OBSERVARE
Universidade Autónoma de Lisboa
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 13, Nº. 1 (Maio-Outubro 2022)
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DIREITOS DA NATUREZA COMO UM ENQUADRAMENTO POTENCIAL PARA A
TRANSFORMAÇÃO DAS COMUNIDADES POLÍTICAS MODERNAS
CARLOTA HOUART
carlotahouart@gmail.com
Licenciada em Relações Internacionais e mestre em Relações Internacionais Estudos da Paz,
Segurança e Desenvolvimento pela Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra. Foi
investigadora júnior do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra entre 2018 e 2021
e, atualmente, está a fazer o seu doutoramento como investigadora na Universidade de
Wageningen (nos Países Baixos) no âmbito do projeto “RIVERHOOD – Living Rivers and New
Water Justice Movements”, financiado pelo European Research Council (ERC grants). Os seus
interesses de investigação atuais incluem Ecologia Política Crítica; Direitos da Natureza e Justiça
Multiespécies; Teoria Crítica das Relações Internacionais e Pós-Antropocentrismo; e Sistemas de
Conhecimento e Ontologias Indígenas.
Resumo
Este artigo centra-se no contexto atual das crises climática e ambiental e na forma como estas
desafiam fundamentalmente as normas, conceções e práticas inerentemente antropocêntricas
da política internacional e das RI. Defendo que, para enfrentar o modo hegemónico e
antropocêntrico de relação com a natureza não-humana que conduziu a estas crises, é
necessário desenvolver quadros alternativos que possam levar a uma transformação gradual
das comunidades políticas modernas. Partindo da Teoria Crítica das RI, sugiro que as críticas
de Andrew Linklater e Robyn Eckersley a Vestefália e propostas para a sua transformação
possam ser úteis para compreender como o movimento emergente dos Direitos da Natureza
pode promover tal transformação. Analiso dois casos paradigmáticos do movimento dos
Direitos da Natureza - o caso do Rio Whanganui em Aotearoa Nova Zelândia, a nível local; e
a Constituição do Equador de 2008, a nível nacional - para refletir brevemente sobre os
entendimentos alternativos de conceitos como comunidade, subjetividade, agência, voz,
direitos, participação e representação que eles encorajam. Ao expandir estes conceitos de
modo a incluir o mundo mais-do-que-humano, estes quadros de RoN convidam a uma
transformação dos sistemas modernos de pensamento e prática, e - em certa medida -
constituem um potencial para a transformação das comunidades políticas modernas de modo
a permitir uma melhor resposta às crises climática e ambiental globais.
Palavras-chave
Relações Internacionais; Comunidade Política; Direitos da Natureza; Seres Não-Humanos;
Crise Climática
Como citar este artigo
Houart, Carlota (2022). Direitos da natureza como um enquadramento potencial para a
transformação das comunidades políticas. In Janus.net, e-journal of international relations.
Vol. 13, 1, Maio-Outubro 2022. Consultado [em linha] em data da última consulta,
https://doi.org/10.26619/1647-7251.13.1.9
Artigo recebido em 15 Junho 2021 e aceite para publicação em 5 Março 2022
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Direitos da Natureza como um enquadramento potencial para a transformação
das comunidades políticas modernas
Carlota Houart
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DIREITOS DA NATUREZA COMO UM ENQUADRAMENTO
POTENCIAL PARA A TRANSFORMAÇÃO DAS COMUNIDADES
POLÍTICAS MODERNAS
1
CARLOTA HOUART
Introdução
As crises climática e ambiental colocam desafios significativos à política internacional e
às Relações Internacionais (RI). O aquecimento global, a subida do nível do mar, os
fenómenos climáticos extremos, a destruição de ecossistemas e o sexto fenómeno de
extinção em massa tornam inegavelmente clara a inseparabilidade e interdependência
das sociedades humanas e da vida não-humana. Estes processos de mudança global
rápida desafiam diretamente o dualismo cartesiano que surgiu na Europa durante o
Século das Luzes (Merchant, 1980) e que vê a humanidade como separada e em controlo
da natureza - uma crença que tem sido central para as RI e o seu estudo da política
mundial desde o desenvolvimento do sistema de Estados moderno e da economia
mundial capitalista (Kavalski & Zolkos, 2016; Tickner, 1993). A falta de respostas
atempadas, concertadas e robustas a estas crises entrelaçadas e a todos os seus
impactos ecológicos, sociais, económicos e políticos é indissociável do antropocentrismo
omnipresente que o ser humano como ponto central de referência nos processos
mundiais; e do sistema económico dominante a ele associado, que concebe a natureza
não-humana como um objeto passivo para a exploração e consumo humanos sem fim
(Pereira & Saramago, 2020). O contexto atual exige, portanto, propostas pós-
antropocêntricas para a transformação deste modo hegemónico de relação com a
natureza não-humana que surgiu principalmente nas nações industrializadas do Norte
Global.
É importante notar que a transformação deste modo de relacionamento pode
inevitavelmente promover uma transformação gradual das comunidades políticas
modernas - ou do sistema vestefaliano de Estados-nação - que foram, desde o início,
fundamentalmente informadas por conceções antropocêntricas do mundo e dos seus
seres agênticos. De facto, as normas que definem Vestefália - por exemplo, soberania,
territorialidade, cidadania, nacionalidade - são todas intrinsecamente antropocêntricas,
dado que estabelecem as fronteiras ontológicas, morais, legais e políticas da comunidade
quase exclusivamente em torno dos seres humanos (Pereira, 2017). Apelos a alguma
forma de relações interespécies (Youatt, 2014); a uma nova compreensão de política
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Artigo traduzido por Cláudia Tavares.
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planetária em vez de política internacional (Burke et al., 2016); a quadros inclusivos,
interseccionais e cosmopolíticos para a justiça multiespécies (Celermajer et al., 2021); a
novos tipos de comunidade política (por exemplo, zoópolis) que incluam animais não-
humanos como co-cidadãos, habitantes ou soberanos (Donaldson & Kymlicka, 2014)
entre outros - têm surgido nas últimas duas cadas em resposta ao caráter exclusivo
da política mundial e das RI, e à sua incapacidade de responder adequadamente às
emergências climática e ambiental. De facto, como Joana Castro Pereira argumenta, "as
RI devem abandonar os fundamentos tradicionais em que se baseiam porque a atual
noção de 'internacional' exige não uma conceção holística, mas também novas
ontologias, epistemologias e metodologias" (Pereira, 2017: 5). Parte deste processo
incluiria necessariamente o reconhecimento dos ltiplos seres agênticos do mundo, o
que - acrescento - envolveria também a recuperação e/ou aprendizagem de antigas
ontologias, epistemologias e metodologias, tais como as que possuem e partilham os
povos indígenas.
Outra proposta com potencial para afetar e talvez reformular as comunidades políticas
modernas é a do movimento emergente dos Direitos da Natureza (RoN)
2
, geralmente
entendido como tendo sido avançado pela primeira vez nos anos 70 através do artigo de
Christopher Stone, "Será que as Árvores Devem Ter Estatuto? - Rumo aos Direitos Legais
dos Objetos Naturais" (Stone, 1972). Desde então, e principalmente durante os últimos
vinte anos, o movimento RoN tem vindo a evoluir dentro de diferentes quadros, culturas
e geografias, defendendo o reconhecimento dos direitos inerentes da natureza não-
humana, quer à natureza como um todo, quer a ecossistemas e espécies específicos.
Embora muitas pequenas transformações jurídicas e políticas localizadas tenham
começado a ser implementadas sob a égide do RoN nos últimos anos, algumas das suas
realizações mais paradigmáticas incluem a Constituição do Equador de 2008 (a primeira
no mundo a reconhecer o RoN); o projeto para uma Declaração Universal dos Direitos da
Mãe Terra escrito durante a Conferência Mundial dos Povos sobre Mudanças Climáticas e
os Direitos da Mãe Terra em 2010 em Cochabamba, Bolívia; ou a Lei Te Awa Tupua em
Aotearoa Nova Zelândia de 2017 (a primeira no mundo a atribuir o estatuto de pessoa
jurídica a um rio).
Apesar de pertencer mais diretamente ao universo da lei, o movimento RoN tem
implicações profundas e potencialmente radicais para as sociedades humanas a múltiplos
níveis, incluindo o político. Como afirma Cormac Cullinan: "Embora a função reguladora
do direito seja fácil de ver, ignoramos frequentemente o facto de que o direito
desempenha um papel igualmente importante na constituição e formação da própria
sociedade" (Cullinan, 2011: 55). De facto, a lei molda e informa a sociedade definindo o
que devem ser as múltiplas relações entre indiduos, grupos e a sociedade como um
todo, bem como entre diferentes sociedades (Cullinan, 2011). Estas relões legalmente
definidas determinam, por exemplo, a forma como uma sociedade é ordenada e como o
poder é exercido dentro dela (Cullinan, 2011). Como tal, "a lei é utilizada por uma
sociedade como um meio de se criar e definir de acordo com a sua visão do mundo"
(Cullinan, 2011: 57). Ao avançar a ideia de que a natureza não-humana tem direitos
inerentes a viver e prosperar, o movimento RoN rejeita o paradigma eurocêntrico
fundacional criado pelo dualismo cartesiano: a humanidade como profundamente
2
RoN = Rights of Nature.
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enraizada e interdependente com o mundo mais-do-que-humano; e desafia as conceções
dominantes de comunidade política, subjetividade, agência, voz, direitos, participação e
representação. Deve também ser entendido como uma tentativa de reunir alguns dos
instrumentos do sistema internacional contemponeo (por exemplo, o direito moderno
ou internacional) com mundivisões ecocêntricas ou centradas na natureza que estejam
mais próximas das culturas e sistemas de conhecimento indígenas (Stewart-Harawira,
2012). De facto, pode argumentar-se que a ideia dos Direitos da Natureza o é de todo
nova, tendo sido partilhada entre culturas nativas durante milhares de anos através das
suas próprias relações com a terra e os seres não-humanos (Lake, 2017); razão pela
qual defendi que a evolução da compreensão das RI do mundo e dos seus seres agênticos
requer ontologias, epistemologias e metodologias novas e antigas. Para esclarecer,
então, quando me refiro ao movimento emergente RoN, refiro-me a estas novas
iniciativas, campanhas e evoluções na lei que procuram reconhecer direitos e/ou estatuto
de personalidade jurídica a seres não-humanos e ecossistemas.
A Teoria Crítica das RI é útil para compreender o potencial do movimento RoN para
empurrar gradualmente as comunidades políticas modernas numa direção pós-
antropocêntrica. Por conseguinte, na segunda secção deste artigo, vou analisar
brevemente as críticas de Andrew Linklater e Robyn Eckersley a Vestefália e as suas
propostas para a sua transformação. Na terceira secção, refletirei sobre como estas
podem ser aplicadas a dois casos do movimento RoN acima mencionados: o caso do rio
Whanganui em Aotearoa Nova Zelândia (representando RoN ao nível local); e a
Constituição do Equador de 2008 (representando RoN ao nível nacional). Recorrendo à
análise crítica de discursos, analisarei os documentos oficiais de cada caso (a Lei Te Awa
Tupua de 2017; e a Constituição do Equador) e verei como a sua linguagem e potencial
narrativo encorajam uma leitura alternativa de conceitos como comunidade;
subjetividade; agência; voz; direitos; participação; e representação. Na última secção
apresento algumas observações finais, nomeadamente que - ao alargar
significativamente estes conceitos de modo a incluir o mundo mais-do-que-humano - o
movimento emergente RoN encoraja de facto quadros diferentes para a potencial
transformação das comunidades políticas modernas para além da antropocêntrica
Vestefália.
Para além de Vestefália
O apelo de Linklater à transformação das comunidades políticas modernas está associado
à sua crítica ao sistema de Estados Vestefalianos enquanto sistema cuja premissa é a
inclusão dos considerados "insiders" ou "cidadãos" e a exclusão dos considerados
"outsiders" ou "alienígenas" - uma premissa derivada do processo de formação do Estado
e que faz parte do "projeto de totalização" do Estado-nação (Linklater, 1998: 6). O
sucesso dos Estados modernos sobre outras formas de organização política promoveu o
desenvolvimento de um discurso poderoso que combina os conceitos de soberania,
territorialidade, cidadania e nacionalidade, baseado na crença de que "idealmente, todos
os cidadãos devem subscrever uma identidade nacional transmitida por uma língua e
cultura comuns" (Linklater, 1998: 29). Desde o início, então, o sistema de Estados de
Vestefália foi um sistema que tentou apagar a diferença dentro e fora das suas fronteiras
nacionais; e para Linklater, o problema essencial das comunidades políticas modernas é
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precisamente a sua exclusão da diferença e da alteridade - tanto entre "cidadãos" e
"estrangeiros", como entre "cidadãos" e grupos subalternos dentro do Estado (Linklater,
1998).
No entanto, o Estado de Vestefália e o seu projeto de totalização não estão livres de
desafios. De acordo com Linklater, as comunidades políticas soberanas são desafiadas
em duas frentes por, por um lado, "reivindicações moralmente universalistas que exigem
a ampliação do papel das autoridades acima do Estado-nação"; e, por outro lado, pela
"política de reconhecimento" dos grupos indígenas e das nações minoritárias, que apelam
a "reduzir a influência que os Estados soberanos exercem sobre as comunidades locais e
as culturas subordinadas" (Linklater, 1998: 26-27). As tendências da globalização e da
fragmentação que evoluíram em oposição e em resposta uma à outra nas últimas
décadas, juntamente com as mudanças sociais e económicas que produziram, têm tido
sérios impactos na capacidade do Estado moderno para perpetuar o seu projeto de
totalização (Linklater, 1998). Com efeito, ao promover a homogeneização da sociedade
internacional, a globalização alimenta efetivamente as políticas de identidade e de
comunidade: onde não existe convergência entre fronteiras culturais e políticas (por
exemplo, no caso dos povos indígenas que vivem em Estados coloniais), tem havido
pressões crescentes para transformar "conceções tradicionais de comunidade e cidadania
que são hostis à criação de direitos específicos de um grupo" (Kymlicka, 1989 apud
Linklater, 1998: 32). As nões minoritárias, as comunidades migrantes e os povos
indígenas promovem assim a "política de reconhecimento", apoiando-se também na
"atividade política transnacional" tornada possível pela globalização, e procurando assim
"apoio global para o seu projeto de reconstrução das comunidades nacionais" (Linklater,
1998: 32). O crescente protagonismo da política de reconhecimento é, na opinião de
Linklater, um indicador central do movimento para além da era Vestefaliana (Linklater,
1998).
A proposta de Linklater para superar os défices sociais provocados pelo projeto de
totalização do Estado-nação Vestefaliano envolve o alargamento das fronteiras morais
da comunidade política, a fim de incluir "outros" anteriormente excluídos. Esta expansão
de fronteiras faz parte da tripla transformação da comunidade política prevista por
Linklater, que procura "assegurar um maior respeito pelas diferenças culturais,
compromissos mais fortes para a redução das desigualdades materiais, e avanços
significativos na universalidade" (Linklater, 1998: 3). Segundo ele, tal transformação
pode ser alcançada através do estabelecimento de relões dialógicas, ou da construção
de alguma forma de comunidade de comunicação universal, que envolva tanto "cidadãos"
(todos os cidadãos) como "estrangeiros" no diálogo sobre assuntos de interesse vital
para todos. De facto, o ideal dialógico "prevê comunidades pós-nacionalistas sensíveis
às necessidades dos sistematicamente excluídos dentro e fora das fronteiras
tradicionais", tornando-o "um dos principais fundamentos éticos da era pós-Vestefaliana"
(Linklater, 1998: 51). Na opinião de Linklater, tornar o diálogo central para a vida social
significaria essencialmente ser "perturbado pelas formas como a sociedade discrimina
injustamente os forasteiros, prejudicando os seus interesses e negando-lhes
representação e voz" (Linklater, 1998: 7). Nestas comunidades, podem então
desenvolver-se novos laços sociais que podem "unir os cidadãos em torno do objetivo
comum de erradicar a exclusão injustificável e promover uma diversidade profunda"
(Linklater, 1998: 83).
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Ainda assim, por muito apelativa que seja a inclusão dos sujeitos cujas vozes,
necessidades e preocupações são tradicionalmente excluídas da tomada de decisões
políticas, a proposta de Linklater parece incapaz de se estender à natureza não-humana.
Isto deve-se em parte ao facto de a sua compreensão da validade normativa, que se
inspira na conceção que Habermas tem da ética do discurso, assentar na noção de
competência comunicativa; ou ao facto de as normas deverem ser consideradas lidas
na medida em que todos aqueles potencialmente afetados por elas participam no discurso
racional e podem (ou não) dar o seu consentimento a essas normas (Linklater, 1998;
Eckersley, 2004). Tal disposição, que aparentemente exclui instantaneamente os seres
não-humanos, é o resultado de um sistema antropocêntrico de teoria e prática que não
considera sequer a natureza não-humana como parte do quadro. Afinal, "forasteiros",
"alienígenas" e grupos subordinados/subalternos dentro do sistema de Estados de
Vestefália refere-se a grupos humanos tais como os pobres globais, refugiados, nões
minoritárias ou povos indígenas (Linklater, 1998). Na medida em que a natureza não-
humana se torna invisível na imagem do mundo dominante (Burke et al., 2016),
nenhuma transformação significativa das comunidades políticas modernas para abraçar
o mundo mais-do-que-humano pode ser alcançada dentro de Vestefália, ou desde que
adiram às suas normas e conceções hegemónicas.
Neste contexto, poder-se perguntar: quais são as implicações de pensar nestes
"alienígenas" ou "outros" para além da fronteira da espécie humana? Num planeta que
vive atualmente uma emergência clitica global, com níveis sem precedentes de
destruição de ecossistemas, extinção de espécies, e catástrofes que afetam tanto seres
humanos como o-humanos, não estaremos de facto a prejudicar os interesses de todos
ao negarmos a estes últimos representação e voz no decurso da tomada de decisões? O
que aconteceria se as pessoas ficassem perturbadas com a forma como as sociedades
humanas modernas tendem a rejeitar continuamente as necessidades e interesses da
natureza não-humana - algo que se pode dizer estar no centro das crises climática e
ambiental? Ver a natureza o-humana como parte do grupo dos sistematicamente
excluídos e conceber quadros para o diálogo com os seus múltiplos seres pode ser um
primeiro passo crucial para inverter a situação atual.
Eckersley faz isto através da sua proposta para uma democracia ecológica, ou alguma
forma de Estado verde pós-vestefaliano que se baseia no trabalho de Linklater, mas vai
mais além. A sua proposta politicamente desafiante para a transformação dos Estados
modernos estabelece que: "Todos aqueles potencialmente afetados por um risco devem
ter alguma oportunidade significativa de participar ou ser de outra forma representados
na elaboração das políticas ou decisões que geram o risco" (Eckersley, 2004: 111). Esta
formulação está estreitamente alinhada com a afirmação de Linklater de que o diálogo
promove o progresso moral, especialmente quando o entendemos como uma expano
do círculo de sujeitos que têm direitos a participar no diálogo, e o compromisso de que
apenas as normas que têm (ou poderiam ter) o consentimento de todos aqueles
potencialmente afetados podem ser consideradas universalmente válidas (Linklater,
1998). Contudo, a formulação de Eckersley coloca-se fora da gaiola antropocêntrica,
sugerindo que a oportunidade de participação ou representação deve ser alargada a
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todos os potencialmente afetados, incluindo toda a natureza, os seres não-humanos e as
gerações futuras (Eckersley, 2004).
Para incluir seres não-humanos nas relações dialógicas que podem permitir o
desenvolvimento de sociedades mais inclusivas, justas e ecológicas, Eckersley
transforma a conceção de Habermas de validade normativa - a que afirma que as normas
devem ser consideradas válidas na medida em que todos os potencialmente afetados
participam no discurso racional (Eckersley, 2004). Ao substituir as palavras "na medida
em que" por "como se", Eckersley sugere que, embora muitos seres não-humanos
possam não poder dar o seu consentimento a normas propostas, agir como se fossem
pode ajudar a assegurar que as suas necessidades, interesses e bem-estar sejam
respeitados, independentemente da sua utilidade para os seres humanos (Eckersley,
2004). Esta perspetiva alternativa muito mais importância ao papel da representação
no processo democrático. De facto, Eckersley afirma que "a reivindicação representativa
em nome da natureza" é "em última análise um exercício de persuasão, preocupado em
expor práticas de exclusão e defender práticas de inclusão"; e pode, portanto, ser visto
"como um esforço para alargar ou radicalizar a democracia em vez de a restringir"
(Eckersley, 2011: 241).
Na formulação de Eckersley de uma democracia ecológica, o demos "já não é fixo em
termos de pessoas e território", proporcionando "um desafio às conceções tradicionais
de democracia que pressupuseram alguma forma de limite fixo, em termos de território
e/ou pessoas" (Eckersley, 2004: 113). Aqui podemos ver como a sua proposta pode
desafiar diretamente as normas centrais (antropocêntricas) de Vestefália de
territorialidade, soberania, cidadania ou nacionalidade, uma vez que a "comunidade
moral relevante" que deve ser considerada ao tomar decisões geradoras de risco não
está limitada nem ontológica, nem geográfica, nem temporalmente (Eckersley, 2004:
113). Em vez disso, deve ser entendida como aquela que está "ligada não por
passaportes comuns, nacionalidade, linha de sangue, etnia ou religião, mas pelo
potencial de se ser prejudicado pela proposta específica" (Eckersley, 2004: 113). As
fronteiras da comunidade política seriam assim "raramente determinadas ou fixas, mas
em vez disso têm mais o caráter de zonas espácio-temporais com bordos nebulosos e/ou
desbotados" (Eckersley, 2004: 113). Esta proposta poderia ser mais adequada para
responder a fenómenos planetários sem fronteiras, tais como as alterações climáticas,
em vez de uma imagem mundial dominante de Estados separados e autónomos que
podem responder à crise cada um ao seu próprio ritmo e vontade.
É claro que tal proposta acarreta muitos desafios significativos e complexos (em teoria e
na prática). Embora este não seja o lugar para refletir sobre eles, basta notar como a
formulação de Eckersley é desafiadora para as principais normas e prinpios do sistema
de Estados de Vestefália, nomeadamente porque "não considera as fronteiras do Estado-
nação como necessariamente coincidentes com a comunidade de seres moralmente
consideráveis" (Eckersley, 2004: 114). Relativamente à questão de como incluir seres
não-humanos (e gerações futuras) nos processos dialógicos de tomada de decisão,
Eckersley propõe o conceito de tutelagem política, em que pessoas e grupos o
escolhidos para representar as necessidades e os interesses daqueles que podem não
ser capazes de falar por si. Isto assemelha-se muito à sugestão de Christopher Stone
para a designação de tutores (ou um sistema de tutela) que possam falar em nome dos
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ecossistemas a fim de defenderem os seus direitos legais (Stone, 1972). Os
representantes que assumam esta função de fiduciários devem incluir aqueles com
conhecimentos ou experiência em primeira mão da natureza não-humana, incluindo
povos indígenas, organizações ambientais, peritos científicos, etc. (Eckersley, 2004).
Naturalmente, podem surgir casos de incerteza, complexidade ou conflito que podem
tornar o processo de tomada de decisão mais difícil. Nestes casos, Eckersley afirma que
o Estado democrático verde não deve ser neutro. A justiça ambiental numa democracia
ecológica exige necessariamente "direitos e regras de decisão que favoreçam
positivamente os desfavorecidos (...) em detrimento de atores económicos com bons
recursos e estrategicamente orientados" (Eckersley, 2004: 135). Uma forma de o
conseguir seria através da criação de constituições democráticas verdes que pudessem
reconhecer, proteger e recompensar "interações sociais, económicas e políticas
ecologicamente responsáveis entre indivíduos, empresas e comunidades" (Eckersley
2004: 140). Com efeito, tal democracia encorajaria os Estados a assumir uma forma de
"Estado ecologicamente responsável" (Eckersley, 2004: 2). O desenvolvimento de uma
esfera pública verde diversificada e abrangente que possa inspirar práticas de democracia
transfronteiriça, trabalhando para objetivos comuns de justiça ecológica, climática e
social a nível global, é outro aspeto importante (Eckersley, 2004).
As propostas de Linklater e Eckersley para a transformação das comunidades políticas
modernas para além dos seus modos tradicionais de exclusão podem assim abrir o
caminho para a inclusão, representação e participação da natureza não-humana,
nomeadamente através do desenvolvimento de alguma forma de Estados verdes pós-
vestefalianos. Passarei agora ao movimento RoN e analisarei como este pode sugerir
uma potencial transformação de certas comunidades nesta direção.
O movimento dos Direitos da Natureza
O movimento RoN nasceu de uma perceção comum de que os sistemas de governação
existentes são por siincapazes de responder às atuais tendências de destruição dos
ecossistemas, perda de biodiversidade e alterações climáticas, dados os interesses
concorrentes de diferentes atores (por exemplo, indústrias; empresas; Estados) e as
regras fundamentais do sistema económico e político contemporâneo (Barcan, 2019).
Como tal, "o direito ambiental tornou-se um local fértil para experiências criativas", uma
das quais inclui o reconhecimento da subjetividade, agência e voz, e direitos
fundamentais da natureza não-humana (Barcan, 2019: 5). Como afirma Youatt, a
característica particular dos Direitos da Natureza parece ser que "eles nomeiam novos
sujeitos coletivos, legais e políticos que o na sua maioria não-humanos" (Youatt, 2017:
2). Isto pode constituir "a última ronda de uma expansão externa de direitos aos
anteriormente marginalizados, com base no reconhecimento de direitos ao longo dos
eixos de raça, classe, nero e espécie" - recordando-nos a proposta de Linklater (Youatt,
2017: 2). Em tal cenário, através de iniciativas e movimentos como RoN, a natureza não-
humana pode adquirir cada vez mais subjetividade interventiva ou política na vida global.
Além disso, o movimento RoN tem sido frequentemente (embora não exclusivamente)
liderado por povos e comunidades indígenas, o que é corroborado pelo facto de alguns
dos seus sucessos mais conhecidos (por exemplo, a Constituição do Equador de 2008;
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as leis Te Urewera e Te Awa Tupua de Aotearoa Nova Zelândia) terem tido lugar em
países com populações indígenas e mobilização popular ativa para o reconhecimento das
vozes, reivindicações e direitos indígenas. Isto está ligado ao facto de que os modos de
relação não-ocidentais, indígenas, com a natureza não-humana têm sido, de um ponto
de vista histórico, radicalmente diferentes do modo de relação capitalista,
antropocêntrico, prevalecente no mundo ocidental. Na verdade, apesar da sua
diversidade de culturas, ontologias e epistemologias, os povos indígenas de todo o mundo
tendem a partilhar um conjunto central de princípios de relacionalidade,
interdependência, intercomunicação, respeito e harmonia com a Terra e todos os seres
(e.g. Heinämäki, 2009; Stewart-Harawira, 2012; Inoue, 2018). Uma diferença
significativa entre os entendimentos ocidental, hegemónico e indígena, contra-
hegemónico da natureza é aquela entre olhar para os ecossistemas (por exemplo,
florestas, montanhas, rios) como paisagens, recursos naturais ou sumidouros de carbono
- ou como "mundos em e de si mesmos" (Inoue, 2018: 28). Este último entendimento
está subjacente às ontologias indígenas que veem os seres humanos como cuidadores
da Terra, explicando porque - apesar de constituírem menos de 5% da população humana
mundial - os povos indígenas protegem e preservam cerca de 80% da biodiversidade
restante no planeta (IUCN, 2019). As culturas e sistemas de conhecimento indígenas
tenderam, portanto, a rejeitar noções antropocêntricas de comunidade, subjetividade,
agência, voz e direitos muito antes do nascimento do movimento RoN moderno. Veremos
agora como estes entendimentos alternativos de tais conceitos têm sido avançados
através deste movimento em duas escalas diferentes.
1. O caso do Rio Whanganui
Em 2017, a Lei Te Awa Tupua tornou-se o primeiro ato legislativo mundial a declarar um
rio como pessoa legal (Collins e Esterling, 2019). Resultou de um longo esforço do povo
Maori, desde 1873, para que o seu direito à propriedade do rio Whanganui fosse
restaurado um direito que foi retirado às tribos do Whanganui pelo Tratado de Waitangi,
através do qual a Coroa Britânica anexou o território de Aotearoa (Nova Zelândia) em
1840 (Rodgers, 2017; Collins & Esterling, 2019). A atribuição de personalidade judica
ao Whanganui representa o mais recente instrumento jurídico utilizado para a proteção
e gestão de rios; mas representa também um acordo político que reconhece tikanga
Maori (direito consuetudinário) e que vê o rio e os seus afluentes numa perspetiva ampla
e holística (O’Donnell & Macpherson, 2019).
Como demonstrado nas páginas 14 e 15 da Lei
3
, Te Awa Tupua é definido como "um todo
indivisível e vivo, compreendendo o rio Whanganui desde as montanhas até ao mar,
incorporando todos os seus elementos físicos e metafísicos” (Te Awa Tupua Act, 2017:
14). Tupua Te Kawa refere-se a todos os valores intrínsecos que representam a essência
de Te Awa Tupua, incluindo "Ko au te Awa, ko te Awa ko au": Eu sou o rio e o rio sou
eu", o que por sua vez significa que "os Iwi e os hapü do rio Whanganui têm uma ligação
e responsabilidade inalienáveis com Te Awa Tupua e com a sua saúde e bem-estar" (Te
Awa Tupua Act, 2017: 14-15). A Lei reflete uma ontologia Maori ao identificar Te Awa
3
A Lei Te Awa Tupua (Whanganui River Claims Settlements Act 2017) pode ser consultada aqui:
https://www.legislation.govt.nz/act/public/2017/0007/latest/whole.html.
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Tupua (todo o rio) como incluindo tanto o rio como as pessoas, as tribos Whanganui,
"como uma única unidade, não só como uma questão de reconhecimento, mas também
como uma questão de governação" (Youatt, 2017: 11). Esta conceção de comunidade
consequentemente os seres humanos como inseparáveis e interligados com o mundo
mais-do-que-humano (o rio e todos os outros seres que o habitam). Representa também
uma tentativa de desmantelar os sistemas de governação construídos pelas potências
coloniais ocidentais que utilizam a linguagem, o discurso e o direito para governar a
natureza humana e não-humana de acordo com os seus objetivos e visões do mundo
(Youatt, 2017).
Esta visão indígena do rio Whanganui como uma comunidade ampla está de acordo com
a proposta de Eckersley para uma democracia ecológica em que os limites do demos são
redesenhados para incluir um círculo moral maior; uma que desafia a norma tradicional
de soberania territorial do Estado-nação Vestefaliano como fundamentalmente
nacionalista e antropontrica (Eckersley, 2004). Neste caso, o rio Whanganui - embora
geograficamente localizado dentro das fronteiras do Estado de Aotearoa Nova Zelândia -
pertence não ao Estado, mas a si pprio, o que inclui as tribos Maori e os seres não-
humanos que vivem em interdependência com o rio. Neste caso, propriedade seria
melhor entendida como tutela. Tal como foi observado por Rodgers, "os conceitos
tradicionais Maori de tutela refletem uma relação diferente (...) da que existe na maioria
dos sistemas jurídicos ocidentais" (Rodgers, 2017: 270). A diferença reside no conceito
Maori de kaitiakitanga, cuja principal premissa é "o entendimento de que as pessoas
vivem numa relação simbiótica com a terra e todos os organismos vivos e têm a
responsabilidade de melhorar e proteger os seus ecossistemas" (Rodgers, 2017: 270).
Um exemplo disto é claramente ilustrado pela frase "Eu sou o rio e o rio sou eu" (Te Awa
Tupua Act, 2017: 15).
As páginas seguintes da Lei mostram o que estabelece em termos do reconhecimento da
personalidade judica a Te Awa Tupua e o sistema definido de tutela. O rio Whanganui
é assim declarado como uma "pessoa legal e tem todos os direitos, poderes, deveres e
responsabilidades de uma pessoa legal" (Te Awa Tupua Act, 2017: 15). Te Pou Tupua
são os seus tutores nomeados, de acordo com o conceito de gestão fiduciária de
Eckersley, para assegurar que os interesses e necessidades da natureza não-humana
sejam representados e defendidos. Os tutores nomeados devem ser o "rosto humano de
Te Awa Tupua e agir em nome de Te Awa Tupua" (Te Awa Tupua Act, 2017: 17). Este
sistema de tutela consiste em nomear um membro das tribos do Whanganui e um
membro da Coroa para agir como administradores ou porta-vozes, e para defender os
valores intrínsecos (Tupua te Kawa) que representam a essência de todo o rio. Ao eleger
tanto um neozelandês indígena como um neozelandês não-indígena enquanto
representantes, a Lei pode ser entendida como uma tentativa de promover uma
convergência de fronteiras culturais e políticas, encorajando assim o que Linklater
defende como uma transformação da comunidade política que procura assegurar um
maior respeito pelas diferenças culturais e uma maior universalidade (Linklater, 1998).
Também alarga efetivamente o âmbito de representação na comunidade política que é o
Estado de Aotearoa Nova Zelândia, relativamente a este ecossistema local, ao incluir
ambos: 1) as comunidades humanas tradicionalmente marginalizadas (os Maoris); e 2)
a natureza não-humana (Te Awa Tupua). Em última análise, a conceção da relação da
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humanidade com a natureza não-humana que está subjacente a esta lei é radicalmente
diferente da que permeia as narrativas dominantes no sistema de Estados moderno. Ela:
a) reconhece a subjetividade jurídica e política a um rio; b) afirma que a comunidade
física e espiritual formada por Te Awa Tupua é constituída por seres humanos e não-
humanos, atravessando assim os limites territoriais e ontológicos do rio; c) estabelece
que Te Awa Tupua é o seu próprio soberano; d) e tenta assegurar que a voz do rio seja
ouvida, mesmo que através dos seus guardiães humanos nomeados. Assim,
independentemente dos potenciais desafios à sua implementação prática (que
provavelmente existirão, uma vez que marca um terreno tão novo na legislação e política
ocidental), promove claramente conceções contra-hegemónicas de comunidade,
subjetividade, agência, voz, direitos, participação e representação que o o
antropocêntricas e mais adequadas para responder ao atual contexto de destruição
ambiental que exacerba a crise climática. O potencial transformador da Lei é também
que, mesmo que a nível local, a inscrição deste ato legislativo nas instituições do Estado
cria de facto um precedente para um novo sistema de governação e empurra-o para uma
forma de Estado ecologicamente responsável (Eckersley, 2004).
2. Constituição do Equador de 2008
Passamos agora àquele que é talvez o exemplo mais famoso do movimento RoN a nível
nacional. Em 2008, o Equador tornou-se o primeiro país do mundo a consagrar
oficialmente Direitos da Natureza na sua Constituição, reconhecendo a natureza no seu
todo como uma entidade detentora de direitos. De facto, pode argumentar-se que esta
é a "constituição mais radical do mundo até agora " no que diz respeito a RoN (Lalander,
2016: 624). O capítulo 7, através dos artigos 71 a 74, descreve o conceito e as suas
implicações legais e políticas para o Estado
4
.
A Constituição afirma que "a Natureza, ou Pacha Mama, onde a vida é reproduzida e
ocorre, tem o direito ao respeito integral pela sua existência e pela manutenção e
regeneração dos seus ciclos de vida, estrutura, funções e processos evolutivos"
(Constituição do Equador, 2008). Aqui, então, a natureza é definida como um todo, não
reconhecendo qualquer separação entre os mundos humano e não-humano e salientando
a interdependência entre seres humanos e não-humanos. Através destas palavras, pode-
se ver o reconhecimento da subjetividade legal e política da natureza como uma entidade
viva universal com direitos e agência inerentes. A Constituição de 2008 pode assim ser
vista como um exemplo das "constituições democráticas verdes" de Eckersley (Eckersley,
2004: 140).
A inscrição de Direitos da Natureza na Constituição também pode ser vista como um
exemplo da afirmação de Linklater de que a transição para um sistema onde surgem
novas formas de comunidade política não implica necessariamente o desaparecimento
das estruturas estatais convencionais, mas sim o facto de que "os Estados devem assumir
uma série de responsabilidades que normalmente têm sido evitadas no passado"
(Linklater, 1998: 4). Uma delas, estabelecida no Artigo 72, é que o Estado deve
assegurar o direito da natureza à restauração (de danos ambientais graves ou
4
A Constituição do Equador de 2008 pode ser consultada aqui:
https://pdba.georgetown.edu/Constitutions/Ecuador/english08.html
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permanentes) e estabelecer mecanismos adequados para "eliminar ou mitigar
consequências ambientais nocivas" (Constituição do Equador, 2008). Além disso, o Artigo
73 responsabiliza explicitamente o Estado pela aplicação de "medidas preventivas e
restritivas sobre atividades que possam levar à extinção de espécies, à destruição de
ecossistemas e à alteração permanente dos ciclos naturais" (Constituição do Equador
2008). Ao deixar claro que o Estado é responsável pela aplicação de RoN, a Constituição
procura inseri-la no novo papel de "cuidador ecológico" (Eckersley, 2004: 2).
Obviamente, se o Estado age ou não em conformidade é outra questão, mas a linguagem
e o potencial narrativo subjacentes ao Capítulo 7 descrevem este novo quadro para a
prática do Estado de uma forma que convida a uma reflexão crítica sobre os conceitos
de comunidade, subjetividade, agência, voz e direitos, numa perspetiva não
antropocêntrica. A Constituição define de facto um alargamento das fronteiras morais,
jurídicas e políticas do Equador para incluir atores o-humanos que se tornaram
repositórios de direitos que devem ser assegurados pelo Estado - e representa assim
uma potencial transformação pós-Vestefaliana (pós-antropocêntrica) desta comunidade
política específica.
Relativamente ao sistema selecionado de gestão fiduciária, o Artigo 71 estabelece que
"todas as pessoas, comunidades, povos e nações podem recorrer às autoridades públicas
para fazer valer os direitos da natureza" (Constituição do Equador, 2008). Isto significa
que, de certa forma, qualquer pessoa pode agir como guardiã ou fiduciária e falar em
nome da natureza não-humana para fazer ouvir as suas necessidades e interesses. Tal
disposição alarga também o potencial âmbito de representação da natureza o-humana,
nomeando não os atores individuais, mas também os coletivos (comunidades e
nações) que fazem parte de uma comunidade global bastante indeterminada. Além disso,
a Constituição não só tem esta dimensão mais representativa relativamente à natureza
não-humana, mas também relativamente aos povos indígenas, que fazem parte dos
grupos subalternos tradicionalmente excluídos ou "aliegenas" referidos por Linklater.
Isto é evidente no preâmbulo e corroborado pela observação de Youatt de que "a
ascensão de forças políticas indígenas no Equador (...) moldou claramente a linguagem
específica destes artigos, especialmente o uso de Pachamama e sumak kawsay (Youatt,
2017: 10). O preâmbulo refere-se a Pacha Mama, a palavra Kichwa geralmente traduzida
como Mãe Terra, e ao compromisso do povo soberano do Equador de "construir uma
nova forma de convivênciablica, na diversidade e em harmonia com a natureza, para
alcançar o bem viver, o sumak kawsay" (Constituição do Equador, 2008). A inclusão de
um paradigma indígena como sumak kawsay ou buen vivir - que representa uma
alternativa ao conceito ocidental de desenvolvimento (económico) - pode assim
representar uma tentativa de convergência das fronteiras políticas e culturais, em
conformidade com a proposta de Linklater. A utilização de conceitos como Pacha Mama
e sumak kawsay (que mereceriam um artigo muito mais longo centrado apenas nos seus
significados e implicações) na Constituição infunde-a consequentemente numa visão do
mundo indígena baseada em noções de interdependência, inter-relação, harmonia e
respeito entre seres humanos e não-humanos. Segundo Eduardo Gudynas, a
Constituição de 2008 promove uma postura biocêntrica, em que tanto as vidas humanas
como não-humanas têm valor em si mesmas (Gudynas, 2011); e, portanto, rejeita uma
visão mecânica, reducionista e instrumentalista da natureza, que tem sido central nos
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processos de desenvolvimento do Estado e do mercado e, portanto, inerente às
comunidades políticas modernas (Tickner, 1993).
No entanto, é importante notar que a Constituição emergiu de um contexto político e
social muito particular. Foi aprovada "no rescaldo de um período de profunda agitação
política", numa altura em que o presidente esquerdista Rafael Correa tinha acabado de
ser eleito com promessas de mudanças fundamentais para o país, incluindo uma maior
representatividade dos direitos indígenas e atenção às preocupações ambientais
(Espinosa 2019: 608). Uma análise da implementação de RoN no país mostra que, apesar
de ser um passo radicalmente novo dado por um Estado, a defesa dos Direitos da
Natureza no Equador não se tornou uma prática comum desde 2008 (Lalander, 2016;
Laastad, 2019). Existem contradições na ppria Constituição, nomeadamente no que
diz respeito à responsabilidade do Estado pela economia do país (altamente dependente
do extrativismo e da exploração de recursos não renováveis); e ao seu dever de manter
RoN (Lalander, 2016). Estas encontram um paralelo na prática do Estado, que continua
a depender fortemente da extração de recursos apesar dos apelos à proteção da natureza
(Lalander, 2016). Considerando que o Equador é um dos países mais pobres da América
do Sul, o Estado parece estar encurralado entre a necessidade de contar com indústrias
extrativistas para o bem-estar social; e a necessidade de proteger os seus ecossistemas
e seres. Este aparente dilema significa que "na prática, interesses económicos e políticos
estratégicos do Estado colidem com os direitos indígenas e ambientais" (Lalander, 2016:
625).
Pode ser tentador argumentar que esta dificuldade em implementar os Direitos da
Natureza no Equador lança dúvidas sobre o potencial sucesso de todo o movimento.
Contudo, o que é particularmente interessante aqui é como a linguagem utilizada - e os
seus entendimentos subjacentes de comunidade política, da subjetividade e dos Direitos
da Natureza - apontam pelo menos para a possibilidade de transformar as fronteiras e o
sistema de governação do Equador numa direção pós-antropontrica. Afinal de contas,
sinais de que a inclusão de RoN na Constituição nacional promoveu de facto uma
consciência ecológica crescente no seio da sociedade civil (Laastad, 2019). Talvez
também esteja ligada a algumas conquistas recentes nos movimentos de direitos
indígenas e ambientais, tais como a decisão do Tribunal Constitucional do Equador no
final de 2021 de recusar concessões mineiras na floresta protegida de Los Cedros uma
decisão baseada no entendimento de que tal atividade violaria os direitos da natureza
deste ecossistema específico (Aliança Global para os Direitos da Natureza, 2021). Como
se afirma no documentário Os Direitos da Natureza: um Movimento Global, "os direitos
da natureza são assim representados menos como um instrumento legislativo do que
como um instrumento para mudar a forma como as pessoas pensam e agem"
(Goeckeritz, Crimmell, & Berros, 2020). Uma mudança na consciência pode assim
representar o primeiro passo para a transformação da prática do Estado.
Em segundo lugar, o facto de parecer impossível estabelecer Direitos da Natureza no
atual sistema económico e político sublinha como este sistema não é constrdo de uma
forma que permita verdadeiramente a proteção da natureza o-humana, uma vez que
se baseia necessariamente na exploração contínua dos ecossistemas, dos povos e dos
seres. Enquanto as comunidades políticas modernas forem construídas sobre conceções
hegemónicas do mundo e dos seus seres agênticos, e dependerem de um sistema
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económico que exija a exploração e destruição de uma natureza vista como objeto
passivo, pode não ser possível que estas comunidades se tornem ecologicamente
equilibradas e respondam eficazmente às crises climática e ambiental. Dado que estas
crises estão a agravar-se rapidamente e que possuem um potencial tão devastador para
transformar a sociedade global, olhar para os dilemas que países como o Equador
parecem enfrentar enquanto tentam implementar Direitos da Natureza e ainda jogar
segundo as regras do sistema atual pode impulsionar um apelo à ação para a
transformação da comunidade política para além das suas estruturas capitalistas e
antropocêntricas.
Observações Finais
Tendo analisado estes dois casos paradigmáticos de RoN, argumentaria que o movimento
está alinhado com as propostas de Linklater e (especialmente) de Eckersley para a
transformação das comunidades políticas modernas para além do seu tradicional caráter
exclusivista. Tanto a Lei Te Awa Tupua de 2017 como a Constituição do Equador de 2008
parecem ser bons exemplos de políticas de reconhecimento que procuram alcançar uma
maior convergência entre fronteiras culturais e políticas; que encorajam os membros das
duas comunidades políticas a serem sensíveis às necessidades e interesses dos
sistematicamente excluídos (neste caso, com particular incidência sobre os seres não-
humanos e os ecossistemas); e que promovem uma diversidade profunda, alargando os
limites morais da comunidade a "outros" muito diferentes - tudo em conformidade com
a proposta de Linklater (Linklater, 1998). Possuem também importantes dimensões
representativas que tentam criar espaços (quer através de um novo ato legislativo, quer
através da Constituição nacional) para que a voz da natureza não-humana seja ouvida,
mesmo que através de guardiães humanos nomeados ou fiduciários; e encorajam
práticas de statehood ecologicamente responsáveis, quer localmente quer através do
desenvolvimento do que pode ser considerado uma Constituição verde - em
conformidade com a proposta de Eckersley (Eckersley, 2004).
Ainda assim, devem ser feitas duas observações importantes. Embora estes dois casos
se concentrem a nível local e nacional, creio que pensar no movimento RoN a uma escala
potencialmente global indica que a discussão em torno dos Direitos da Natureza
provavelmente se torna mais abstrata, complexa e difícil de implementar na prática à
medida que se passa de um nível local para um nacional para um global. Basta pensar
no desafio que seria certamente tentar transformar a Declaração Universal dos Direitos
da Mãe Terra, escrita em 2010 em Cochabamba, Bolívia, num "quadro normativo
internacional" semelhante à Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 como
era intenção dos seus proponentes quando a apresentaram à Assembleia-Geral da ONU
(Espinosa, 2014: 393). O facto de a Declaração ainda o ter sido aceite como um quadro
oficial fala por si. A tentativa de estabelecer RoN à escala global coloca desafios muito
maiores, pois teriam de ser aceites por um conjunto muito maior e mais diversificado de
atores (com diferentes circunstâncias económicas, regimes políticos, culturas,
necessidades e interesses); e desafiariam diretamente algumas das estruturas, normas
e regras fundacionais do sistema internacional contemporâneo, incluindo a economia
mundial capitalista. Por outro lado, embora existam questões, desafios e tensões tanto
no caso do rio Whanganui como em relação à Constituição equatoriana, e talvez mais
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evidentemente neste último, estruturas de RoN foram oficialmente adotadas em ambos
os casos e estão, em certa medida, a ter impacto. O que isto sugere é que o movimento
pelos Direitos da Natureza pode potencialmente alcançar maior sucesso concentrando-
se primeiro em mudanças mais pequenas e localizadas e, gradualmente, encorajando
potencialmente uma rede crescente de estruturas RoN. Trabalhar na mudança
paradigmática ou no aumento da consciência em níveis mais pequenos pode contribuir
para difundir conceções e sistemas de prática contra-hegemónicos através de uma
abordagem de base, de baixo para cima.
Em segundo lugar, é importante notar como os contextos em que o movimento RoN tem
tido mais sucesso até agora estão no Sul Global, e especificamente em regiões com povos
indígenas e mobilização (ou luta) indígena ativa para o reconhecimento dos seus direitos
culturais, políticos e legais. Alguns dos casos em que os quadros de RoN parecem ter
sido introduzidos com mais ousadia até agora, no Equador e em Aotearoa Nova Zelândia,
envolveram circunstâncias muito particulares através das quais os povos indígenas
fizeram ouvir a sua voz e as suas reivindicações (e, portanto, as suas culturas, ontologias
e língua) e foram incorporados na legislação oficial. O que isto parece sugerir é que, nos
espaços onde os limites morais da comunidade política são alargados ao ponto de
permitirem uma maior incluo, participação e representação de comunidades humanas
tradicionalmente marginalizadas (particularmente os povos indígenas), pode-se esperar,
quiçá, mais facilmente ver uma expano correspondente desses limites para incluir a
natureza não-humana sistematicamente excluída. Isto faz sentido, de facto, se
pensarmos nas relações tradicionais dos povos indígenas com o mundo mais-do-que-
humano; e também sugere que o desenvolvimento de comunidades políticas mais
inclusivas pode ser um bom cenário tanto para os seres humanos como para os não-
humanos. Se permitir uma resposta mais atempada, concertada e robusta às crises
climática e ambiental, certamente que o fará.
Finalmente, independentemente dos potenciais desafios à sua implementação prática,
diria que o movimento RoN detém de facto o potencial para (pelo menos) uma
transformação gradual da comunidade política numa direção pós-antropocêntrica, pós-
Vestefaliana. Através da sua linguagem e potencial narrativo, as estruturas RoN
convidam a uma reflexão crítica sobre conceitos de comunidade, subjetividade, agência,
voz, direitos, participação e representação que se têm centrado quase exclusivamente
em torno dos seres humanos; e, consequentemente, impulsionam um alargamento das
fronteiras morais, jurídicas e políticas da comunidade de modo a incluir o mundo mais-
do-que-humano. Ao convidar a uma transformação de um modo de relação prevalecente,
explorador e antropocêntrico com a natureza não-humana, o movimento RoN também
permite uma resposta potencialmente robusta, mais representativa, inclusiva, justa e
ecológica às crises climática e ambiental.
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