JANUS.NET, e-journal of International Relations
ISSN: 1647-7251
Vol. 4, n.º 1 (Maio-Outubro 2013), pp.1-17
A reforma dos instrumentos militares e da autoridade do Conselho de Segurança das Nações Unidas na
implementação de medidas coercitivas militares
Sofia Santos
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EUA, que reside nas marcadas e crescentes assimetrias militares entre os Estados-
Membros, pode estar subjacente a ambas situações
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Uma outra fragilidade manifesta-se no insuficiente grau de controlo exercido pelo
Conselho de Segurança no processo de implementação de medidas coercitivas
militares. Ao contrário do modelo de operações de manutenção de paz clássico, no qual
os Estados-Membros estão mais dispostos a sujeitar-se ao comando e controlo das
Nações Unidas, mais concretamente do Secretário-Geral, em operações desta tipologia,
este facto não se verifica, sobretudo por parte dos EUA (Kaysen; Rathjens, 2003:
93)
e ter consequências dramáticas,
por exemplo, no caso de graves violações dos direitos humanos.
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Desta insuficiência decorre o risco dos Estados-Membros recorrerem a métodos que
possam contribuir para um agravamento da situação, poderem distorcer os objetivos
do mandato ou conduzirem arbitrariamente ações adicionais com base em interesses
nacionais específicos
.
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. De salientar que os Estados podem decidir retirar os seus
contingentes sem que esta decisão constitua uma ilicitude à luz do Direito
Internacional, como no caso dos EUA, em 1994 − posteriormente dos restantes
Estados-Membros face à escalação da violência − na missão da UNOSOM II na
Somália
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Acresce, ainda, a possibilidade de interpretações divergentes das resoluções. Embora o
Conselho tenha, na sequência das recomendações do relatório do Painel das Operações
de Paz das Nações Unidas (o designado Relatório Brahimi (2000: 10-12)) decidido na
resolução 1327 (2000) a elaboração de “mandatos claros, credíveis e exequíveis”, a
linguagem vaga e inconsistente − as resoluções fazem referência a “all necessary
measures”
após se registarem várias vítimas entre os soldados americanos.
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ou “all necessary means”
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Pode-se dizer que através da autorização do Conselho de Segurança para o emprego de
todas as medidas ou meios necessários, as coligações de estados recebem “um cheque
, a ausência de limites procedimentais e
substantivos, ou seja, a ausência da determinação de objetivos concretos e, por vezes,
de um limite temporal ou da obrigatoriedade da apresentação de um relatório periódico
pode favorecer um abuso de direito por parte dos Estados-Membros. Atente-se que a
elaboração de relatórios não é garante per se de imparcialidade ou fidedignidade sobre
as ações conduzidas no terreno, o que justifica a necessidade de uma atuação
complementar, isto é, a vários níveis de modo a suprir as diferentes fragilidades
enunciadas neste artigo.
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Esta assimetria é visível através dos respetivos orçamentos de defesa: os EUA possuem o maior
orçamento, 711 mil milhões de dólares, o que representa 41% da percentagem mundial. Enquanto que
entre 2002 e 2011, os EUA registaram um aumento de 59%, o Reino Unido, país com o quarto maior
orçamento – 62,7 mil milhões de dólares, apenas registou um aumento de 18%. No mesmo período, a
França e a Alemanha reduziram o seu orçamento em 0,6% e 3,7%, ocupando o 5º e o 9º lugar,
respetivamente. A Itália ocupa apenas o 11º lugar com uma redução de 21% entre 2002 e 2011. A China
e Rússia ocupam o segundo, 143 mil milhões de dólares, e o terceiro lugares, 71,9 mil milhões de
dólares. Entre 2002 e 2011, o aumento do orçamento de defesa foi de 170% e de 79%, respetivamente,
The Top 15 Military Spenders in 2011, SIPRI Yearbook 2012, Stockholm International Peace Research
Institute,
<http://www.sipri.org>.
14
V., a este propósito, Quigley, John (1996). “The “Privatization” of Security Council Enforcement Action: A
Threat to Multilateralism”. Michigan Journal of International Law. 17, nº 2: pp. 264-269.
15
V., a este propósito, Wilson, Gary (2007). “The Legal, Military and Political Consequences of the
“Coalitions of the Willing” Approach to UN Military Enforcement Action”. Journal of Conflict and Security
Law. 12, nº 12: pp. 316-327.
16
SC Res. 814 e SC Res. 837 (1993).
17
V. a título de exemplo, SC Res. 1264 (1999), SC Res. 1973 (2011).
18
V. a título de exemplo, SC Res. 678 (1990), SC Res. 929 (1994).