OBSERVARE

Universidade Autónoma de Lisboa

ISSN: 1647-7251

Vol. 5, n.º 1 (Maio-Outubro 2014), pp. 15-32

AS ÁGUAS TURBULENTAS DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL

COMBATE UNIVERSAL À IMPUNIDADE

OU UNIVERSALIZAÇÃO LIBERAL?1

Mateus Kowalski

mateuskowalski@ces.uc.pt Doutor em Política Internacional e Resolução de Conflitos pela Universidade de Coimbra, Mestre em Direito Internacional pela Universidade de Lisboa e Licenciado em Direito pela Universidade de Coimbra. Autor de artigos e comunicações sobre teoria do Direito Internacional, o sistema das Nações Unidas, direitos humanos, assuntos sobre a paz e assuntos de segurança. Docente convidado na Universidade Autónoma de Lisboa, onde é investigador na área da justiça penal internacional (Observatório de Relações Exteriores), e na Universidade Aberta. Conselheiro jurídico no Ministério dos Negócios Estrangeiros de Portugal, no domínio do Direito Internacional. Delegado a diversas organizações internacionais, incluindo as Nações Unidas, a União Europeia ou o Conselho da Europa.

Resumo

A dimensão universalista da natureza e função do Tribunal Penal Internacional (doravante “TPI”) é pois evidente. Contudo importa situar com rigor aquela dimensão. No fundo, perguntar “que universalismo”? Uma abordagem de base racional às relações sociais internacionais é distinta de uma outra de base ética. Enquanto a abordagem racional pode ter por efeito a universalização de modelos morais concretos localizados (v.g. o modelo liberal-ocidental) promovendo a sua hegemonia, já a abordagem ética promove a diversidade através de uma equação que relaciona diferenças não-redutíveis e fenómenos comuns da humanidade em que apenas é universal um mínimo ético comum. No contexto desta problemática, o presente artigo argumenta que a resposta a esta questão estrutural é essencial para perceber se o Tribunal Penal Internacional se trata essencialmente de um instrumento hegemónico de expansão de um modelo liberal ocidental dominante ou antes de um mecanismo de combate à impunidade no respeito pela diversidade e assente numa preocupação de base axiológica.

O presente artigo conclui que o Tribunal Penal Internacional corre em águas turbulentas onde nem sempre é possível separar uma abordagem universalizadora de matriz liberal de uma outra abordagem universal de base ética. Contudo, conclui igualmente que é ainda assim possível afirmar que o Tribunal, mesmo que possa parcialmente e a espaços servir como veículo hegemónico, é informado essencialmente pela dimensão de universalização do combate à impunidade por referência a um mínimo ético comum.

Palavras-chave

Tribunal Penal Internacional; Universalismo; Ética

Como citar este artigo

Kowalski, Mateus (2014). "As águas turbulentas do Tribunal Penal Internacional. Combate universal À impunidade ou universalização liberal?". JANUS.NET e-journal of International Relations, Vol. 5, N.º 1, Maio-Outubro 2014. Consultado [online] em data da última consulta, observare.ual.pt/janus.net/pt_vol5_n1_art2

Artigo recebido em 18 de Março de 2014 e aceite para publicação em 25 de Março de 2014

1Artigo elaborado no contexto do projeto de investigação “A Justiça Penal Internacional: Um Diálogo entre Duas Culturas”, em curso no Observatório das Relações Exteriores – Observare / UAL, coordenado por Mateus Kowalski e Patrícia Galvão Teles. O artigo traduz unicamente a visão pessoal do autor não podendo ser confundido com a posição oficial do Ministério dos Negócios Estrangeiros de Portugal.

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As águas turbulentas do Tribunal Penal Internacional.

Combate universal à impunidade ou universalização liberal?

Mateus Kowalski

AS ÁGUAS TURBULENTAS DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL

COMBATE UNIVERSAL À IMPUNIDADE

OU UNIVERSALIZAÇÃO LIBERAL?

Mateus Kowalski

1. Introdução

O Estatuto de Roma que cria o Tribunal Penal Internacional2 abre com uma declaração de grande significado pela qual os Estados que são Parte no Estatuto3 afirmam estar «conscientes de que todos os povos estão unidos por laços comuns e de que as suas culturas foram construídas sobre uma herança que partilham, e [estar] preocupados com o facto de este delicado mosaico poder vir a quebrar-se a qualquer instante»4. O preâmbulo do Estatuto de Roma apela também à «consciência da humanidade» e «à paz, à segurança e ao bem-estar da humanidade»5. No fundo, estas linhas traduzem a visão universalista de uma ética comum a toda a humanidade, que haverá que proteger, disseminar e promover. É neste espírito que o próprio Presidente do Tribunal Penal Internacional, o juiz sul-coreano Sang-Hyun Song, se refere ao papel do Tribunal como um «moral imperative for humankind» (2013: 4).

A dimensão universalista da natureza e função do Tribunal Penal Internacional (doravante “TPI”) é, pois, evidente. Contudo, importa situar com rigor aquela dimensão. No fundo, perguntar “que universalismo”? Uma abordagem de base racional às relações sociais internacionais é distinta de uma outra de base ética. A abordagem racional assenta numa ideia de processo racional único e sua priorização – um processo, portanto, universal e extensível a todos os seres humanos. Assim, é possível identificar um amplo acervo de interesses e objetivos da comunidade global, tendencialmente universais e indiscutíveis quando fruto de um processo racional dedutivo correto, de onde decorrem verdades únicas e universais. Já uma abordagem de base ética convoca uma análise – que comporta um vasto espetro de subjetividade

conduzida por um acervo ético comum mínimo alcançado por via do diálogo: a diversidade, o pluralismo e o nível local são mais valorizados. Enquanto a abordagem racional pode ter por efeito a universalização de modelos morais concretos localizados (v.g. o modelo liberal-ocidental) promovendo a sua hegemonia, já a abordagem ética promove a diversidade através de uma equação que relaciona diferenças não-redutíveis e fenómenos comuns da humanidade em que apenas é universal um mínimo ético comum. E daqui decorre a questão de saber em qual destas abordagens se situa o TPI.

2Na sua designação formal, Estatuto do Tribunal Penal Internacional, adotado em Roma, a 17 de julho de 1998.

3Atualmente são Partes no Estatuto de Roma 122 Estados.

4Vide parágrafo 1.º dos considerandos do preâmbulo do Estatuto de Roma.

5Vide, respetivamente, parágrafos 2.º e 3.º dos considerandos do preâmbulo do Estatuto de Roma.

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O presente artigo argumenta que a resposta a esta questão estrutural é essencial para perceber se o TPI se trata essencialmente de um instrumento hegemónico de expansão de um modelo liberal ocidental dominante ou antes de um mecanismo de combate à impunidade no respeito pela diversidade e assente numa preocupação de base axiológica. No primeiro caso, haverá que tornar o Tribunal irrelevante e ao mesmo tempo ficar satisfeito pelos seus pouquíssimos sucessos judicias6. No segundo caso, haverá que preservar o Tribunal e melhorá-lo no sentido de o afirmar definitivamente como um dos guardiões da justiça penal internacional, no combate universal à impunidade e na proteção e promoção dos direitos fundamentais do ser humano.

Neste sentido, no presente artigo, serão, primeiro, analisadas as duas abordagens universalistas – a de base racional e a de base ética. Num segundo momento procurar- se-á situar o TPI naquela análise considerando a natureza do Tribunal na ordem jurídica internacional bem como algumas características daquela instituição tais como uma eventual seletividade, a sua relação com o Conselho de Segurança das Nações Unidas, a conceção jurídico-penal que lhe está na origem, bem como a sua complementaridade.

O combate universal à impunidade não tem de significar a universalização de um modelo de matriz liberal-ocidental pelo esbatimento artificial e hegemónico do que é na realidade social e axiologicamente diferente. É nestas águas turbulentas que corre o TPI.

2.Que Universalismo?

2.1.O Universalismo Racional e a Ética Universal

Qualquer discurso sobre o universalismo incluirá sempre uma dimensão ético- normativa universal. Neste sentido, poderão ser apontadas duas linhas de pensamento relativas ao universalismo: a da tradição, que invoca a existência de uma razão universal comum a todos os seres humanos; e a de índole pós-positivista, que rejeita o argumento de uma razão universal – a ideia de universalidade radica antes no reconhecimento de diferenças não-redutíveis a partir das quais se desenvolve7. Ou

6Nestes seus quase 12 anos de existência, o TPI apenas proferiu sentenças relativamente ao caso Procurador v. Thomas Lubanga Dyilo (caso ICC-01/04-01/06) e Procurador v. Germain Katanga (caso ICC-01/04-01/07). À data destes escritos, ambas as sentenças estão ainda sujeitas a recurso.

7Os debates sobre o universalismo – sua defesa, recusa ou mitigação – radicam em atitudes epistemológicas diferentes. As diferenças são marcantes nos discursos de índole positivista (também designados por da “tradição” ou “ortodoxos”) e os de índole pós-positivista que fazem da crítica ao modo de ser das abordagens dominantes de matriz liberal da tradição a base da sua narrativa. O “positivismo” designa a escola de pensamento científico que defende que o conhecimento sobre o mundo é sustentado pela experiência, a observação e a verificação – método muito próximo do das ciências da natureza – oferecendo assim uma teoria orientada para a imediata resolução de problemas. Aceita o primado da factualidade supostamente objetiva e repetidamente registada. Esta é a abordagem científica hoje dominante e mais apelativa (por lidar com o poder no anunciado fim da história) – no Direito Internacional e também nas Relações Internacionais – que os pós-positivistas tendem a apelidar de “positivismo”. O positivismo envolve uma separação cartesiana entre mente e matéria, entre sujeito e objeto. O investigador positivista pretende que os valores e interesses não interfiram na sua observação, leitura e análise dos dados empíricos – de intencionalidade neutra –, procurando assim uma solução única

– a “verdade” – deduzida por via da razão que é universal.

Por seu turno, a orientação pós-positivista procura novos modelos que superem as insuficiências da abordagem do positivismo. Se os positivistas professam um modelo de investigação que reconhece uma fronteira entre o sujeito e o objeto, os pós- positivistas afirmam que todo o conhecimento é contextual e que a subjetividade não pode nem deve ser apagada. A abordagem pós-positivista recusa, pois, o empirismo de dicotomias (verdadeiro/falso, bom/mau, paz/guerra) e propõe uma abordagem geral menos ingénua e mais sofisticada, sem verdades únicas orientadas de forma total pela razão. Tudo isto levou a

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seja, a universalidade não pode pôr em causa essas diferenças não-redutíveis, sendo antes pautada pelas seguintes proposições conjugadas: diferenças não-redutíveis e fenómenos comuns a toda a humanidade que exigem uma resposta coletiva de potencial universal (v.g. as alterações climáticas). A questão de saber se as diferentes comunidades sociais estão obrigadas a participar num discurso universal é menos importante do que os debates sobre a natureza de um diálogo autêntico e o seu âmbito subjetivo (Linklater, 1998).

O universalismo é, pois, simultaneamente “tudo o que nos separa e tudo o que nos une”. O que deverá ser questionado é, “universalismo” relativamente a quê? A tradição responde com as verdades determinadas pela razão. A teoria crítica, introduzindo o elemento subjetivo, defende que relativamente a princípios morais que possam ser operacionalizados através da capacidade comunicativa do ser humano, incluindo no quadro de uma arquitetura institucional que poderá ter âmbito universal. A razão não é, para esta perspectiva, a única caraterística humana que determina a reflexão e a ação humanas – devem ser igualmente consideradas outras, tal como o contexto social, o cultural, o político ou o económico, e ainda aquelas que estão diretamente relacionadas com a personalidade. No quadro das atitudes pós-positivistas, a teoria crítica assume a desconstrução de discursos, programas e ações de índole hegemónica. Para esta abordagem o entendimento universalista de base racional pode aniquilar a diversidade e propiciar a hegemonia. Na sequência, este perspectiva manifesta prudência relativamente a normas proclamadas como universais que podem não ser mais do que um disfarce para a imposição de interesses e de relações de dominação pelos mais poderosos. O universalismo poderia, assim, dar lugar a uma hegemonia expansiva a partir de uma hegemonia ao nível nacional estabelecida por uma classe dominante que se torna num padrão a ser copiado externamente. Numa abordagem à dimensão económica das relações de produção, Cox define hegemonia como «an order within a world economy with a dominant mode of production which penetrates into all countries and links into other subordinate modes of production» (1993: 62). Uma tal expansão encontra menos resistência nos Estados mais periféricos como se de uma revolução passiva se tratasse.

A teoria crítica, e tal como refere Hoffman (1988), assume, pois, a resistência ao universalismo enquanto forma de hegemonia procurando antes no conhecimento um caminho para uma forma de universalismo mais representativo. O problema não estará, pois, no universalismo em si. Está no uso que pode ser feito do conceito e a apropriação que dele pode ser feita por estruturas de poder, em particular a partir do modelo ocidental de matriz liberal.

Contudo, a problemática pode ser enunciada num sentido positivo: é a existência de uma efetiva base ética comum que deve ser reconhecida de modo a que os limites da diversidade sejam bem identificados e preservados. Ela existe, pois, nos seus próprios limites que não devem ser artificialmente ampliados de forma hegemónica para além da diversidade e do pluralismo da realidade social. Porém, a realidade pluralista convive efetivamente com inflexões universalistas relativas a um tal mínimo ético comum e a problemas transversais a toda a humanidade que se manifestam num mesmo tempo histórico. Nas palavras de Küng, «for today’s pluralistic society, ethical consensus

uma contestação das teorias da “tradição” pelos cultores das abordagens pós-positivistas, de pendor crítico, nomeadamente por via da teoria crítica.

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means the necessary agreement in fundamental, ethic standards which […] can serve as the smallest possible basis for humans living and acting together» (1997: 97).

O pensamento de Linklater (1998) traz importantes contributos para a questão. Refere o autor que a não conceção ética é satisfatória apenas se se apoiar a exclusão sistemática de qualquer membro da comunidade humana que tenha potencial para se tornar universal. A universalidade não assume aqui nem a essência de perspetivas de Direito Natural nem a teleologia das filosofias especulativas associada ao Iluminismo. A universalidade assume a forma de uma responsabilidade para abordar outros, independentemente das suas caraterísticas raciais, nacionais ou outras, num diálogo aberto sobre assuntos que digam respeito ao seu bem-estar. Aliás, existem discursos morais que gozam de uma validade transcultural. São de tal exemplos os discursos contra a escravatura, o genocídio ou da prevalência da justiça e da sustentabilidade ambiental, mesmo no contexto de um conflito. Por outro lado, trata-se igualmente de encontrar procedimentos tendencialmente universais que permitam o convívio de todos em paz.

A base ética comum traduz-se em princípios jurídicos e direitos presentes de forma transversal nas várias comunidades culturais, onde, salvo alguma anomalia individual, são aceites. A denominação, o conteúdo, bem como a sua interpretação e aplicação podem variar. Mas a essência jurídico-filosófica daqueles princípios é comum. Conforme sublinha Kartashkin, «toutes les cultures et civilisations partagent, dans leurs traditions, coutumes, religions et croyances, un ensemble commun de valeurs traditionnelles qui appartiennent à l’humanité dans son ensemble» (2011: 7). A fundamentalidade destes núcleos éticos justifica a necessidade de partirem do nível local, num diálogo horizontal e também vertical ascendente.

A justiça, na sua dimensão jurídico-filosófica, é um dos princípios que integre a base ética comum. O Direito Internacional tem por objetivo realizar a justiça, embora possa ser um fim fracassado. A justiça precede, pois, o Direito. Na entusiástica afirmação de Rawls, «justice is the first virtue of social institutions, as truth is of systems of thought» (1999: 3). Contudo, não se pode confundir esta precedência liberal do justo sobre o bom (sistema de valores) enunciado por Rawls com a precedência da justiça sobre o Direito. É a partir do sistema de valores de uma sociedade historicamente situada que se determina o que é justo. O dinamismo da justiça reflete de forma imediata a constante evolução social e cultural que, por isso, não encontra no Direito positivado – i.e. na normatividade jurídica – um reflexo pleno. Daí a justiça ser um fator determinante da transformação social progressista por via do Direito Internacional: transfere o seu dinamismo para o corpus juris jurídico-internacional que estará imperfeito enquanto não se atualizar face ao conteúdo moral ou cultural do contexto social que a justiça deve tutelar em permanência. Do ponto de visto jurídico-filosófico, a justiça corresponde à procura e aplicação do que é justo segundo as preposições axiológico-normativas vigentes em cada sociedade.

2.2.A “Comunidade Moral” Internacional

A ideia de comunidade internacional de base humana, agregada por uma ética universal (que não pode ser confundida com uma sociedade internacional diplomaticamente disfarçada de “comunidade” internacional) consubstancia a abordagem do universalismo de base ética. Trata-se, no fundo, daquilo a que Linklater

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(1996) designa por “comunidade moral”. Uma comunidade que, não sendo imutável, confere as condições para que o indivíduo construa a sua própria história e provoque a transformação progressista do sistema social.

No contexto de uma ordem internacional imersa num processo de globalização, o propósito de edificação de uma “comunidade moral” serve como alavanca de afirmação do elemento ético no contexto de um Direito Internacional universal em processo de institucionalização, socialização e humanização (Carrillo Salcedo, 1984) e que encerra um enorme potencial transformador. Um processo que encontra eco no Direito Internacional para os seres humanos e de finalidades que refere Bedjaoui (1991), no Direito de intenção comunitária de Simma (1994) ou no Direito interno da Humanidade sugerido por Abi-Saab (1991). Todavia, todo este processo – potencialmente benéfico – deve ser empreendido com cautela e profundo exame para evitar «el regresso a la anarquía bajo el disfraz de la comunidade» (Pureza, 2005: 1180).

A moral é argamassa social e deve ter uma tradução histórica e socialmente situada correspondente ao entendimento social axiológico-normativo num dado momento. A questão é a de saber se ela é possível sem uma rutura com a modernidade. Cultores da teoria crítica afirmam pela positiva (Richmond, 2011); autores do pós-estruturalismo recusam a possibilidade (Hawley, 2001). A noção de “comunidade moral” pode ajudar a resolver o problema, numa perspetiva pluralista sem que seja sectarista; numa perspetiva ascendente (pluralismo) ao invés da imposição descendente (universalismo sem legitimidade). A problemática joga-se também em determinar como pode existir legitimidade sem que se crie um Estado Mundial e renegando simultaneamente a perspetiva particularista de que a legitimidade só decorre do Estado. A princípio surgem de imediato duas hipóteses: ou se confia nas organizações internacionais reformadas (reformas de fundo que não se afiguram concretizáveis num futuro próximo); ou se mantém a desagregação da sociedade internacional, destruturada, conferindo legitimidade a comunidades de base étnica, cultural, sem assim se redundar novamente num sistema de Estados. Todavia, numa outra abordagem, o sistema multinível pluralista pode oferecer ainda outras respostas.

Importa então, neste contexto teórico, perceber o que une as realidades normativas plurais. Ora, as questões globais são incapazes de serem contidas e reguladas no interior das fronteiras estaduais. Logo, estando em causa problemas relativos a bens comuns da humanidade, aqueles carecem de uma solução regional ou global. No entanto, essa solução poderá ter expressões plurais e dissimétricas (para pontos de partida diferentes) e redistributivas. O que assim sugere a necessidade de uma regulação por diretivas (princípios e objetivos). Aqui, a perspetiva de uma abordagem multinível poderá fazer sentido. Longe de qualquer Estado Mundial, trata-se antes de congregar as respostas de solidariedade num sistema, considerando que os pontos desse sistema se encontram em contextos de necessidades, capacidades e identidades diferentes. A legitimidade tem que deixar de ser uma prerrogativa exclusiva do Estado soberano. Assim, e perfilhando aqui as reflexões de Habermas (2008) sobre o assunto, as instituições supraestaduais podem elas próprias conferir legitimidade sem recorrer à figura do Estado Mundial – que, de contrário, seria a única forma de conferir legitimidade ao nível internacional. Por outro lado, trata-se de aceitar que a pluralidade de regimes jurídicos ou mesmo o confronto entre eles são a plataforma jurídico-política atual. O maior problema poderá ser o da homogeneidade do conhecimento, da

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perceção e das metodologias relativas a esta pluralidade (Koskenniemi, 2005). Precisamente o que as abordagens pela teoria crítica pretendem geralmente superar.

O objetivo da pluralidade ético-normativa traz, pois, diversos desafios à legitimidade do Direito Internacional contemporâneo, na medida em que este impõe valores a comunidades locais que não partilham deles. A conceção pluralista do mundo defende que existem blocos de valores diferentes e imutáveis; esses valores podem entrar em conflito entre si em determinadas circunstâncias; não há forma de resposta a estes conflitos que possa ser valorada como boa ou má; ao nível individual e coletivo surgem formas diferentes de agir em função dos valores e ações que podem ser conflituantes. Logo, não existe uma única forma ideal de relacionamento social. Daqui decorre que uma ordem pública universal totalizadora traduzir-se-ia na supremacia de uma ordem sobre as restantes (que irá inevitavelmente impor valores globais, hoje maioritariamente de matriz liberal ocidental). Enquanto a abordagem liberal promove o respeito pelas convicções morais ou religiosas por via da tolerância ou ignorando-as, na perspetiva pós-positivista o respeito por essas convicções faz-se pelo compromisso com elas (Sandel, 2005). Ou seja, dando-lhes atenção, ouvindo-as e desafiando-as. O respeito alicerçado na comunicação não garante (nem o pretende) um consenso relativamente a essas convicções. Antes, no contexto de uma sociedade pluralista, é um pressuposto indispensável para a sã convivência entre a diversidade de valores, formas de pensamento e regimes jurídicos.

O pluralismo não deve significar todavia a negação do universalismo. Como refere Shaffer, «the normative vision of legal pluralism rather aims to foster transnational and global legal order out of the plural» (2012: 673). O universalismo traduz desde logo a importância de se encontrarem mecanismos para respostas comuns no que respeita aos fenómenos comuns. Pode mesmo implicar a criação de uma ordem pública universal, mas pela negativa: como exceção – ou talvez melhor, como complemento – ao pluralismo que preserve as diferenças não-redutíveis. Como tal, implica construir um sistema jurídico multinível que, num quadro pluralista, permita a comunicação não hierarquizada entre vários contextos sociais depurada de relações de hegemonia – a comunidade moral. Esta abordagem pluralista com inflexões universalistas organizadas num sistema multinível permite uma abordagem nivelada – por contraposição a uma abordagem totalizadora – em função do nível em que a necessidade de ação comum se faz sentir. Importa aqui recordar a afirmação de Sousa Santos: «o global acontece localmente. É preciso fazer com que o local contra-hegemónico também aconteça globalmente» (2001: 79). O nível mais problemático é o global pelo risco de propagação universal de relações de poder hegemónicas. Em todo o caso, existem bens jurídicos globais (v.g. o ambiente, a justiça ou a paz) tal como existe uma base ética comum (universal), uma base ética grupal (translocal) e uma base ética cultural (local), sendo que todas têm em comum a de nível global e que várias têm em comum as de nível translocal. Tal premissa implica a necessidade de estruturas comunicativas de emancipação que esvaziem o risco de hegemonia. Organizar o pluralismo não significa, pois, impor uma ordem pública universal homogénea e até hegemónica mas criar condições de legitimidade política para construir a ordem respeitando o pluralismo (Delmas-Marty, 2009).

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3.O TPI e a Ordem Pública Universal

3.1.Um Órgão de Soberania Universal

A construção e desenvolvimento de uma ordem jurídica pública e global – hoje dominante no pensamento sobre o sistema global – assenta numa perspectiva liberal da universalidade com fundamento na razão humana. O processo mental subjetivo próprio de cada indivíduo determinado pela razão passa a ser o elemento comum que fundamenta o universalismo. Os ideais de Kant (2009) de um Direito cosmopolita e de uma república mundial fundada na razão conformam o ponto de partida do entendimento universalista da ordem pública dominante, com expressões marcantes na doutrina liberal vigente. Um elemento que caracteriza de forma fundamental as conceções universalistas modernas é, pois, a existência de uma razão universal que permite objetivar a realidade e identificar uma perceção racional única para os mesmos factos.

Ao contrário do que acontece com as conceções conservadoras e particularistas8 do Direito Internacional, as correntes que se congregam no universalismo defendem que uma ordem pública universal é possível e recomendável, quando não mesmo uma construção lógica induzida pela razão (Dellavalle, 2010). Estas correntes partilham uma conceção universal da ordem pública, dotada de um núcleo normativo fundamental que

écomum aos atores internacionais e instituições para a ação coletiva em prol de objetivos universais. Na afirmação de Tomuschat, o Direito Internacional é um «comprehensive blueprint for social life» (1999: 42).

Os mecanismos para a organização da realidade global vão muito além do Estado na sua aceção individual. Para o universalismo, o Direito Internacional deve, pois, regular de forma abrangente a sociedade internacional nas várias dimensões da atuação humana que não se confinem à jurisdição do Estado e relativamente aos seus vários atores, designadamente o indivíduo. O desenvolvimento do Direito Internacional, e consequentemente o reforço da ordem pública universal, é deste modo encarado como um motor civilizacional na medida em que permite a regulação da fenomenologia global em função de princípios e valores universais determinados pela razão.

A incorporação na ordem pública global dos direitos considerados naturais e inalienáveis do indivíduo é de tal um exemplo paradigmático: a situação do indivíduo deixa de ser uma questão limitada à esfera do Estado de jurisdição e passa a relevar como interesse da comunidade global. O desenvolvimento do sistema de direitos humanos constitui a aplicação ao nível global de um princípio clássico do constitucionalismo estadual – o da promoção e proteção dos direitos fundamentais dos indivíduos pertencentes à comunidade. Neste sentido, não apenas se verifica um processo de constitucionalização do sistema internacional de direitos humanos – dando origem a verdadeiros direitos constitucionais internacionais – como também esse processo promove o próprio constitucionalismo global (Gardbaum, 2008), uma forma

8As conceções particularistas assumem a perspectiva de que a política nada mais é do que a luta pelo poder, sendo um fenómeno diferente do Direito e ao qual não está sujeito. Com a necessidade de relacionar o processo político interno com o fenómeno da globalização, surgiram conceções particularistas que procuraram recentrar o Estado na sua qualidade de ator absolutamente dominante no espaço internacional, negando a existência de uma verdadeira ordem internacional e preservando a sua autossuficiência soberana. Sobre o assunto, vide entre outros Rabkin (2004), Kagan (2004) ou Goldsmith e Posner (2005).

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apologética do universalismo de racionalidade objectiva (Kowalski, 2012). Esta conclusão decorre da perspetiva liberal dominante dos direitos humanos centrada no indivíduo de dimensão universal. Contudo, importa sublinhar que outras perspetivas sobre os direitos humanos podem não levar à mesma conclusão, nomeadamente as que entendem que o indivíduo não pode ser considerado fora do contexto sociocultural específico em que se insere. Assim, a abordagem que coloca a tónica nos direitos coletivos e dos povos põe em causa a premissa liberal da universalidade dos direitos humanos advogando que determinados grupos (entre outros, os de base religiosa, social ou étnica) podem invocar direitos específicos ou interpretações específicas desses direitos, que assim não se aplicam universalmente mas apenas ao grupo (Jones, 1999). Por outro lado, outras abordagens questionam mesmo a validade dos direitos humanos de origem “ocidental” universalizados a outros contextos socioculturais (Freeman, 2011).

A judicialização internacional é uma característica marcante das abordagens de matriz liberal à ordem jurídica universal (Kingsbury, 2012). O TPI enquadra-se de forma evidente nesta conceção universalista de matriz liberal (Kowalski, 2011). No contexto da ordem pública universal, do ponto de vista institucional, verifica-se uma tendência para a criação de “órgãos de soberania”. A ação penal pelo TPI ilustra a assunção ao nível da governação global de funções tipicamente estaduais. A ação penal é um poder tradicionalmente caraterístico do núcleo de soberania do Estado. A criação do TPI significa uma rutura com este postulado clássico: o poder penal passa a poder ser exercido também numa ordem que está além da esfera pública estadual quando estejam em causa crimes graves que afetem a comunidade internacional no seu conjunto. Este poder penal internacional não carece de uma autorização pelos Estados. O inquérito, o mandado de detenção ou o julgamento podem ser despoletados por uma decisão do Tribunal, podendo mesmo ser contrária à vontade dos Estados que tenham jurisdição primária sobre o caso. Assim é nas situações em que a jurisdição tenha sido estabelecida pelo Procurador do TPI ou pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas, nos termos do artigo 13.º do Estatuto de Roma, o que pode mesmo implicar assumir a jurisdição face a Estados que não são Partes no Estatuto.

A abordagem universalista racional da ordem pública universal não está contudo isenta de problemáticas e desafios fundamentais. Zolo (1997) identifica na tese a que apelidou de “cosmopolitismo jurídico” um conjunto de premissas que são, segundo o autor, informadas por um conjunto de dificuldades e insuficiências: em primeiro lugar, a enunciação do princípio do primado do Direito Internacional e da igualdade formal dos Estados é apenas aparente na medida em que, na prática, a disparidade entre países ricos e pobres implica necessariamente a hierarquização da ordem pública internacional bem como a desigualdade entre sujeitos; depois, a confiança num sistema jurisdicional internacional centralizado não é compatível com o facto de a execução das decisões jurisdicionais estar em grande medida dependente de um pequeno número de Estados poderosos, que assim se excluem da jurisdição internacional como num sistema absolutista; em terceiro lugar, rejeita a aptidão do Direito Internacional contemporâneo para erradicar a guerra; finalmente, o indivíduo é um sujeito de Direito Internacional de capacidade limitada, desde logo porque não existem mecanismos jurisdicionais ao nível internacional que garantam os direitos humanos que lhe são reconhecidos. Estas dificuldades e insuficiências traduzem fragilidades da própria abordagem universalista de matriz liberal.

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Efetivamente, no atual quadro das relações sociais internacionais, o projeto da ordem pública universal, expressa também na constituição de “órgãos de soberania” como o TPI, arrisca-se a potenciar a dinâmica de lógicas de poder, que já influenciam os mecanismos mais ou menos institucionalizados, mais ou menos informais, das relações sociais internacionais. Neste caso, a intenção de limitar o poder e de criar uma dinâmica internacional com primado no Direito pode antes ver-se cooptada – mais ou menos ingenuamente – por outro tipo de interações de poder dominantes indevidamente prosseguidos em nome da justiça. Tornar-se-ia, pois, no monstro Leviatã ocultado por um manto de legitimidade conferido pelo Direito Internacional.

3.2.Um Discurso Liberal Universalizador

Atualmente, têm persistido algumas críticas duras ao TPI relativas aos seus fundamentos e que, de alguma forma, refletem uma inquietação com a imposição de soluções ético-normativas “ocidentais” de matriz liberal (Kowalski, 2011). Destacam-se aqui duas ordens de críticas: uma relativamente à seletividade das situações em apreciação pelo TPI, em que o “Ocidente liberal” surge sempre como o acusador e nunca como o réu; outra no que diz respeito à relação entre os domínios politico – prevalecente – e judicial.

Relativamente à primeira ordem de críticas, uma acusação grave que se tem feito ouvir essencialmente ao nível político-diplomático e que tem gerado alguma hostilidade por Estados Africanos relativamente ao TPI respeita a um aspeto factual: até ao presente todas as oito situações submetidas ao TPI são relativas apenas a África9. Tal denotaria seletividade na ação do Tribunal. Esta constatação, factual e indesmentível, tem fomentado a acusação de que o TPI não é imparcial no estabelecimento da sua jurisdição, acompanhada de denúncias, pelo menos implícitas, de neocolonialismo10 11. O argumento é o de que a acusação e emissão de mandados de detenção relativamente a líderes africanos implica um agravamento da ameaça à paz e segurança internacionais, assim afirmando implicitamente que se está perante um conflito entre paz e justiça.

As motivações para estas críticas são essencialmente políticas. O discurso radicado no universalismo de matriz liberal responde-lhes com critérios de estrita observância do Estatuto do TPI no qual são Parte trinta e quatro Estados Africanos, fazendo deste o grupo mais representado. Logo, se o Tribunal iniciou procedimentos criminais no âmbito daquelas situações em Estados Africanos fê-lo porque ou foram os próprios Estados a referir a situação – o que acontece na maioria das situações12 – ou porque

9Situações no Uganda, na República Democrática do Congo, na República Centro Africana, no Sudão (Darfur), no Quénia, na Líbia, na Costa do Marfim e no Mali.

10Estas acusações têm congregado o protesto de vários Estados de África, mais ou menos unidos numa posição comum, que se tem manifestado essencialmente através da União Africana. Por exemplo, na sequência da emissão do mandado de detenção pelo TPI contra Omar Al Bashir tem-se assistido a uma reação dura contra a tentativa do Tribunal em julgar líderes Africanos, designadamente de Estados que não são Parte no Estatuto do TPI. Noutro exemplo, em 2011, a emissão de um mandado de detenção pelo TPI contra o líder Líbio Muammar Gaddafi levou a União Africana a pedir aos seus Estados Membros que ignorassem aquele mandado.

11Como que sintetizando as preocupações de vários Estado Africanos, o então Presidente da Comissão da União Africana, Jean Ping, referiu que o TPI é discriminatório porque apenas se ocupa de crimes cometidos em África, ignorando os cometidos pelas “potências ocidentais” no Iraque, Afeganistão e Paquistão - vide Associated Press “African Union calls on Member States to Disregard ICC Arrest Warrant Against Libya’s Gadhafi”, 2 July 2011.

12As situações no Uganda, da República Democrática do Congo, da República Centro Africana, da Costa do Marfim e do Mali.

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existiam indícios fortes da prática de crimes graves de relevância para toda a comunidade internacional e os Estados com jurisdição primacial não quiseram ou não puderam genuinamente julgar. Neste caso não estará tanto em causa a justeza dos casos em apreciação relativos a situações em África mas antes a injustiça de outras situações permanecerem impunes13.

A segunda ordem de críticas aponta para a relação entre ação jurisdicional e lógica política, como um desvirtuamento da função do TPI e da sua independência. Várias organizações não-governamentais de defesa dos direitos humanos têm, aliás, denunciado uma certa “promiscuidade” entre ação jurisdicional e lógica política como sendo prejudicial para a justiça penal internacional (Bourdon, 2000). São aqui especialmente ilustrativas as críticas que apontam para o facto da ação do TPI se encontrar excessivamente dependente do Conselho de Segurança e que, portanto, é em larga medida determinada por critérios políticos e não por critérios jurídicos de atribuição de competência. Esta é uma preocupação que remete para um aspeto estatutário. Efetivamente, o poder do Conselho de Segurança sobre a ação do TPI encontra-se previsto no Estatuto do Tribunal, nomeadamente nos seus artigos 13.º e 16.º.

O artigo 13.º, al. b) estabelece que o Conselho de Segurança pode submeter ao Procurador uma situação em que existam indícios de terem sido cometidos crimes graves de competência do TPI. Assim, das oito situações em apreciação, duas foram submetidas por aquele órgão14. Este poder conferido ao Conselho de Segurança tem merecido, desde os trabalhos preparatórios do Estatuto do TPI, várias objeções: desde a denúncia da perda de independência e credibilidade do Tribunal que tal significa, passando pela defesa de que o Conselho de Segurança não tem competência em matéria de justiça penal internacional nos termos da Carta das Nações Unidas ou até pela acusação de que tal cria uma situação de seletividade no estabelecimento da jurisdição (Yee, 1999).

Qualquer destas críticas tem subjacente a ideia de que a submissão de casos ao TPI está sujeita a critérios de decisão política diferente dos critérios de admissibilidade próprios de um órgão jurisdicional como o TPI. A tudo isto acresce o facto de dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança, três deles – a China, os Estados Unidos da América e a Rússia – não serem Parte no Estatuto do Tribunal. Uma vez que dispõem de direito de veto15, qualquer situação que ocorra no seu território ou que envolva nacionais seus nunca teria, certamente, qualquer possibilidade de ser submetida ao Tribunal por esta via. O que reforça a ideia de que o exercício da

13A existência de conflitos armados é um bom indicador relativamente à potencialidade de ocorrência de crimes graves de relevância internacional. Neste sentido, em 2012, encontravam-se a decorrer 32 conflitos armados, com maior incidência em África, Ásia e Médio Oriente; destes 32, seis tinham a intensidade de “guerra” (com mais de 1000 baixas num ano civil): Afeganistão, Iémen, Paquistão, Síria, Somália e Sudão (Themnér e Wallensteen, 2013). É de notar igualmente que o Gabinete da Procuradora do TPI se encontra examinar a título preliminar as seguintes situações: Afeganistão, Geórgia, Guiné, Colômbia, Honduras, Coreia do Norte e Nigéria. Estas situações em avaliação preliminar incluem factos eventualmente praticados por forças oficiais e pró-governamentais, forças de oposição ao governo e forças estrangeiras (OTP, 2013). Ainda, de realçar que dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas, a China, os Estados Unidos da América e a Rússia não são Partes no Estatuto de Roma. De acordo com dados de 2012, estes três Estados são destacadamente aqueles com maiores gastos militares anuais (Perlo-Freeman et al., 2012).

14As situações no Sudão (Darfur) e na Líbia.

15Vide artigos 27.º, n.º 3 da Carta das Nações Unidas e 13.º, al. b) do Estatuto do TPI.

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jurisdição do Tribunal pode ser seletivo, em função das dinâmicas próprias do Conselho de Segurança.

O poder do Conselho de Segurança previsto no artigo 16.º do Estatuto é, todavia, aquele que tem sido apontado como constituindo a ingerência política mais grave. Nos termos daquela disposição, o Conselho de Segurança pode decidir suspender um inquérito ou procedimento criminal em curso no TPI por um período de doze meses renovável. O Conselho de Segurança chegou mesmo a aprovar resoluções conferindo imunidade em abstrato a pessoas envolvidas em operações de paz ao serviço de um Estado que não seja Parte no Estatuto do TPI16. Pode mesmo ser argumentado que se trata de uma modificação do Estatuto de Roma pelo Conselho de Segurança (Jain, 2005). O que, por um lado, choca com o propósito de combate à impunidade pelos mais graves crimes internacionais e, por outro, demonstra todo o alcance da intervenção que o Conselho de Segurança está disposto a empreender17.

No caso do crime de agressão, o papel do Conselho de Segurança vai ainda mais longe. A conferência de revisão do Estatuto do TPI, que decorreu em Kampala, em 2010, introduziu o crime de agressão – não definido inicialmente no Estatuto – estabelecendo que o exercício de jurisdição pelo Tribunal depende de uma prévia determinação pelo Conselho de Segurança de que houve um ato de agressão18.

A esta perspectiva crítica do papel do Conselho de Segurança face ao TPI está subjacente uma preocupação com o exercício de funções por um órgão executivo, centrado no círculo restrito dos seus membros permanentes e sem verdadeiros mecanismos de controlo político ou jurisdicional (Kowalski, 2010). Preocupação para a qual o próprio discurso de matriz liberal não fornece outro argumento para além daquele que assinala que a intervenção do Conselho de Segurança no TPI resulta de um consenso necessário para a edificação do Tribunal.

3.3. Elementos de Pluralidade

O Estatuto de Roma reflete um entendimento que, pelo menos do ponto de vista formal, se centra na proteção e promoção de uma base ética mínima comum a toda a humanidade. A missão de combate à impunidade e de promoção da justiça é confiada ao TPI pelo Estatuto numa perspectiva de ultima ratio e procurando assegurar a diversidade de sistemas jurídicos ou de atores sociais participantes.

Em primeiro lugar, os crimes sob jurisdição do TPI assumem um consenso ético-penal universal relativamente a um restrito conjunto de atos apresentados como inaceitáveis em qualquer código ético de uma qualquer comunidade: o genocídio19, os crimes contra

16Vide, por exemplo, as Resoluções S/RES/1422, de 12 de Julho de 2002, e S/RES/1487, de 12 de Junho de 2003.

17O TPI encontra-se a apreciar a situação da violência pós-eleitoral no Quénia em 2007-2008 no curso da qual terão sido cometidos crimes contra a humanidade. Entre os acusados estão Uhuru Kenyatta e William Ruto, respetivamente Presidente e Vice-Presidente do Quénia. O Quénia, na sequência de uma decisão da União Africana, solicitou ao Conselho de Segurança o adiamento por 12 meses de qualquer procedimento no TPI relativo à situação no Quénia, nos termos do artigo 16.º do Estatuto do TPI. Em reunião de 15 de novembro de 2013, o Conselho de Segurança não adotou a decisão de adiamento pela margem de apenas um voto.

18Vide UN Depository Notification C.N.651.2010.TREATIES-8, 29 November 2010. O Tribunal poderá exercer a sua jurisdição se o Conselho de Segurança não se pronunciar num prazo de seis meses após a notificação pelo Procurador da sua intenção em abrir um inquérito relativo a um ato de agressão.

19Corresponde a atos praticados com intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso (artigo 6.º do Estatuto de Roma).

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a humanidade20 e os crimes de guerra21 22. São estes os crimes sob jurisdição do TPI e que o Estatuto de Roma assume como «os crimes de maior gravidade que afetem a comunidade internacional no seu conjunto»23. Por isso também, O Estatuto de Roma afasta qualquer regime de imunidades que impeça o exercício da jurisdição do TPI relativamente a estes crimes24. Trata-se de uma exceção (que apesar de tudo não recolhe unanimidade) em comparação com outros regimes internacionais de imunidades penais25.

Éno sistema social, e portanto na(s) sua(s) ordem(ns) axiológica(s), que deve ser procurada a fonte última legitimadora da ordem jurídico-penal (Figueiredo Dias, 1996). Conforme refere Saraiva a propósito dos crimes tipificados no Estatuto de Roma, «a violência e a crueldade têm uma dimensão universal e intemporal» (2013: 48). O catálogo dos crimes sob jurisdição do TPI decorre, assim, do mínimo ético comum possível de consensualizar entre as várias sociedades, permitindo identificar “interesses da comunidade global” que legitimam uma ação comum e universal para a sua proteção e prossecução26 – a dignidade da pessoa humana e os seus direitos fundamentais e da comunidade em que se insere, bem como a justiça.

Em segundo lugar, o Estatuto de Roma afirma a precedência do dever de todos os Estados exercerem a respetiva jurisdição penal sobre os responsáveis por crimes internacionais. O que significa que o TPI é um tribunal de último recurso que apenas exerce a sua jurisdição subsidiariamente.

A complementaridade é pois um princípio estruturante do exercício da jurisdição pelo TPI. Significa, nos temos do artigo 1.º do Estatuto de Roma, que o TPI é complementar das jurisdições penais nacionais – que gozam, portanto, da competência principal –, exercendo a sua jurisdição apenas quando aquelas não queiram ou não tenham capacidade genuína para julgar27 28. Esta posição subsidiária face às jurisdições nacionais pretende igualmente incentivar os Estados a iniciar procedimentos criminais quando estejam em causa crimes de extrema gravidade (Kleffner, 2008). O princípio da complementaridade do TPI garante a sua subsidiariedade face aos sistemas jurisdicionais locais e, logo, um relativo afastamento em relação a uma sua posição hegemónica.

Em terceiro lugar, não é despiciente assinalar que existe uma preocupação para que os vários sistemas ético-jurídicos estejam representados no TPI. De facto, um dos critérios

20Corresponde a atos cometidos no quadro de um ataque, generalizado ou sistemático, contra qualquer população civil, resultando na violação do Direito Internacional dos Direitos Humanos (artigo 7.º do Estatuto de Roma).

21Corresponde a atos que resultem na violação do Direito Internacional Humanitário, em particular quando cometidos como parte integrante de um plano ou de uma política ou como parte de uma prática em larga escala desse tipo atos (artigo 8.º do Estatuto de Roma).

22Apesar de o crime de agressão se encontrar igualmente elencado no artigo 5.º do Estatuto de Roma, a sua definição e inclusão na jurisdição do TPI ainda não aconteceu. A conferência de Kampala para revisão do Estatuto, de 2010, conseguiu acordar numa definição e critérios de jurisdição para o crime de agressão. Contudo aquelas emendas ainda não se encontram em vigor.

23Vide parágrafo 9.º dos considerandos do preâmbulo do Estatuto de Roma.

24Artigo 27.º do Estatuto de Roma.

25Por exemplo, o regime previsto na Convenção sobre Relações Diplomáticas, adotado em Viena, a 18 de abril de 1961.

26A título de exemplo, o Tribunal Internacional de Justiça, no seu parecer relativo ao caso Reservas à Convenção sobre o Genocídio, afirmou que a Convenção sobre o Genocídio expressava um interesse comum da comunidade e não interesses individuais dos Estados (ICJ, 1951).

27Este princípio de complementaridade contrapõe-se à primazia de que gozam v.g. os tribunais ad hoc para a ex-Jugoslávia e para o Ruanda face às respetivas jurisdições penais nacionais.

28Importa aqui assinalar que o “não ter capacidade para julgar”, que pode determinar a intervenção complementar do TPI, inclui os casos em que os suspeitos hajam sido abrangidos por uma amnistia (Cassese, 2008).

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para a eleição dos 18 juízes do Tribunal é a necessidade de assegurar que se encontram representados os principais sistemas jurídicos do mundo29. Contudo, é também verdade que se trata de um sistema jurisdicional penal essencialmente de índole acusatória mais próximo da realidade judicial anglo-saxónica. Outros critérios como a representação geográfica equitativa30 e a representação equitativa de juízes do sexo feminino e do sexo masculino31 traduzem a diversidade de perspectivas presentes no Tribunal.

Por seu turno, organizações e indivíduos da sociedade civil têm deixado uma marca decisiva no Tribunal, contribuindo para o funcionamento do TPI de forma algo mais independente relativamente a considerações simplistas de poder e interesses políticos estaduais. Desde logo, ao nível da constituição do TPI, é significativo que na conferência diplomática que adotou, em 1998, o Estatuto do Roma, estivessem acreditadas duzentas e trinta e sete organizações não-governamentais provenientes de todo o mundo32. Aquelas organizações tiveram mesmo influência direta na redação de algumas das disposições do Estatuto através de uma atuação comunicativa nos trabalhos (Struett, 2008). Depois, as organizações não-governamentais sempre tiveram um contacto muito próximo e imediato com violações graves de direitos humanos, documentando-as e denunciando-as. O seu contributo para a denúncia e para a investigação de alguns casos pode ser decisivo (HRF, 2004).

4. Conclusão

O foco na dimensão ética da organização da sociedade internacional implica necessariamente uma crítica e superação de um universalismo de base racional. Até porque construir o universal com fundamento apenas num processo humano puramente racional e único é um erro epistemológico – esquece a dimensão subjetiva que caracteriza qualquer fenómeno humano. Um erro que conduz facilmente à disputa sobre quem tem competência para estabelecer quais são os axiomas verdadeiros. Uma disputa que, por sua vez, é inevitavelmente ganha por quem (Estados, organizações, universidades, indivíduos, empresas, redes…) tenha maior poder para exportar as suas visões para o mundo e impor os seus interesses – com mais ou menos coercibilidade. O termo é “hegemonia”. Hegemonia não só ética mas também como corte moral em que aponta as periferias como únicos párias e o centro desenvolvido como o farol moral e da correção de comportamentos.

Ora, fazer assentar a ação concertada internacional num mínimo ético comum – um processo de maior complexidade e indeterminação, pouco “amigo” de soluções imediatas (e por isso potencialmente simplistas) frequentemente exigidas no quotidiano

é um antídoto contra-hegemónico. A ideia assenta em duas preposições conjugadas: as diferenças não-redutíveis; e os fenómenos comuns que exigem uma resposta coletiva de alcance potencialmente universal dependendo do alcance do próprio fenómeno. O universalismo respeita também a uma base ética comum que possa ser operacionalizada através da capacidade comunicativa do ser humano, incluindo no quadro de uma arquitetura multinível que inclua um nível de âmbito universal. Tratar-

se-á no fundo de um sistema pluralista de fundamento ético com inflexões

29Artigo 36.º, n.º 8, al. a.i) do Estatuto de Roma.

30Artigo 36.º, n.º 8, al. a.ii) do Estatuto de Roma.

31Artigo 36.º, n.º 8, al. a.iii) do Estatuto de Roma.

32Vide UN Document A/CONF.183/INF/3, 5 June 1998.

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universalistas relativamente a uma base ética comum – socialmente identificada e não hegemonicamente imposta ou difundida – e a fenómenos transversais a toda a humanidade que se manifestam num mesmo tempo histórico: a natureza cooperativa e solidária do ser humano pode implicar em certas circunstâncias uma ação comum universal. O combate à impunidade quando estejam em causa os crimes mais graves de relevância internacional, como o genocídio, os crimes contra a humanidade ou os crimes de guerra, exige efetivamente uma ação penal de dimensão universal. Uma ação que parte do reconhecimento de que a dignidade humana e a justiça integram o acervo do mínimo ético comum.

O TPI corre em águas turbulentas onde nem sempre é possível separar uma abordagem universalizadora de matriz liberal de uma outra abordagem universal de base ética. Por um lado, a sua qualidade de órgão quasi constitucional que facilmente se integra na narrativa da “ordem jurídica universal” assim como a sua excessiva dependência face ao Conselho de Segurança das Nações Unidas e a outros poderes (de cuja cooperação depende) situam o Tribunal numa abordagem universal racional de matriz liberal. Os ainda poucos casos de sucesso contribuem para alimentar a desconfiança sobre se o Tribunal alguma vez cumprirá o seu papel ou até sobre se não se trata de um calmante de consciências com suficientes lacunas para garantir a impunidade dos mais poderosos. Por outro lado, a ordem de valores fundamentais e aparentemente partilhados universalmente que convoca nos crimes que tipifica, o facto de se tratar de um tribunal de último recurso, ou ainda a procura a espaços de garantia da diversidade tradições jurídicas ou de atores, situam o TPI numa abordagem mais próxima do universalismo de base ética.

Voltando agora à questão de partida enunciada no início, será possível afirmar que o TPI, mesmo que possa parcialmente e a espaços servir como veículo hegemónico, é, ainda assim, informado essencialmente pela dimensão de universalização do combate à impunidade por referência a um mínimo ético comum. A universalização da aplicação de certos princípios e valores pode até ser positiva. Mas, para que possa ser legítima fora de uma hegemonia político-económica com capa ética, deve estar assente noutros paradigmas. O TPI não pode ser visto de outra forma que não um (bom) caminho na defesa e promoção da dignidade humana e da justiça, que sempre exigirá a necessária cautela relativamente a uma sua instrumentalização.

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