OBSERVARE
Universidade Autónoma de Lisboa
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 12, Nº. 2 (Novembro 2021-Abril 2022)
144
MODELO DE NEGÓCIO DAS ORGANIZAÇÕES NÃO GOVERNAMENTAIS PARA O
DESENVOLVIMENTO DO SETOR DA EDUCÃO EM MOÇAMBIQUE:
UMA ABORDAGEM CONSTRUTIVISTA
PEDRO CABRITA
pncabrita@gmail.com
Investigador independente (Portugal) focado na problemática do desenvolvimento organizacional
em África, em particular na África lusófona. Mestre em Estudos de Desenvolvimento pela Escola
de Ciências Sociais e Humanas do ISCTE Instituto Universitário de Lisboa e Licenciado em
Gestão pela Universidade Autónoma de Lisboa
RENATO PEREIRA
renato.pereira@iscte-iul.pt
Professor de Gestão Geral da Iscte Business School, ISCTE - Instituto Universitário de Lisboa.
Investigador da Business Research Unit (ISCTE-IUL, Portugal), do Observatório de Relações
Exteriores (Universidade Autónoma de Lisboa) e do Centro de Investigação em Mercados
Emergentes (ISCIM, Maputo, Moçambique). Doutor em Ciências de Gestão pela Université Paris
Dauphine
MAOMEDE NAGUIB OMAR
manotio@yahoo.com.br
Pós-Doutorado e Investigador do OBSERVARE-UAL. Professor Associado do ISCIM Instituto
Superior de Comunicação e Imagem de Moçambique (Moçambique) e Investigador do Centro de
Investigação em Mercados Emergentes. Doutor em Estudos em Ensino Superior e Mestre em
Gestão Pública, ambos pela Universidade de Aveiro. Pós-Graduado pela University of
Witwatersrand
Resumo
A presente investigação visa determinar o modelo de negócio das Organizações Não
Governamentais para o Desenvolvimento (ONGDs)do setor da educação em Moçambique. O
trabalho adota uma abordagem metodológica construtivista em duas etapas: (i) indutiva,
centrada na construção de uma proposta de modelo de negócio social Canvas a partir da
observação de 15 ONGDs que atuam no setor da educação no país, com base num quadro
teóricosolidamente suportado na literatura; (ii) dedutiva, testando o modelo
propostoatravés da utilização de uma técnica de painel que permitiu o refinamento e a
reconstrução da proposta inicialmente formulada. O artigo contribui para a literatura em
modelos de negócio sociaisfazendo uma validão pioneira de conhecimento construído
nesta área e num campo de aplicação ainda não explorado. O contributo para as relações
internacionais situa-se ao vel dos dados recolhidos e informação produzida sobre
cooperão internacional em Moçambique.
Palavras-chave
Cooperação internacional, Moçambique, Modelo de negócio social Canvas, ONGDs, Educação
Como citar este artigo
Cabrita, Pedro; Pereira, Renato; Omar, Maomede Naguib (2021). Modelo de negócio das
Organizações Não Governamentais para o Desenvolvimento do setor da educação em
Moçambique: uma abordagem construtivista. Janus.net, e-journal of international relations.
Vol12, Nº. 2, November 2021-April 2022. Consultado [em linha] em data da última
consulta, https://doi.org/10.26619/1647-7251.12.2.9
Artigo recebido em 16 Junho 2021 e aceite para publicação em 9 Setembro 2021
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do setor da educação em Moçambique: Uma abordagem construtivista
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MODELO DE NEGÓCIO DAS ORGANIZAÇÕES NÃO
GOVERNAMENTAIS PARA O DESENVOLVIMENTO DO SETOR DA
EDUCAÇÃO EM MOÇAMBIQUE: UMA ABORDAGEM
CONSTRUTIVISTA
PEDRO CABRITA
RENATO PEREIRA
MAOMEDE NAGUIB OMAR
Introdução
As Organizações o Governamentais para o Desenvolvimento (ONGDs) têm um papel
cada vez mais importante em África porque, entre outras razões, a recente pandemia
de Covid-19 e o crescimento populacional acelerado levantam desafios difíceis de dar
resposta apenas com a intervenção dos atores tradicionais Estado, famílias e
empresas.
A importância destas organizações é particularmente notada em Moçambique, um dos
países da lista dos least developed countriesda ONU, que apresenta carências muito
pronunciadas em setores estruturais como a educação, a saúde e a alimentação.
O modelo de negócio destas organizações é no geral difícil de apreender, o que dificulta
a avaliação do valor criado por estas e a extensão das externalidades (positivas e
negativas) geradas para a sociedade moçambicana.
Assim, a presente investigação contribui para o conhecimento sobre esta temática
fornecendo um estudo pioneiro sobre modelos de negócio de ONGDs em Moçambique,
centrado no setor da educação.
1. Revisão da literatura
1.1. Os negócios do “terceiro setor”
Em Moçambique, existiam em 2015 mais de 11.000 instituições não financeiras, 9%
das quais no setor da educação e pesquisa, superado apenas pelas organizações
religiosas (26%) e comerciais (20%). Apesar disso, em termos de despesa por serviços
prestados, as Instituições sem Fins Lucrativos (ISFL) associadas à educação o as que
apresentam a segunda maior percentagem, sendo apenas superadas pelos serviços
sociais. Deste total, apenas 285 são ONGDs, sendo que 53% delas o nacionais, 32%
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são estrangeiras e 15% são instituições não classificadas.35dedicavam-seapena
educação, ocupando a segunda maior percentagem a seguir às atividades de saúde
humana e ação social. A sua presença é mais notória nas províncias de Inhambane,
Sofala e Manica, encontrando-se maioritariamente nas zonas municipais em
comparação com os distritos sem autarquia. O número de organizações desta natureza
apresenta um crescimento contínuo desde 1975, alcançando um máximo de
582.Empregam cerca de 17.000 pessoas, na sua maioria homens. Em comparação com
as outras áreas, o crescimento deste setor tem sido constante enquanto nos outros
setores varia consoante a época e o volume de investimento (INE, 2015).
A atividade destas organizações de âmbito social enquadra-se no chamado terceiro
setor”. Este epíteto deve-se à terminologia de organizações da sociedade civil” (OSCs)
que não se enquadram nas outras duas categorias de negócio (primeiro setor, o
governamental; e, segundo setor, o do mercado) (Aveni, 2018; Osborne, 2008).
O terceiro setor é formado por organizações que têm como missão contribuir
diretamente e especificamente para o bem-estar de uma comunidade em que os
recursos o extremamente limitados, adquirindo a natureza de fundações,
associações, organizações religiosas, cooperativas, entre outras organizações de
atividades civis criadas por iniciativa de cidadãos, daí terem sido apelidadas de
“Organizações Não Governamentais” (Defourny & Nyssens, 2008). Atuamnas principais
áreas de serviço público como na saúde, na educação, na cultura, nos direitos
humanos, na habitação, na proteção do ambiente, no desenvolvimento local, ou no
desenvolvimento pessoal” (Salvatore, 2004, p. 27).
Estas organizações contribuem para a produção, distribuição, prestação de serviços,
assistência, poupança e segurança de uma forma democrática, coletiva e associada à
livre iniciativa e ao direito de liberdade individual. Elas criaram um novo conceito de
economia, chamado de “economia solidária” por não reconhecer o mercado como área
de atuação do seu modelo de negócio (Singer, 2002).
A estratégia e a estrutura destas organizações variam muito, podendo-se identificar
três casos diferentes. Num primeiro grupo, encontramos organizações que têm uma
missão social, estando por isso totalmente inseridas na economia solidária. Num
segundo grupo, encontramos organizações que atuam com dois modelos de negócio
interligados, um orientado para o sucesso competitivo no mercado e o segundo que
canaliza os seus recursos para fins sociais. Por fim, temos um terceiro grupo que tem
dois negócios totalmente separados e em que a angariação de recursos é
completamente autónoma da causa social tendo uma finalidade meramente lucrativa
(Aveni, 2018).
O espaço de atuação e a capacidade de angariação de apoios de organismos públicos e
de outras entidades por parte destas organizações tem aumentado substancialmente,
surgindo também críticas teóricas e ideológicas na senda das críticas à relação entre
capitalismo, desigualdades sociais e pobreza (Singer& Brandt, 1980). Com estas
críticas surgiu também a fragmentação por áreas de atuação, levando a uma
especialização que não procurasse resolver todos os problemas sociais ao mesmo
tempo (Gohn, 1997).
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É neste contexto que as ONGs da área da educação começam a surgir em força,
apresentando perspetivas paliativas, de mudança, inovação e pressão política, pondo a
nuas lacunas do poder político no que tange à garantia de acesso à educação.
Inicialmente, eram iniciativas isoladas, de baixa visibilidade e escassa sustentabilidade.
Porém, com a melhoria dos resultados e com o aumento de estudos e de atenção por
parte de académicos, as suas iniciativas ganharam importância e notoriedade social,
apesar de se registarem também impactos negativos (Coutinho, 2004).
Segundo Freire (1987,1989, 1992), o papel destas organizações na educação popular
tem sido extremamente positivo. Isto tem-lhes conferido um papel de “protetoras” das
populações, o que reforçou substancialmente a sua legitimidade social.
Com o aumento da importância das ONGs e com a evolução do conceito de
“desenvolvimento”, surge o conceito de “ONGDs” (organizações não governamentais
para o desenvolvimento), surgindo também a necessidade de se especificar áreas
concretas de atuação destas organizações (Calheiros, 2003; Seers, 1969).
A institucionalização do conceito de “desenvolvimento” surge da necessidade de
validação científica e de reconhecimento político-institucional no pós segunda guerra
mundial, por várias razões, sendo as mais citadas a independência das antigas colónias
europeias e a necessidade de reconstruir a Europa, ambas ligadas à fundamentação
dos processos de acumulação, à necessidade de criar ordem social e à convergência
das lógicas intervencionistas do Estado na economia (Roque-Amaro, 2017).
Este conceito tem vindo a complexificar-se com a evolução teórica tanto de inspiração
keynesiana como marxista-leninista, na dicotomia capitalismo socialismo, que tem
mobilizado políticos e cidadãos anónimos, estratégias e planos, teorias e práticas. A
partir de 1992, vai ser apelidado de “pós-desenvolvimento”, ou início de uma nova era,
a partir das diferentes experiências de industrialização e crescimento económico,
valores culturais e interesses geoestratégicos, assentando por fim nas lógicas de
desigualdade e de dominação de género (Roque-Amaro, 2003).
Tal como a discussão à volta do conceito mobiliza diferentes posições e argumentos, os
projetos das organizações não governamentais para o desenvolvimento variam também
de forma, organização e objetivos por causa do constante aparecimento de novos
problemas. A esfera de atuação destas organizações divide-se em três áreas principais:
a cooperação para o desenvolvimento, a educação para a cidadania global, e a ação
humanitária e de emergência (Plataforma Portuguesa das ONGD, 2020).
O número destas organizações tem vindo a aumentar continuamente, sendo
acompanhado pela expansão da literatura relacionada com o tema (Bendell, 2000).
Este crescimento tem levado ao aparecimento de institutos e fundações para medir,
facilitar e certificar os impactos reais das mesmas, assim como para conectar as partes
associadas e envolvidas, como o governo, as pessoas singulares e coletivas,
organismos públicos e instituições comunitárias (Patrocínio, 2020). Recentemente, uma
das qualificações associadas às ONGDs que mais tem vindo a ganhar importância é a
de “OSCIP” (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público) que as reconhece
como parceiras das autoridades públicas (Neto, 2017).
Com o aumento da sua importância, surgiu a necessidade de se medir o impacto destas
organizações. Para tal, têm vindo a ser criados indicadores de desempenho ao nível da
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monitorização e gestão das operações e recursos e alcance dos objetivos, tanto para
medir o impacto das organizações de uma forma individual como também de forma
conjunta (Lugoboni et al, 2016).Os indicadores devem focar-se “num processo tão
sistemático e objetivo quanto possível, que consista em avaliar um projeto, programa
ou política, a sua conceção, execução e resultados. Destina-se a determinar a
relevância e o grau de consecução dos objetivos, bem como a eficiência, eficácia,
impacto e sustentabilidade em termos de desenvolvimento. Uma avaliação deve
fornecer informações credíveis e úteis e, ainda, permitir que as lições aprendidas sejam
incorporadas no processo de decisão dos beneficiários e dos doadores” (CICLP, 2014,
p.8).É ainda necessário seguir um processo para a avaliação sendo por isso obrigatório
que os indicadores assentem em fórmulas reconhecidas para aumentar a sua
credibilidade e realismo (Cohen & Franco, 1999).
1.2. Modelo de negócio Canvas e Modelo de negócio social Canvas
O modelo de negócio é um layer intermédio entre as dimensões estratégica e
operacional de uma organização e descreve a forma como esta cria, entrega e retém
valor económico (Osterwalder, 2004). A sua estrutura assenta num conjunto de
building blocks que permitem compreender como esse processo ocorre (Osterwalder &
Pigneur, 2010).
Osterwalder & Pigneur (2010) desenvolveram a ferramenta de modelização de negócios
conhecida como Business Model Canvas,visando especificamente organizações com fins
lucrativos, assente em 9 building blocks: “segmentação de clientes”, “propostas de
valor”, “canais”, “relacionamento com clientes”, “fontes de rendimento”, “recursos-
chave”, “atividades-chave”, “parcerias-chave”, e “estrutura de custos”.
Com a utilização extensiva e bem-sucedida desta ferramenta, surgiram sugestões de
alargamento da utilização da mesma a negócios sem fins lucrativos ou com impactos
sociais (Resende, 2016). Apesar do Business Model Canvas ter sido criado para todo o
tipo de negócios que visem a criação de valor, a sua utilização por organizações sociais
implicou adaptações consideráveis (Doherty, 2019).
Foi com esta preocupação em mente que se procurou desenvolver um Social Business
Model Canvas. A partir de várias propostas avançadas (e.g., Agafonow & Donaldson,
2015; Canestrino et al., 2019; Carayannis, 2021; Czinkota et al., 2020; Gauthier et al.,
2020; Maurya, 2010; Sabatier et al., 2017; Sparviero, 2019; Spiess-Knafl et al., 2015;
Umar et al., 2020), a Social Entrepreneurship Agency, entre outros,foi desenvolvendo e
refinando um framework completo de Social Business Model Canvas (SEA, 2020).
A escolha destes building blocks visou garantir: a validação da ideia base; a diminuição
dos riscos; a obtenção dos recursos; a reflexão sobre si mesmo e sobre o seu negócio;
os meios de comunicação; e, por fim, o apoio à gestão.Isto levou à necessidade de
contemplar a estrutura do plano de negócios através de: histórico da entidade;
mercado subjacente; posicionamento no mercado; conceito de projeto/ ideia/ produto;
estratégia comercial; gestão e controlo do negócio; investimento necessário; e suas
projeções financeiras.
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Figura 1 Representação do modelo de negócio social Canvas
Estrutura de Custos
Quais os principais custos a ter em conta na elaboração estratégica dos
planos?
Missão
Qual o principal objetivo e prosito? Este deve ser o espaço ligado às origens organizacionais, pessoais e ainda apresentar as decisões
protagonistas e atividades de suporte à Missão
Parceiros
Quem são os parceiros
chave que podem
contribuir para o sucesso?
Externalidades
Negativas
Quais são os efeitos
colaterais no grupo
alvo e seus
terceiros? Perceber
como mitigar estes.
Sustentabilidade Financeira
Quais são os limites orçamentais e como manter o equilíbrio entre
gastos e receitas?
Externalidades
Positivas
Quais são os
benefícios e
impactos positivos
principais das
atividades
desempenhadas pela
organização?
Proposta de Valor
Através da entrega do valor
ao grupo alvo quais são os
resultados esperados?
Relação com os
beneficiários
Quem é que vai receber
a proposta de valor?
Qual a relação a ter com
o grupo alvo e quais os
pontos a ter em conta?
Relação com os
Contribuintes
Quem é que pode
contribuir para a
organização e como
manter a relação entre
partes?
Canais
Como ter acesso aos
recursos e como fazê-los
chegar aos seus
destinos?
Problema
Qual o principal problema do
grupo e qual a sua
perspetiva?
Solução
Qual a solução proposta
para resolver o problema
detetado?
Fonte: Adaptado de SEA (2020)
Todas as informações devem estar presentes no quadro final e o mesmo deve ser
acompanhado de uma metodologia de aprendizagem visual através de cores que
facilitem a distinção das áreas relacionadas, ficando-se com um plano de ação em 4
etapas e grupos: a criação de valor (verde); a proposta de valor (laranja); a entrega do
valor (amarelo); e a captura e partilha de valor (azul). Para além destes existe ainda a
Missão do valor (cinzento escuro) e as Externalidades do mesmo (cinzento claro). Por
fim, o modelo deve ser acompanhado da explicação de cada escolha com uma
linguagem acessível e direta e, se possível, deve referir o prazo de cada objetivo.
No âmbito das ONGDs, a abordagem é adaptada consoante os públicos-alvo, suas
atividades, relações e resultados pretendidos, de forma que a organização em causa
cumpra competentemente a sua missão. Esta segmentação justifica-se pela variedade
de ONGDs e de respostas a dar aos diferentes grupos e realidades dos mais diversos
desafios ao desenvolvimento. Para além da variedade de segmentos de beneficiários,
dentro de cada uma das áreas o aparecimento de novas desigualdades e entraves ao
desenvolvimento faz com que novos segmentos vão surgindo acompanhados de novas
abordagens e fatores de distinção.
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2. Estudo empírico
2.1. Metodologia da investigação
O objetivo deste trabalho é a construção de uma proposta de modelo de negócio das
ONGDs do setor da educação em Moçambique. Considerando que um estudo desta
natureza nunca antes tinha sido efetuado neste país, formulámos as seguintes
questões de investigação: Como se caracteriza o modelo de negócio (social) das
ONGDs moçambicanas do setor da educação? Será que a utilização da ferramenta
Social Business Model Canvas permite descrever este modelo de negócio?
Para dar resposta a estas questões, dividimos o trabalho empírico em duas etapas: (i)
uma etapa indutiva, baseada na observação, análise, descrição e interpretação dos
modelos de negócio de quinze ONGDs do setor da educação a atuar em Moçambique.
Estas organizações foram selecionadas com base na sua abordagem, resultados
alcançados e disponibilidade de informação. A amostra foi estratificada por dimensão
(pequenas, médias e grandes), foco regional (internacional, nacional e local) e ainda
por motivação (política, religiosa, social, etc.), culminando na construção de uma
proposta provisória de modelo de negócio representativo da realidade estudada
segundo o frameworkSocial Business Model Canvas (SEA, 2020); (ii) uma etapa
dedutiva e confirmatória, através de uma metodologia de focus group, em que um
painel de observadores avalizados cuidadosamente selecionado para o efeito foi
convidado a apreciar a proposta provisória, extraindo-se do respetivo feedback
elementos que permitiram o refinamento do modelo e a apresentação de uma segunda
proposta, empiricamente suportada.
A análise dos dados, em ambas as etapas, foi efetuada através de técnicas de
modelização qualitativa e quantitativa com recurso ao software Microsoft Excel.
2.2. Problema e Solução
O problema fundamental é a falta de acesso à educação em Moçambique. A solução é a
disponibilização dos recursos que possam fazer a diferença gerando um efeito em
cadeia que mude não a disponibilização de educação, mas todos os fatores a ela
ligados. Contudo, nem todas as realidades têm os mesmos problemas nem a mesma
capacidade de resposta, pelo que a principal diferença entre as ONGDs estudadas situa-
se precisamente nas diferentes abordagens e respostas mobilizadas.
2.3. Segmentação - Beneficiários
Existindo três tipos de educação - formal, o-formal e informal - e rios veis de
evolução dentro de cada um deles, o primeiro desafio que se coloca às ONGDs na área
da educação é a escolha da abordagem a seguir tendo em conta a população existente,
o contexto histórico, as condições existentes, as potencialidades, os interesses e ainda
a duração do projeto.
Todas as quinze ONGDs estudadas fizeram o processo de avaliação para a decisão e
optaram por criar escolas com modelos de educação formal em locais isolados,
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escolhendo por isso populações segregadas com difícil acesso à educação e aos centros
urbanos. Apesar do Estado Moçambicano disponibilizar escolas por todo o território
nacional, as mesmas não são de acesso generalizado nem existem respostas para as
populações isoladas.
O tipo de ensino escolhido é o ensino formal por ser o tipo de ensino promovido pelo
Estado moçambicano. Existem, no entanto, diferenças na seleção dos alunos e
formandos para os programas e no nível de educação disponibilizado.
Nas ONGDs estudadas, catorze das quinze têm como objeto a educação infantil e
básica, sendo que uma delas apenas se foca na educação infantil e outra apenas no
ensino básico. Das mesmas catorze, apenas seis m projetos com alunos do ensino
secundário, sete com alunos universitários e nove com professores e comunidades.
Com base nos dados recolhidos, é possível perceber que a preferência vai para os
níveis mais básicos. Os indivíduos mais crescidos têm maiores obrigações de contribuir
para o sustento familiar e tendem a abandonar a escola antes de chegar ao nível
secundário. Isto periga a sustentabilidade dos projetos por falta de audiência,
obrigando a enviar os alunos interessados para outras localidades com bolsas de
estudo.
O número de ONGDs com formação para adultos e para a comunidade mostra que
existe interesse e beneficiários disponíveis. Estes projetos variam de abordagem e
intuito de grupo para grupo e de localidade para localidade.
2.4. Atividades-chave e recursos - Beneficiários
Na área da educação, os elementos-chave são:
Espaço/salas;
Professores/Formadores
Alunos/Formandos
Conteúdos educativos/formativos;
Material escolar.
Todos os demais recursos necessários, como uniformes, dispositivos informáticos,
sanitários, cantina, entre outros, não são prioritários.
Em dez das ONGDs analisadas, foi por iniciativa própria e com recurso a fundos
próprios que o espaço para as aulas foi criado. Estes espaços acabam por ser
multiusos,permitindo reuniões comunitárias, postos de saúde provisórios, entre outros.
Os professores/formadores o normalmentemoçambicanos. Os alunos são
maioritariamente locais da zona onde as aulas se desenrolam edas periferias dessas
localidades. Quando têm que haver deslocações significativas, são criadas redes de
ligação entre comunidades para assegurar a segurançados estudantes. Neste estudo,
três das ONGDs tinham esta rede criada. Raramente existe recusa de alunos,mesmo
quando o efetivo excedelargamente a capacidade máxima.
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Os conteúdos lecionados são os oficiais e definidospelo governo. Estes programas o
geralmente adaptados à realidade local, ao nível dalíngua, práticas e costumes, no
intuito de potenciar a adesão e os resultados. Dependendo do nível de educação e da
abordagem da ONGD, são ainda ensinados ofícios locais, visandofixar as populaçõese
aumentar o impacto sobre o desenvolvimento local.
A maior parte dos projetos decorre em zonas isoladas onde não existe acesso
amateriais escolares.Por isso,têm de ser comprados noutras localidades, chegando em
último caso a vir diretamente do estrangeiro.
Tendo em conta as profundas carências das populações em que se inserem, as ONGDs
acabam por desenvolver outras atividades em áreas fundamentais como a saúde, a
nutrição,a água, a participação comunitária, a inovação tecnogica,os serviços e o
meio ambiente.
As organizações analisadas têm atividades em três áreas diferentes, para além da
educação, sendo que unicamente uma delas tem participação em apenas uma área
extra e também uma únicaorganização participa emtodas as outras áreas.
Todas têm projetos comunitários, privilegiando uma abordagem integrada de
desenvolvimento.A saúde é o segundo principal foco de atenção, centrando-se a
açãona educação de pticas saudáveis, realização de exames médicos
edisponibilização de medicamentos. De seguida encontramos a preocupação pelas
carências de nutrição e água,ao abrigo da máxima que “um aluno com fome não
aprende”, materializada pela disponibilização de refeições na escolaque
paramuitosrepresentaa única refeição quente que têm no dia.
Por fim, nas duas áreas menos participadas encontramos a inovação tecnológica
eserviços (oito) e o meio ambiente (quatro). É de notar que não existe umarelação
padronizadaentre a dimensão das ONGDs e a sua presença nas diferentes
áreas,parecendo mais uma questão de opção estratégica.
Somando todos os projetos de todas as ONGDs, temos um total de setenta e dois na
área da educação, com um máximo de quinze e um mínimo de apenas um por
organização. Ao contrário das atividades extra,nas atividades de educação a dimensão
é crítica.As ONGDs de grande dimensão têm um espaço de atuação maior e mais
descentralizado, chegando a ter quinze projetos a decorrer em simultâneo em quinze
diferentes localidades.As pequenas, apesar de terem normalmente mais do que um
projeto em simultâneo, centram-senuma mesma localidade visando sinergiasde
Resultados/Impactos.
2.5. Canais
Sendo os canais a forma de ligar as partes tendo em conta as atividades e recursos
chave, é possível definir estrategicamente os 3 seguintes: comunicação, distribuição,
vendas e doões.
Começando pelo canal de comunicação, o objetivo é apresentar e dar a conhecer o que
tem vindo e vai ser feito para reforçar ou criar relações com os associados alvo, ao
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mesmo tempo que se dissemina informação relevante. Esta comunicação tem uma
componente interna e uma componente externa:
Comunicação interna - entre os participantes da organização. O resultado principal é
o relatório de contas e atividades onde são divulgados os resultados das atividades
internas.
Comunicação externa - com a sociedade civil, com os beneficiários e com os
contribuintes.
Na nossa amostra, apenas quatro das quinze optaram por subcontratar a comunicação.
Todas as ONGDs estudadas têm contas nas redes sociais - Facebook, Instagram,
Twitter, LinkedIn, entre outras - um website e ainda uma newsletter. Em todas estas
plataformas existem links para o sítio na internet. Estes tendencialmente são
transparentes nos seus conteúdos, de fácil navegação e orientados para atrair possíveis
apoiantes da causa, sejam eles sócios, doadores, voluntários ou parceiros. Muitos
incluem ainda um blog ou mural de notícias. As newsletters variam a periodicidade
entre mensal, trimestral, semestral e anual. São quase todas digitais e entregues por
email. Quatro das organizações estudadas entregam revistas, cartas e boletins em
papel.
Para além destes, existem outros canais de comunicação como televisão, telefone e
rádio, sendo que o último apenas é utilizado por uma delas. Com base na nossa recolha
de dados é possível afirmar que apesar de existirem investimentos em comunicação,
estes são na sua maioria reduzidos e não são utilizados de forma diferenciadora.
Quanto aos canais de distribuição, estes são utilizados, na maioria dos casos, tanto
para a atividade principal como para as atividades secundárias. Relativamente à
atividade principal, estão em causa os materiais escolares tanto dos alunos como dos
professores, podendo também incluir outros bens. Há três origens principais: as
próprias localidades (seis de quinze), outras localidades nacionais (quatorze de quinze)
ou estrangeiro (doze de quinze). A distribuição local é comum nos projetos que se
encontram há mais tempo no terreno, revelando que os canais de distribuição evoluem
ao longo do tempo. Quanto às outras duas origens, as trocas são maiores a nível
nacional, exceto num caso que privilegia o estrangeiro.
Por último, nos canais de vendas e doações é possível detetar um padrão no tipo de
contacto pois todas privilegiam a comunicação eletrónica com os seus doadores, sócios
e clientes, incluindo a assinatura digital de contratos, recebimento de contribuições por
transferência bancária e comunicações/reuniões em plataformas virtuais. Quanto ao
contacto físico, doze ONGDs fazem-no para aprofundar a relação entre as partes,
utilizando dinâmicas de participação ativa, divulgação de dados e realização de eventos
presenciais. As três que não o fazem recebem os seus contributos financeiros quase
exclusivamente das mesmas fontes de financiamento.
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2.6. Relacionamento com os beneficiários
Conhecendo-seas necessidades e condicionantes dos beneficiários é possível não
definir a estratégia de implementação do projeto, mas também do acompanhamento
dos seus participantes:
A priori - Antes da implementação dos projetos, os seus responsáveis foram às
localidades averiguar do interesse de potenciais alunos e familiares, estudar a
cultura, levantar as necessidades, definir objetivos e preparar uma proposta inicial.
Na grande maioria dos casos, foram feitos acordos formais ou informais com os
deres das comunidades locais e ainda com os responsáveis de educação de forma a
garantir o compromisso das várias partes.
Durante Identificou-se que alguns dos projetos não têm prazo definido e outros
têm apenas um prazo genérico (ex: último trimestre do ano x, ou quando outro
objetivo estiver atingido). Isto torna a avaliação durante crucial, incidindo sobre o
relacionamento com os beneficiários através da mensuração dos níveis de interesse
escolar e adaptação às necessidades. O foco está tanto no resultado como na adesão
dos estudantes, dos professores e da comunidade onde o projeto se insere, uma vez
que sem esta dificilmente aquele será bem-sucedido.
posteriori - Chegando ao fim do ciclo do projeto, é necessário medir o nível de
concretização do mesmo. Para além disso, é preciso fazer a ponte com futuras
propostas da mesma ou de outras organizações.
2.7. Relacionamento com os clientes/contribuintes
Nas ONGDs estudadas, a importância dos clientes/contribuintes que se assumem como
financiadores/investidores da organização esligada aos canais de comunicação e de
vendas/doações. Ambas as partes procuram a realização do interesse, a retenção dos
interessados e a ampliação da oferta, não só para aumentar a rede de contatos como o
valor das angariações, o que incrementará a sustentabilidade financeira. Com essa
finalidade, para além da utilização do canal de comunicação, as organizações procuram
atrair, manter e alargar o interesse, da seguinte forma:
Padrinhos/associados - A angariação faz-se de duas formas principais: a indireta,
através da informação disponibilizada nos canais de comunicação e do passa-palavra
entre conhecidos da organização; e a direta, nos eventos da organização e em
programas te-à-tête. A angariação direta é considerada mais eficaz.
Doações - Funcionam para os interessados em apoiar, mas sem disponibilidade ou
interesse em ficar associados, ou seja, sem compromissos ou responsabilidades
adicionais. Pode ser constante ou pontual e ter como objeto o mais variado tipo de
bens ou serviços. Quanto mais específico for o pedido de doação, mais elevada será
a probabilidade de se obter um valor mais elevado.
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Vendas Realizam-se através de um negócio independente/aunomo, mas
associado à causa, sendo a proposta de valor o apoio à educação embora a utilidade
dos produtos e serviços seja distinta desta.
Fundos e subsídios Via privilegiada de financiamento de organizações sem fins
lucrativos, é uma fonte que está sempre no topo das prioridades das ONGDs.
Eventos São um dos meios mais eficazes para alcançar os três objetivos da relação
com os clientes. Permitem criar um espaço híbrido entre formal/informal e
exclusivo/aberto. Contudo, implicam encargos acrescidos.
Com base nos dados recolhidos, é possível perceber que todas as quinze ONGDs usam
as doações, doze delas recorrem a fundos e subsídios, e dez têm padrinhos/associados.
Das doze organizações que recebem fundos e subsídios, apenas oito têm ao mesmo
tempo padrinhos/associados. Nos outros casos, quando não têm padrinhos/associados
têm fundos e subsídios, e vice-versa, exceto num caso em que se optou por o usar
nenhum destes mecanismos. A organização de eventos foi observada em oito
organizações e seis delas efetuam vendas a clientes.
Em média, são utilizados três destes mecanismos por cada organização, sendo que
duas delas utilizam todos, quatro delas utilizam quatro, sete delas utilizam três e duas
delas apenas utilizam dois. o é possível identificar uma relação entre a escolha das
formas de relacionamento e a dimensão da organização, origem da mesma ou taxa de
sucesso. É, contudo, possível detetar que quando as organizações estão em fase de
expansão, optam por duas abordagens principais para aumentar o número de
clientes/contribuintes.
Os resultados obtidos permitem concluir que as contribuições por doação são uma fonte
de financiamento geralmente usada, tanto pelas razões anteriormente enumeradas
como pela sua versatilidade, fácil adaptação às necessidades das ONGDs e ainda pela
reduzida necessidade de compromisso. As doações materializam-se de diferentes
formas: dinheiro, material escolar, roupa, cabazes e até milhas aéreas, não tendo sido
identificado nenhum padrão dominante. Para se fazer a recolha das doações, para além
do mecanismo da transferência bancária aberto em permanência, muitas organizações
escolhem momentos específicos, divulgando antecipadamente o calendário dessas
recolhas. Outro meio possível é a consignação fiscal, nos países em que a mesma
existe, que apesar de não atingir valores significativos contribui para a notoriedade
pública da ONGD.
O auxílio por fundos e subsídios tem vindo a crescer e a mostrar-se uma das principais
formas de apoio para novas organizações que precisam de investimento inicial. Os
fundos variam quanto à origem, mas a maior parte são privados de instituições,
fundações, empresas e organizações. Há, contudo, uma utilização significativa de
fundos públicos. Na sua maioria as candidaturas são renovadas quando se chega ao fim
do fundo, sendo por isso importante manter a relação e ir mostrando os resultados e os
impactos. Nas organizações analisadas, apenas uma utiliza fundos e subsídios para
além das doações o que mostra a preocupação destas em associar-se à sociedade civil.
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A utilização do conceito de padrinho/associado é bastante popular entre as ONGDs na
área da educação. Aqueles recebem informações periódicas sobre os seus afilhados,
reforçando constantemente os laços entre as partes. De forma a terem o maior número
possível de padrinhos, as organizações disponibilizam esquemas flexíveis de
contribuição financeira. Esta componente não é normalmente suficiente para sustentar
as despesas dos projetos, obrigando as organizações a procurar formas
complementares de financiamento.
Os eventos têm uma diversidade difícil de padronizar. Incluem workshops, formações,
atividades de grupo, refeições, sessões lúdicas, caminhadas, entre outras. Existe
também uma grande variedade de resultados, seja em termos de lucros, aumento da
rede de associados, divulgação de um dado projeto, entre outros, independentemente
da dimensão da ONGD ou do nível de notoriedade da mesma. Na amostra analisada,
cinco em oito das que optaram por apostar nos eventos tinham padrinhos/associados.
Por fim, a opção de tornar os associados em clientes tem sido uma opção pouco
utilizada na amostra estudada. Todas as ONGDs que o fazem têm produtos associados
à educação e produtos produzidos nas localidades dos projetos ou que são tradicionais
dessas zonas. Das seis que o fazem, apenas uma se foca exclusivamente nas vendas
como fonte de rendimento, para além das doações. Contudo, todas têm um modelo de
organização de impacto social.
2.8. Estrutura de custos
Conhecendo as atividades principais e secundárias, os seus fatores associados, os
canais utilizados e as necessidades específicas dos beneficiários e dos
contribuintes/clientes, é possível ter uma visão completa dos custos que a organização
vai incorrer no seu projeto. Os dados recolhidos neste estudo não permitem assinalar
um padrão para as duas categorias referidas na contextualização teórica (custos fixos e
custos variáveis) nem para as duas estruturas (economias de escala e economias de
escopo) devido à falta de informação e às diversas abordagens e estratégias
específicas. Contudo, é possível assinalar e relacionar os principais gastos detetados.
Custos fixos:
Gastos com o pessoal do projeto - Os quatro principais centros de custos
identificados nas escolas o: os professores, os formadores e os educadores; os
contínuos e auxiliares da escola; as cozinheiras (quando existe cantina); e o material
escolar (incluindo os seguros escolares). Para além destes, existem os serviços
administrativos ea gestão e coordenação que tanto quanto possível são assegurados
por pessoas locais com o intuito de reforçar a sustentabilidade organizacional.
Gastos com o pessoal da organização - Para além dos recursos humanos dos
projetos, existem ainda as pessoas que trabalham na gestão da própria organização.
As principais áreas funcionais identificadas são as de estratégia, financiamento,
comunicação, contabilidade, recursos humanos e gestão de projetos.
Material de expediente - À maioria dos trabalhadores está associado o consumo de
materiais. Tendencialmente, consegue-se fazer uma previsão desses consumos ou
até uma delimitação das possibilidades orçamentais de modo a fixar esses custos.
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Comunicações - Para se criar um canal de comunicação entre os projetos e a
organização é necessário desenvolver uma abordagem segura, estável e rentável.
Apesar de não ser uma realidade comum a todas as ONGDs estudadas, a maioria
delas privilegia a internet para este efeito.
Locação - Tanto nos projetos como nas sedes das organizações existem locações
associadas, principalmente de equipamentos e instalações. Na amostra estudada, as
locações justificam-se por serem menos onerosas do que a aquisição. É possível,
contudo, constatar que os casos mais comuns de locação se referem a imóveis.
Prestações de serviços - Ao contrário da locação de equipamentos e instalações, na
prestação de serviços existe uma divisão equilibrada entre os gastos dos projetos e
os da administração geral.
Custos variáveis:
Energia e água - Estes custos decorrem tanto dos consumos básicos como dos
supérfluos pois a utilidade difere. Nas ONGDs avaliadas não foi encontrada muita
informação sobre eles.
Depreciações - Com base no estudo feito, é posvel detetar que este tipo de custo é
reduzido comparativamente com os outros encargos dos projetos.
Alimentação - Nas ONGDs que tinham cantinas de alimentação para os seus alunos,
os custos variam frequentemente impossibilitando a sua classificação como custo
fixo. Apesar disso, na amostra estes custos são apresentados como custos fixos por
ser feita uma média que varia consoante a localidade e outras condicionantes
relevantes.
Outros gastos - Todos os outros gastos necessários.
Com os seus custos elencados, conseguimos perceber que os custos fixos são mais
significativos que os variáveis nas ONGDs da área da educação, preponderando as
economias de escopo. Em simultâneo, existem economias de escala nos bens
exportados, desde roupas a material escolar assim como nos produtos alimentares.
2.9. Sustentabilidade financeira
Sustentabilidade financeira é a capacidade de longo prazo da ONGD em gerar os
recursos financeiros necessários ao desenvolvimento do seu propósito estratégico. Para
tal, é preciso garantir que as fontes de receita são suficientes para cobrir as despesas
necessárias à realização do planeamento estratégico, contabilístico,
flexibilidade/adaptabilidade e visão de futuro.
O valor e o número de fontes de rendimentos têm vindo a aumentar nas ONGDs,
potenciando o aparecimento e a expansão deste tipo de organizações. As suas
principais fontes de recursos são as seguintes:
Patrocínio de pessoas coletivas;
Apoio de pessoas singulares;
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Doações de fundações e órgãos internacionais;
Parcerias com órgãos governamentais;
Consignação de impostos.
2.10. Parcerias principais
As parcerias têm diferentes origens, mas a finalidade comum de otimizar os modelos
de negócio, reduzindo riscos e aumentando capacidades. Variam de tipo e de
motivação, consoante o foco específico, podendo por isso alcançar diferentes elementos
do modelo de negócio.
Os principais tipos o quatro, tendo como elemento comum a lógica win-win que
determina as bases de uma parceria-chave:
Alianças estratégicas Parceria entre organizações não concorrentes que procuram
complementaridade;
Coopetição Cooperação entre organizações concorrentes que desejam divisão de
riscos;
Joint-ventures Criação conjunta de novos negócios temporários, normalmente para
dar resposta a um concurso/call em que individualmente nenhum deles conseguiria
ganhar;
Acordos comprador-fornecedor - Visando suprimentos previsíveis e estáveis,
sobretudo em mercados caracterizados pela volatilidade.
Em termos de motivações, podemos encontrar quatro tipos principais: otimização e
economia de escala; redução do custo através de subcontratação e partilha de
infraestruturas; redução do risco de incerteza através do envolvimento de parceiros; e
aquisição de recursos e atividades particulares, como know-how, licenças ou até
capacidade de investimento.
As parcerias dentro das ONGDs são feitas normalmente com um foco particular. Para
além da associação a pequenas entidades e a pessoas singulares, uma cada vez
maior preocupação com o impacto que decorre do envolvimento com grandes empresas
que cada vez mais apelam à responsabilidade social empresarial.
2.11. Proposta de valor
Ao terem um problema e objetivos estratégicos comuns, as ONGDs estudadas
convergem numa proposta de valor semelhante. A principal diferença entre elas situa-
se ao nível dos canais de comunicação, das abordagens de angariação de fundos e das
localidades onde incidem.
Analisando a proposta de valor de uma forma aprofundada, identifica-se que a maior
diferença se situa nos canais de comunicação, em particular nos websites, pois existe
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uma variação apreciável de qualidade e acessibilidade, facilidade de navegação,
disponibilização de informações e rapidez de resposta a contatos.
A criação de valor para o possível contribuinte faz-se através da divulgação da
realidade objeto de intervenção com recurso a imagens e vídeos de pessoas locais, na
grande generalidade crianças, que apesar de viverem em contextos fortemente
desfavorecidos mostram grande felicidade por poderem ir à escola. Outra abordagem é
a apresentação de resultados que dão uma perspetiva de eficácia, sucesso e impacto
sobre o desenvolvimento.
2.12. Resultados / Impacto
As quinze ONGDs estudadas apresentam indicadores e resultados diferentes, mas todas
têm em conta a eficiência, a eficácia, a relevância e o impacto. Todas mostram a
evolução do aproveitamento escolar, o número de estudantes e ainda o número de
ações executadas.
Relativamente à evolução do aproveitamento escolar, os indicadores mais utilizados
são: a taxa de alfabetização; o índice de desenvolvimento humano; a idade média de
escolaridade; a taxa de mortalidade/esperança média de vida nos primeiros cinco anos;
os rendimentos familiares; e a redução da pobreza.
Em termos do número de estudantes, este indicador não mede apenas os
participantes/influenciados mas também os bens materiais associados, de forma a ir
além do simples registo dos alunos presentes através de: taxas de assiduidade;
número de inscritos; progressão escolar; média etária; recursos disponíveis por aluno;
número de manuais;mero de bolsas disponíveis; material escolar, entre outros.
Relativamente ao número de ações executadas, consideram-se tanto as atividades
escolares como as extracurriculares fazendo com que todas as dinâmicas do processo
de ensino-aprendizagem sejam tomadas em conta. São considerados: o número de
escolas; o número de aulas dadas por turma; os intercâmbios feitos; o número de
refeições servidas; o número de exames de saúde realizados; o número de sessões
com a comunidade; e o número de projetos desenvolvidos.
A evolução local decorrente das ONGDs estudadas é notória e apresenta vários
resultados/impactos estimulantes para os beneficiários, os trabalhadores e os
contribuintes.
2.13. Externalidades positivas e negativas
Nas externalidades positivas, temos a evolução positiva do índice de desenvolvimento
humano local.
Começando pelo combate à pobreza, ao haver uma capacitação da população as
atividades económicas existentes sofrem um processo de upgrade ao mesmo tempo
que se cria espaço para que outras atividades se desenvolvam. Com esta evolução,
libertam-se recursos para se investir mais em saúde o que leva ao aumento da
esperança e da qualidade de vida das populações. Um outro aspeto importante,
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relacionado com o comércio local, é que este tende a aumentar nas áreas próximas das
escolas, criando-se um ciclo virtuoso.
Paralelamente à educação formal existe um ensino geral e comunitário onde se
transmite educação moral e cívica, favorecendo a cidadania e o reforço dos valores
democráticos. Redes de educação bem estruturadas tornam mais fácil a implementação
local de políticas, medidas e ações nacionais e internacionais, favorecendo e acelerando
a sua evolução. Existem ainda outros fatores associados à educação promovida por
estas ONGDs, como a redução do trabalho infantil e o desenvolvimento de talentos.
Do lado das externalidades negativas temos a dependência das comunidades locais
relativamente às ONGDs. Esta dependência torna as comunidades locais vulneráveis às
oscilações conjunturais dos países onde as fontes de rendimento se localizam e ainda
às alterações de interesse dos contribuintes. Por outro lado, ao sentirem este apoio, as
autoridades nacionais relaxam os seus esforços e investimentos próprios, dificultando a
uniformização da educação ao nível do país, criando e aprofundando diferenças entre
comunidades. Podem ainda surgir desequilíbrios nas atividades comerciais locais
levando à segregação de certas comunidades e fazendo surgir novas comunidades
carenciadas.
2.14. Missão
Apesar das diferenças nas estratégias, atividades principais, organização interna,
proposta de valor, projetos, beneficiários, clientes, canais, estrutura de custos,
sustentabilidade financeira, problemas e soluções, é possível concluir que a missão das
ONGDs na área da educação em Moçambique é a promoção da educação como forma
de combate às desigualdades e de incremento do desenvolvimento do país, procurando
a mudança para melhor.
3. Modelo de negócio social Canvas das ONGDs de educação em
Moçambique
3.1. Apresentação do modelo proposto
Com base na análise empírica desenvolvida no ponto anterior, avançamos com a
seguinte proposta de modelo de negócio social Canvas para as ONGDs na área da
educação em Moçambique:
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Figura 2 Proposta de modelo de negócio social Canvas para as ONGDs na área da
educação em Moçambique
Estrutura de Custos
Procurar definir os custos fixos e custos variáveis de forma a reduzir os
riscos e procurar parceiros que possam ajudar a reduzir estes.
Sustentabilidade Financeira
- Procurar fazer uma previsão dos custos para que no final do ano
as despesas não superem as receitas.
- Criar uma almofada financeira para reduzir riscos
Missão
Promover a educação como forma de reduzir as desigualdades específicas de cada localidade e como fator crucial para o progresso em termos
de desenvolvimento.
Externalidades
Positivas
- Capacitação da
população
- Aumento da
produtividade
- Surgimento de
novas atividades
- Estimulação das
economias
- Melhorias no setor
da saúde
- Comunitarismo
democrático
Externalidades
Negativas
- Dependência da
população da ONG
- Atuação no terceiro
setor
- Diversidade dos
meios de entre
ONGs
- Possibilidade de
desiquilibrio da
economia
- Criação de
comunidades
segregadas
Atividades-Chave
- Aulas / formações
- Participação Comunitária
- Angariação de fundos
Atividades Secundárias
- Saúde e bem-estar
Nota: Com base nas
atividades definir todos os
recursos necessários
Solução
Possibilitar o acesso à
educação a todos os que
estejam interessados do
público-alvo
Indicadores / Resultados
- Nº de Alunos
- Evolução do aproveitamento
escolar
- Nº de ações feitas
Proposta de Valor
Passar a proposta de valor
da maneira mais impactante,
visual e atrativa, mostrando
que:
- Apoiar o desenvolvimento
de realidades necessitadas é
acessível
- Todos têm a possibilidade
de dar o seu contributo.
- Os resultados são notórios
e quanto mais possibilidades
haja, mais se muda.
Relação com os
beneficiários
Medir o seu interesse e
evolução para dar uma
resposta completa e
adaptada
- A Priori
- Durante
- Posteriori
Relação com os
Contribuintes
Definir uma estratégia
para atrair interesse e
recolher fundos através de:
- Padrinhos/associados
- Doações
- Vendas
- Eventos
- Fundos e Subsídios
Canais de
Comunicação
- Redes Sociais
- WebSite
- Newsletter
Canais de Distribuição
- Internacional
- Nacional
- Local
Canais de Vendas
- Direto
- Indireto
Parceiros
Detetar todos aqueles que
possam dar algum
contributo seja em bens
ou servos
- Associações/Instituições
- Empresas
- Entidades públicas
- Parceiros locais
Problema
Vulnerabilidade de
comunidades devido ao nível
baixo de educação.
Fonte: Elaboração própria
3.2. Validação do modelo
Com vista a validar o modelo construído, utilizou-se umacnica de focus group,
materializada num painel de cinco observadores qualificados convidados
propositadamente para o efeito e a quem foi pedido que se pronunciasse sobre a
aderência do modelo proposto à realidade representada.
Foram organizadas três sessões com a duração de 60 minutos cada e um intervalo de
24 horas entre cada uma delas. Dada a situação pandémica vigente, as sessões
decorreram virtualmente, com recurso à plataforma digital Zoom.
Os cinco especialistas foram:
- O representante de uma ONGD da área da educação a atuar em Moçambique,
exterior à amostra estudada;
- Um beneficiário de um projeto de educação de uma ONGD da área da educação a
atuar em Moçambique, com 18 anos de idade;
- Um cliente/contribuinte de uma ONGD da área da educação a atuar em
Moçambique;
- Um parceiro de uma ONGD da área da educação a atuar em Moçambique;
- Um representante do Ministério da Educação e Desenvolvimento Humano de
Moçambique.
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O teste do modelo foi efetuado de acordo com a abordagem proposta por Fern (1982).
Começou-se pela discussão da Missão. Apesar de se ter verificado uma concordância
generalizada com a mesma, os membros do painel sugeriram que a formulação
existente fosse complementada com “humano e económico” para precisar o tipo de
desenvolvimento visado pelas ONGDs de educação.
De seguida, analisou-se o Problema. Houve um consenso no painel sobre a importância
dos elementos formulados. No entanto, foi salientada a pertinência de se acrescentar
indivíduos e famílias e não restringir a problemática apenas às comunidades.
Relativamente às atividades-chave, o painel entendeu como válidas as atividades
avançadas, mas sugeriu que se acrescentasse uma componente relativa à mobilização
de voluntários. Considerando a realidade concreta do país, e a experiência específica
dos membros do painel, os voluntários são uma componente determinante do sucesso
destas organizações.
Quanto à Proposta de Valor, o painel achou interessante os elementos incluídos nesta
secção, mas sugeriu uma reformulação para deixar mais claro quer o conceito de valor
num modelo de negócio social quer o alcance do mesmo.
Quanto à relação com os beneficiários, o painel considerou particularmente pertinente a
objetivação por etapas temporais. Propôs, no entanto, que se especificassem os
beneficiários não vendo vantagem em ficarem subentendidos.
O bloco Relação com os Contribuintes encontrou um suporte unânime, tendo sido
considerado que o mesmo reflete a realidade da população estudada.
Na análise dos Parceiros, o painel considerou que o estudo feito é correto, mas que a
enumeração dos mesmos não deveria ser restringida, tendo por isso sido sugerido
acrescentar-se “nomeadamente, mas não exclusivamente”.
No bloco dos Canais, o painel considerou particularmente pertinente a apresentação
desenvolvida em três subgrupos. Houve, portanto, suporte à formulação efetuada deste
bloco.
Na discussão dos elementos colocados na Solução, o painel entendeu que era clara a
formulação desenvolvida, mas que seria pertinente juntar, no final, “de cada projeto
e/ou ONGD específica”.
Quanto aos Indicadores / Resultados, o painel concordou com os elementos escolhidos
e discutiu alguns outros que se poderiam juntar a estes. No entanto, dessa análise não
resultou propriamente uma proposta concreta de junção de indicadores, mas apenas
uma recomendação no sentido de se consideraram mais alternativas.
A apreciação do painel sobre a sustentabilidade financeira é que, no modelo proposto,
os elementos apresentados refletem uma resposta satisfatória às exigências do modelo
utilizado, dando assim suporte à proposta feita.
Relativamente à Estrutura de Custos, o painel entendeu que poderia haver uma maior
precisão deste elemento, tendo em conta as informações recolhidas aquando da
apreciação dos dados coletados.
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Relativamente à apreciação das externalidades, e começando pelas positivas, o painel
sugeriu pequenas melhorias de pormenor que foram prontamente atendidas e
reapresentadas ao mesmo painel para validação final.
Sobre as externalidades negativas, foram também sugeridas pequenas alterações e
precisões tendo sido referido que, globalmente, a proposta apresentada refletia a
opinião dos elementos deste focus group.
Assim sendo, o modelo validado apresenta a seguinte configuração:
Figura 3 - Modelo de negócio social Canvas para as ONGDs na área da educação em
Moçambique, após validação por focus group
Fonte: Elaboração própria
Conclusão
O presente trabalho representa o primeiro caso identificado na literatura de aplicação e
validação do Social Business Model Canvas em ONGDs em Moçambique. Os resultados
alcançados e descritos na presente investigação sustentam a pertinência de se utilizar o
Parceiros
Detetar todos aqueles que
possam dar algum
contributo, seja em bens
ou serviços,
nomeadamente mas não
exclusivamente:
- Associações/Instituições
- Empresas
- Entidades públicas
- Parceiros locais
Externalidades
Negativas
- Dependência da
população relativamente
às ONG
- Aumento da atuação no
terceiro setor e recuo
simultâneo dos demais
- Possibilidade de maiores
desiquilibrios económicos
- Aumento potencial da
segregação de algumas
comunidades
Estrutura de Custos
Fazer previamente uma análise de risco operacional para
determinar o nível de custos fixos sustentável procurando, sempre
que possível, substituí-los por custos variáveis já que a
alavancagem operacional não é um objetivo destas organizações.
Sustentabilidade Financeira
- Procurar fazer uma previsão dos custos para que no final do ano
as despesas não superem as receitas.
- Criar uma almofada financeira para reduzir riscos
Missão
Promover a educação como forma de reduzir as desigualdades específicas de cada localidade e como fator crucial para o progresso
em termos de desenvolvimento humano e económico.
Externalidades Positivas
- Capacitação da
população em
competências
fundamentais
- Aumento da
produtividade da economia
moçambicana
- Desenvolvimento de
novas atividades
económicas
- Dinamização de
atividades económicas
deprimidas
- Melhorias no setor da
saúde
- Incremento do
comunitarismo
democrático
Problema
Vulnerabilidade de
indivíduos, famílias e
comunidades devido ao
nível baixo de educação.
Atividades-Chave
- Aulas / formações
- Participação Comunitária
- Angariação de fundos
- Mobilização de
voluntários
Atividades Secundárias
- Saúde e bem-estar
Nota: Com base nas
atividades definir todos os
recursos necessários
Proposta de Valor
O benefícios genérico
oferecido é a
EDUCAÇÃO. Assim:
- Apoiar o
desenvolvimento de
realidades necessitadas é
possível
- Todos encontrarão um
espaço de intervenção
para dar o seu contributo
- Os resultados são
expressivos e claramente
mensuráveis
Os beneficiários são os
indivíduos carenciados
de educação, por
grupos etários, níveis de
qualificações prévias e
áreas geográficas
Medir o seu interesse e
evolução para dar uma
resposta completa e
adaptada nas várias
etapas:
- A Priori
- Durante
- Posteriori
Relação com os
Contribuintes
Definir uma estratégia
para atrair interesse e
recolher fundos através
de:
- Padrinhos/associados
- Doações
- Vendas
- Eventos
- Fundos e Subsídios
Solução
Possibilitar o acesso à
educação a todos os que
estejam interessados do
público-alvo de cada
projeto e/ou ONGD
específica
Indicadores / Resultados
- Nº de Alunos
- Evolução do
aproveitamento escolar
- Nº de ações feitas
Canais de Comunicação
- Redes Sociais
- WebSite
- Newsletter
Canais de Distribuição
- Internacional
- Nacional
- Local
Canais de Vendas
- Direto
- Indireto
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modelo de negócio enquanto framework fundamental na avaliação das atividades de
organizações do terceiro setor.
Importantes implicações podem ser retiradas quer para a gestão destas organizações
quer para a gestão da educação em Moçambique. A participação de um representante
do Ministério da Educação e Desenvolvimento Humano de Moçambique permitiu
considerar esta segunda visão no modelo validado.
Por fim, referem-se como principais limitações o facto de o ter sido possível incluir
mais observações na nossa amostra nem dados detalhados dos custos das ONGDs
avaliadas.
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