O projeto do Montepio Literário, designação porque ficou conhecida esta associação, foi
ideado por Joaquim Lemos Seixas Castel-Branco, professor régio de primeiras letras na
cidade de Lisboa, cavaleiro da ordem de Cristo e proprietário do colégio dos Cardaes de
Jesus, por ele fundado na capital, em 1815. Joaquim de Seixas Castel-Branco era um
homem ilustrado, subescrevia os Annaes das Sciencias, das Artes e das Letras, jornal de
exílio, publicado, em Paris, por Solano Constâncio, e procurava ajustar a sua atividade
pedagógica aos ideais humanitaristas e filantrópicos das Luzes. À época era também
adepto do constitucionalismo liberal britânico. Antes de lançar, com outros apoiantes, o
projeto do Montepio Literário deu ao prelo, em 1809, um curioso opúsculo intitulado
Breve mas circunstanciada noticia do governo e constituição da Grã-Bretanha, com huma
noticia geral de todas as revoluções que tem acontecido aos reis e á nação. Tanto quanto
sabemos, trata-se do primeiro escrito de que há notícia de adesão expressa ao modelo
constitucional inglês publicado em Portugal. Portanto, não foi indiferente à consumação
do paradigma de sociabilidade mutualista de Joaquim Lemos Seixas Castel-Branco esta
referência ideológica que, sendo fruto da sua formação intelectual, acabou por ser
publicamente sustentada no contexto das guerras napoleónicas e da crise internacional
de inícios do século XIX.
Mas voltando agora ao Compromisso do Montepio, ou estatutos, é sabido que o termo
de aprovação desta associação foi subscrito, inicialmente, por pouco mais de 130
professores e homens de letras. Aos requerentes a sócios do Montepio pedia-se que
atestassem a sua profissão, morada e idade e, não sendo professores, que
apresentassem também uma certidão de vitae et moribus passada pelo pároco da sua
freguesia. Em suma, todos os associados deviam ser indivíduos virtuosos e
trabalhadores, discretos e respeitadores do compromisso lido no ato de matrícula e sobre
o qual haviam prestado juramento ao serem admitidos. Uma vez matriculados, passavam
a ter o estatuto de compromissários. Contraíam um encargo financeiro inicial e pagavam
mensalmente ao cofre do Montepio uma contribuição, com o objetivo de acautelarem
uma subvenção, em caso de doença e fatalidade de perda de emprego na velhice, ou
uma tença, por morte, a favor, primacialmente, de suas viúvas e órfãos. No termo de
inscrição ou matrícula o compromissário devia declarar os nomes dos familiares diretos
que estatutariamente podiam beneficiar do cofre da associação mutualista.
O Montepio congregou, à partida, inúmeros espíritos ilustrados. Alguns dos seus
membros eram maçons, como António Maria do Couto (Marques, 1990, 342) e, com
grande probabilidade, alguns associados terão mesmo mantido contactos com o grupo
de conspiradores que reunia na Rua do Salitre, em vésperas da conspiração de Gomes
Freire de Andrade.
Pelos seus propósitos mutualistas, sociais e culturais, esta associação prenunciava a
emergência de um padrão secularizado de sociabilidade e de novas preocupações
filantrópicas na esfera civil. De forma livre, voluntária e a coberto de um sistema de
quotizações, oferecia aos seus associados uma série de socorros mútuos, incluindo a
pensão de reforma atribuída aos associados e suas viúvas a partir da constituição de um
fundo financeiro próprio.
Mas há outros aspetos importantes a referir: o Montepio ramificou-se por todo o país, ou
seja, tinha sede em Lisboa e delegações nas províncias. Era uma associação secularizada
formada por homens livres e beneficentes, com uma filosofia distinta do modelo de