/978-989-9002-28-9.35