pelas funções políticas que eles acabavam desempenhando. Como de fato ocorreu com
os magistrados que conduziram as investigações da Conjuração Baiana de 1798.
A Conjuração Baiana de 1798 foi um movimento de contestação deflagrado nas ruas de
Salvador na manhã de 12 de agosto por meio de boletins manuscritos afixados em
prédios públicos cujo conteúdo tocava em pontos extremamente delicados para a
governança dos dois lados do Atlântico naquela conflituosa conjuntura, a começar pela
mensagem: “O Povo Bahinense e Republicano ordena, manda e quer que para o futuro
seja feita nesta cidade e seu termo a sua digníssima Revolução”. A informação foi
acrescida pela convocação da população a participar do levante projetado pelo Partido
da Liberdade, um grupo heterogêneo que se intitulava Anônimos Republicanos, que
tornou público o objetivo da “República Bahinense”: “Animai-vos, povo bahinense, que
está para chegar o tempo feliz da liberdade. O tempo em que todos seremos irmãos,
todos seremos iguais”.
Em outro boletim, os “Entes da Liberdade” atacaram diretamente o príncipe regente d.
João VI: “Povos que viveis flagelados com o Pleno poder do Indigno coroado [...]”. Eles
questionavam a legitimidade da regência do Príncipe desde 1792, quando a senilidade
de sua mãe e Rainha, d. Maria I foi diagnostica. Também tomaram partido na aliança
entre Castela e França, escolhendo a França revolucionária para o livre comércio com a
futura “República Bahinense”. Além da abertura do porto de Salvador, o grupo também
reivindicou o aumento de soldo dos milicianos para 200 réis diários, o fim dos impostos
e das taxas cobradas pela Coroa Portuguesa, a liberação do comércio de açúcar, tabaco,
pau-brasil e todos os demais gêneros de negócio, isonomia e mérito nos critérios de
ascensão na carreira militar, da administração local e para a escolha dos clérigos que
comandariam a religião local. Em razão das demandas, anunciadas publicamente, as
autoridades locais logo desconfiaram, e com razão, que o grupo era constituídos por
pessoas de distinta condição social.
A Coroa Portuguesa e as autoridades locais, capitaneadas pelo governador da capitania
da Bahia (1788-1801), d. Fernando José de Portugal e Castro, agiram rápido, iniciaram
as investigações, contando com a colaboração de alguns desembargadores do Tribunal
da Relação da Bahia e de um grupo de homens poderosos e ricos, chamado de
“corporação dos enteados” pelo cronista Luís dos Santos Vilhena (1969), em razão das
denúncias de “ausência de limpeza de mãos” nos postos da administração pública e
participação no movimento. Dois membros desse grupo de poderosos foram convocados
pelos desembargadores a formularem denúncias e contaram sobre o episódio “pronta
entrega de escravos” no qual José Pires de Carvalho e Albuquerque, o terceiro homem
mais rico da capitania e Secretário de Estado do Brasil, entregou pessoalmente onze
escravos desse grupo à justiça. Episódios que acabaram interferindo nos rumos das
investigações e na circunscrição social do levante.
No dia 7 de setembro de 1798, Francisco Vicente Viana, homem branco, Ouvidor da
Bahia, Juiz dos Órfãos e Ausentes, proprietário dos Engenhos Madruga Cedo, Paramerim
e Monte, todos localizados no distrito da Vila de São Francisco do Sergipe do Conde,
formulou culpa sobre a participação de Luiz Gonzaga das Virgens na “projectada
revolução”. No mesmo dia, foi chamado a formular culpa outro senhor de escravo, Manoel
José Villela de Carvalho, homem branco, solteiro, Tesoureiro da Real Fazenda, negociante
de grosso trato e proprietário do Engenho Marapé, em São Francisco da Barra de Sergipe