Comum a todos os documentos é a referência à originalidade do caminho escolhido pelo
PCC para o desenvolvimento da China, enfatizando o acervo civilizacional do país, a
recusa em alinhar no modelo de democracia liberal do Ocidente e, não menos importante,
o papel do Secretário-geral na qualidade de “núcleo central” do Comité Central do PCC e
de todo o Partido, que tem agora como “ideologia-guia” o pensamento de Xi Jinping sobre
o “socialismo com características chinesas na nova era”.
Na realidade, estaremos perante um tipo de revisionismo com características chinesas.
Sendo certo, como sublinhou Aron, que “a oposição entre Estado revisionista e o
conservador é muitas vezes enganosa” (2002: 142), não é menos certo que a via
escolhida pelo PCC, o Partido-Estado, reivindica a originalidade do seu projecto
ascensional.
Assumindo-se como um partido genuíno e pragmático, intimamente ligado às aspirações
populares, o PCC repudia reiteradamente aquilo que considera ser o “caos da democracia
ao estilo ocidental”, oferecendo em contrapartida uma “democracia que funciona”
baseada em inovações teóricas, de que se destacam a adaptação do marxismo à
realidade chinesa, para além do pensamento de Deng Xiaoping, a teoria da tripla
representatividade de Jiang Zemin ou a teoria científica do desenvolvimento de Hu Jintao.
No plano académico, estas teorias políticas encontram respaldo nas tentativas de
construção de um modelo de relações internacionais apropriado à projeção
contemporânea da China, de que são exemplos as correntes tradicionalista, do realismo
moral ou relacional construtivista.
Um dos grandes desafios no estudo da política externa da China prende-se, de resto,
com a teorização dos padrões e comportamentos aferidos e respectivo enquadramento
no plano das relações internacionais. Dito de outro modo, autores como Zhao Tingyang,
Yan Xuetong ou Qin Yaking, tentam colmatar essa lacuna através das suas obras, ao
procurarem integrar a China na ordem mundial.
É neste contexto que podemos enquadrar o “sonho chinês” de Xi Jinping, que propõe um
processo inclusivo e harmonioso para o desenvolvimento e afirmação da China, mas
também uma ordem multipolar. Trata-se de um processo de renovação ideológica e
política, com recurso ao reabilitado confucionismo e ao tradicionalismo cultural, mesclado
com o incontornável marxismo em versão sínica.
Mas é a lógica leninista, atribuindo ao Partido a indisputável autoridade legitimada pelo
centralismo democrático, que consolida e une a trindade constituída por PCC-Estado-
Exército Popular de Libertação (EPL). Por outro lado, e pese embora o figurino leninista,
o PCC esforça-se por realçar a democratização dos seus processos dentro dos limites
impostos pela lealdade ao Partido. O “livro branco” com o sugestivo título “A Democracia
que Funciona” (Conselho de Estado da RPC: 2021), recorda que existem outros oito
Partidos no sistema político chinês, mas que todos eles devem obediência ao PCC.
Na realidade, a abertura parcial do PCC a processos de cariz democrático não deve ser
lido como uma liberalização ideológica, mas antes como uma tentativa de refinar e
melhorar os seus métodos funcionais e orgânicos. Para Zheng Yongnian, esse processo,
que apelida de “pluralismo interno”, integra a meritocracia herdada da época imperial
com elementos da democracia moderna (2020:16). Por outras palavras, a construção do
“socialismo com características chinesas na nova era”, tem como objectivo principal