OBSERVARE
Universidade Autónoma de Lisboa
ISSN:
Vol. 4, n.º 2 (Novembro 2013 - Abril 2014), pp.
Notas e Reflexões
ÁFRICA NO SÉCULO XXI: QUE PROSPECTIVISMO E QUE CAUSAS;
EFEITOS NOS ESTADOS AFRICANOS
Eugénio Costa Almeida
elcalmeida@gmail.com
Tem intervenção em algumas obras publicadas (ensaios, prefácios e poesia). Participa, periodicamente, em Debates e Conferências como orador.
Preâmbulo
Em 25 de Maio de 1963 foi instituída a Organização de Unidade Africana (OUA) que visava a unidade entre os africanos recentemente saídos das várias independências derivadas das lutas independentistas; em Julho de 2002, e após proposta nada inocente de Muammar Kadhafi, a OUA
Estamos aqui, por isso, a comemorar
Desde tempos imemoriais que Africa tem sido um continente em constante movimento migratório, tanto a nível cultural – em particular devido aos movimentos recolectores e pastorícios, – seja a nível comercial ou militar.
Foram esses movimentos migratórios que permitiram o período luz dos egípcios, os seus contactos comerciais e culturais com o reino Núbio, ou destes com os povos Monomotapa – região entre Moçambique e Zimbabwe onde, segundo algumas lendas estaria o mítico reino da rainha Sabá
1O golfo do Corno do Ocidente estaria entre o bojador e a foz do rio Geba
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companheiros, seriam de fêmeas de gorilas, mas que, para autores como
No entanto, as primeiras grandes migrações, que quase provocaram o desaparecimento de um povo, os
De início, os Banto avançaram até às regiões equatoriais, onde se mantiveram durante milhares de anos. Com as migrações árabes, especialmente, aquele grupo desceu para a região do Cabo, onde chegou quase ao mesmo tempo que os calvinistas holandeses, os antepassados dos Africânderes. Em qualquer dos casos os grandes prejudicados foram os
Actualmente, os Banto são considerados os verdadeiros povos autóctones africanos,
Introdução
Entre a formação da OUA e a transformação em União Africana, o Continente africano passou por diversas vicissitudes políticas, económicas e sociais importantes, nomeadamente, a transformação das antigas colónias europeias em – nalguns, poucos, casos de sucesso – potenciais Estados geradores de importantes polos de desenvolvimento económicos e políticos e militares.
Os finais dos anos 80, particularmente após a implosão da antiga URSS, o fim do mito marxista e a afirmação do neoliberalismo conservador, tão a gosto de Fukuyama ou de Friedman, tem sido apontado e caracterizado como sendo o grande responsável pela larga referência que se tem feito à democratização do Continente Negro, com consequente proliferação de movimentos políticos em África, nomeadamente na África subsaariana.
O norte africano
camer + ayoun = carro dos deuses); as colunas ou pilares de Hércules correspondem ao estreito de Gilbraltar.
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democráticos ditos ocidentais e laicos, onde o direito do Estado predomina sobre o direito eclesiástico. A “Primavera Árabe” é o exemplo vivo disto mesmo.
São ou
Mas
Mas se a nível político, África tem registado evoluções e recuos sistemáticos, já a vertente cultural não tem sido descurada, (nem por alguma vez essa questão se poderia colocar), até porque, mais do que o desafio que à partida nos é imposto, África
éuma miscelânea de culturas com que a todo o passo tropeçamos. Aliás, a primeira parte deste texto aborda uma das problemáticas culturais do continente, os fluxos migratórios, sejam internos, sejam externos, bem assim toda a influência que os mesmos tiveram na formação cultural e, mais tarde, na nova engenharia social e política da África em mutação.
Que perspectiva e que prospectivismo? 1. A Formação das duas Áfricas
Face aos actuais movimentos políticos – uns, contestatários, outros, de ruptura – que por quase toda a África persiste, é legitimo questionar se se trata de um sintoma em que o sistema partidário que nos querem impor está em involução e, como tal, a ser progressivamente substituído por um pluralismo cultural ou a caminho de uma vertente politicamente
Para responder, recorramos à tese sustentada por Fernando Chambino3, nesse domínio (Almeida, 2004).
Segundo ele, e em função do modelo de implantação talassocrático do colonizador europeu –
3Fernando Chambino, entretanto falecido, abordou esta temática comigo quando eu era aluno na Universidade Lusíada e
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Qualquer das duas Áfricas não abdica do direito que reivindica da manutenção e do exercício do poder e, simultaneamente, com afectação egocêntrica.
Por sua vez, também Lavroff refere a existência de três grandes obstáculos para a consagração evolutiva do pluripartidarismo em África. A tentativa dos novos líderes se definirem como dirigentes de todos os Povos, daí não havendo lugar, pelo menos manifesto, para outros partidos políticos, apesar de isso consagrarem e anunciarem, de modo a serem congregados à volta de um partido claramente predominante, dito iluminador, todos os que têm qualidades para bem governar. O senhor Mugabe é um dos principais defensores desta tese; mas há mais...
Por fim, a, ainda, criação de um verdadeiro nacionalismo. Não esqueçamos que a maior parte dos países africanos são uma amálgama de etnias, diferentes entre si, que, na época colonial, foram incentivadas ao etnocentrismo. O conceito de Nação só em poucos países começa a estar implantado, como por exemplo em Cabo Verde, Angola, Lesoto, Senegal ou Swazilândia. De resto existem, apenas, projectos nacionais com maior ou menor impacto na sociedade; a África do Sul é um destes últimos casos
Estes três obstáculos, bem assim como a sua conjugação com a tese das duas Áfricas, não são, de per si, sustentáculos suficientes que permitam manter a mexicanização políticas que os regimes, quase totalitários, ainda fazem persistir.
Aproveitando uma tese de Erik Wright (1981: 69) – embora contextualizada para uma situação diferente – a implantação de um regime realmente democrático do tipo Ocidental só acontecerá quando existir uma “sabotagem económica eficaz perpetrada pela burguesia capitalista” de modo que, uma insurreição seja vitoriosa perante um aparelho repressivo. E esta insurreição só cobrará dividendos quando “...esse aparelho se dividir ou se desintegrar...”.
Ora, foi precisamente isso que se verificou na defunta União Soviética, nos antigos estados do Leste Europeu, nos países jugoslavos e é o que se tem verificado embora em muito menor escala, em Estados africanos como Madagáscar, no Benim, no
2. Que Democracia, que Pluralismo
Pessoalmente, perspectivo a afirmação da pluralidade ideológica, apesar de continuar a persistir dirigentes como Mugabe (Zimbabwe), Obiang
No entanto, deveremos considerar para cada caso, cada País, a sua própria especificidade. Não poderemos transmitir para um islâmico os mesmos valores que os europeus possuem, ou seja, a cultura
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Pelo contrário, a África talassocrática ou das cidades, aceita melhor essa recepção. As grandes metrópoles africanas, são muito individualistas, descaracterizadas. Aliás, o afrocitadino é um aculturado por natureza, daí melhor receber qualquer nova ideia que se lhe depare.
Para África a melhor solução poderá ser fazer coexistir o sistema político ocidental, o chamado liberalismo democrático – não aquele que se verifica, hoje em dia, na Europa mas uma mistura entre a terceira via social de Anthony Giddens (a teoria da estruturação) com o liberalismo conservador de Locke e Adam Smith
Para tal nada melhor do que criar uma organização política onde coexistam duas Câmaras de Representantes. Uma, tipicamente ocidental, o Parlamento Nacional, com todas as características próprias do sistema democrático. Outra, não menos importante, provavelmente até mais, seria uma Câmara Consultiva e de Fiscalização, tipo Senado, onde tivessem assentos os chamados
3. Que Fronteiras terá Africa no século XXI?
A Carta da OUA, aprovada em
Casos como Biafra, Katanga, Chade, ou a região Tuaregue
Todavia, mais recentemente, houve um facto que contrariou a Carta da UA, mais devido a inconcebíveis imposições externas aos africanos que por real vontade destes: a secessão do Sudão do Sul. Pode ter sido um prenúncio do que poderá vir a acontecer a outras regiões onde interesses externos sejam mais superiores que os interesses dos africanos u dos autóctones. E se há casos onde isso poderá acontecer…
Para isso
Também a adopção, pelo Uganda, da antiga denominação régia de Buganda, poderá fazer – e de certa forma, o faz – questionar as actuais fronteiras coloniais que correspondem com o antigo reino; não é em vão que, periodicamente, a questão dos Grandes Lagos – embora com outros actores nos papéis principais
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Apesar de tudo, e citando o periódico de economia Financial Times, o Continente negro
éum continente a apostar. Também o recente relatório “Africa Attractiveness Survey” da empresa de consultadoria Ernest & Young, indica que até 2040, Angola, Nigéria, África do Sul, Gana, Egipto, Quénia e Etiópia, serão os países que mais acolherarão o maior número de investimentos externos e vão estar entre os maiores motores de crescimento global.
Cabem aos nossos dirigentes reafirmarem e confirmarem essa aposta não esquecendo que, desde 2007, o ganho acumulado do crescimento africano ascendeu aos 21%, cerca de três vezes mais que nos chamados mercados desenvolvidos.
Daí que a estabilidade das fronteiras nacionais seja um modelo a considerar e a defender pelos Estados africanos sob pena do periclitante desenvolvimento social dos nossos países ser colocado, ainda mais, em causa.
Não pode – não deve – continuar a acontecer casos de questionamento das fronteiras como os que acontecem – e só vou dizer três que nos são mais próximos – entre Angola e Congo Democrático, na foz do Zaire;
Ora um dos meios que permitirão os Estados africanos poderem melhor defender as suas fronteiras políticas e geográficas passam pela cooperação múltipla, seja interna, através dos diferentes organismos
Ficam estas reflexões bem como esta pergunta no ar: “que fronteiras haverá no nosso Continente no final deste século?”.
Referências Bibliográficas:
Almeida, Eugénio Costa e Bernardino, Luís (2013). A Comissão do Golfo da Guiné e a Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul: organizações interzonais para a persecução
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da segurança marítima da Bacia Meridional Atlântica; Lisboa, Revista Militar nº. 2532, páginas
Almeida, Eugénio Costa (2011). Angola, potência regional em emergência, (prefácio de Mário Pinto de Andrade); Lisboa, edições Colibri.
Almeida, Eugénio Costa (2004). África, Trajectos Políticos, Religiosos e Culturais, (prefácio de António Sousa Lara); Lisboa, Autonomia 27.
Balogun, Ola; Aguessy, Honorat; Diagne, Pathé; e Sow, Alpha I. (1980). Introdução à Cultura Africana; Lisboa, UNESCO / Edições 70.
Fortes, Meyer,
Grimal, Henri (1989). Historia de las Descolonizaciones del Siglo XX, Madrid, Iepala Editorial.
Lavroff, Dmitri (1975). Os partidos políticos da África Negra; Amadora, Bertrand.
Pereira, Renato G.. Do Tribalismo ao Marxismo Africano consultado online, [acedido em 21/05/2013] em
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Portal ANGOP, Agência AngolaPress. "Angolanos precisam encarar Oceano Atlântico de forma diferente" consultado online, [acedido em 21/05/2013] em http://www.portalangop.co.ao/motix/pt_pt/noticias/sociedade/2013/3/15/Angolanos-
“Fluxo de IDE em Angola”; in Expansão, edição 217, de 17 de Maio de 2013, página 5 consultado online, [acedido em 21/05/2013] em
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