OBSERVARE
Universidade Autónoma de Lisboa
ISSN:
Vol. 2, n.º 1 (Primavera 2011), pp.
A GESTÃO DAS PESSOAS E DO CONHECIMENTO NAS ORGANIZAÇÕES
– OS DESAFIOS DAS PRÓXIMAS DÉCADAS
João Paulo Feijoo
Consultor em Qualidade, Processos de Negócio, Capital Humano e Gestão da Mudança, e Country Manager para Portugal da Finalta. Docente convidado em programas de formação de executivos e de
Cursou Engenharia Mecânica no IST em Lisboa. Frequentou um grande número de cursos e seminários no domínio dos Recursos Humanos e da gestão, em Portugal e no estrangeiro, com destaque para Seminário para a Alta Direcção do BCP (INSEAD) e Programa de Alta Direcção de Empresa (AESE).
Este artigo foi escrito de acordo com o novo Acordo Ortográfico
Resumo
As caraterísticas das organizações e a forma como elas gerem o capital humano serão condicionadas, nos próximos 15 a 20 anos, pela evolução de oito processos com uma presença global: o primado do conhecimento, a globalização, o envelhecimento populacional, a importância do papel da mulher, o contrato psicológico, a erosão da autoridade tradicional, e a emergência de novos valores organizacionais. Estes oito condicionantes são analisados, e apontadas as suas tendências de evolução.
Estes processos estão a
Estas organizações colocam desafios inéditos à gestão de pessoas, como as consequências do aumento da idade da reforma, ocupação e a produtividade dos colaboradores idosos, o convívio entre três gerações na força de trabalho, a inteligência intercultural, a evolução das motivações, o significado do mérito, a gestão do talento em organizações abertas, e as novas formas de liderança requeridas num contexto mais igualitário, mais fluido e mais disperso.
A situação portuguesa é abordada à luz das semelhanças e das diferenças em relação quer à evolução dos condicionantes analisados, quer às medidas recomendadas para o caso geral. São identificadas as suas peculiaridades, e discutido o impacto que poderão ter sobre as políticas e práticas de gestão de pessoas a adotar no período em apreço..
Gestão das pessoas; capital humano; economia do conhecimento; redes globais; organizações abertas
Como citar este artigo
Feijoo, João Paulo (2011). "A gestão das pessoas e do conhecimento nas organizações
–os desafios das próximas décadas”. JANUS.NET
Artigo recebido em Setembro de 2010 e aceite para publicação em Março de 2011
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A gestão das pessoas e do conhecimento nas organizações – os desafios das próximas décadas João Paulo Feijoo
A GESTÃO DAS PESSOAS E DO CONHECIMENTO NAS ORGANIZAÇÕES
– OS DESAFIOS DAS PRÓXIMAS DÉCADAS
João Paulo Feijoo
Compreender a mudança
No dealbar da segunda década do século XXI, o mundo enfrenta um conjunto de desafios sem precedentes na história da humanidade: esgotamento dos recursos alimentares e energéticos, alterações climáticas, destruição dos habitats, sobrepopulação, urbanização e envelhecimento global, alterações profundas na ordem política e económica mundial.
Estes fenómenos
Esta dinâmica de mudança transforma inevitavelmente as organizações enquanto agentes económicos e instituições sociais, afetando de forma significativa os fatores – missão, produtos, intervenientes, recursos, cultura – que definem e condicionam a sua atividade. Estas transformações estão também a exigir respostas inovadoras na forma como as organizações gerem o seu capital humano – os seus trabalhadores e o conhecimento por eles detido e aplicado no exercício da sua atividade.
Para compreender o sentido e o alcance destas respostas é necessário identificar os fenómenos que mais diretamente impactam a realidade organizacional e as suas políticas e práticas de gestão do capital humano.
A escolha destas causas é sempre subjetiva e não exaustiva, e condicionada pela visão e pelas preferências do autor. Houve contudo a preocupação de selecionar processos suficientemente discretos e autónomos, que não constituam duas facetas de uma mesma realidade, e suficientemente síncronos para que os seus efeitos se façam sentir durante um mesmo período de 10 a 20 anos. A escolha recaiu sobre os seguintes oito fenómenos:
-A importância crescente do conhecimento como fator de produção
-A globalização
-O envelhecimento global
-A evolução tecnológica (em particular, mas não exclusivamente, no domínio das TIC - tecnologias de informação e comunicação)
-A importância crescente do papel da mulher nas organizações
-A alteração do contrato psicológico entre o trabalhador e a organização
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-A erosão das formas de autoridade tradicional
-A emergência de valores como a responsabilidade social das organizações (RSO) e o equilíbrio entre a vida profissional e a vida pessoal e familiar
Como se pode verificar, apesar de autónomos, estes fenómenos são em larga medida interdependentes: estão ligados por uma teia complexa de efeitos conjuntos, com múltiplas e variadas instâncias de reforço ou de amortecimento mútuo, tais ondas à superfície de um plano de água cujas cristas se sobrepõem e cujas cavas se afundam à medida que se entrecruzam.
Os fatores em presença
a. O predomínio do conhecimento como fator de produção
A segunda metade do século XX assistiu ao nascimento dos knowledge workers, ou “trabalhadores do conhecimento”: trabalhadores cuja atividade exige a aplicação de conhecimentos especializados adquiridos por meio de uma educação formal prolongada. Tem existido desde sempre uma elite intelectual dedicada a atividades
O conhecimento é hoje o fator de produção mais importante e mais escasso, e as suas propriedades determinam as caraterísticas das chamadas “sociedade do conhecimento” e “economia do conhecimento”,
O conhecimento é especializado. A sua incorporação num produto final implica por isso a intermediação de uma qualquer forma de organização que assegure a necessária interdisciplinaridade. Até muito recentemente, a forma mais eficiente era a empresa funcionalmente integrada, centralizada e concentrada. A natureza imaterial do conhecimento, a existência de um mercado global de talento e as possibilidades criadas pelas TIC estão hoje a fazer emergir alternativas radicalmente inovadoras: alianças, organizações abertas e em rede, envolvimento dos clientes e fornecedores
O conhecimento
O conhecimento é facilmente transmissível. Ao contrário dos stocks de matérias- primas, das instalações e das máquinas, é difícil
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tentativas para converter o conhecimento tácito em conhecimento explícito, ou seja, para o codificar e descrever de forma a
Na verdade, os trabalhadores do conhecimento tendem a
O facto de o conhecimento ser detido pelos trabalhadores e não pelas organizações significa, ironicamente o cumprimento da profecia marxista da apropriação coletiva dos meios de produção. Paradoxalmente, porém, estes permanecem firmemente na posse do capital, por intermédio dos fundos de pensões e outros veículos de investimento das poupanças desses mesmos trabalhadores, que controlam a maioria do capital de muitas empresas (Drucker, 2001).
b. A globalização
A globalização é o processo de integração das economias nacionais numa economia transnacional, por meio de fluxos de bens (comércio internacional), de capitais, de pessoas (turismo, migrações), e do conhecimento.
Este processo
Esta expansão foi suportada pela liberalização do comércio internacional e dos fluxos de capitais e pelo desenvolvimento das novas tecnologias de informação e comunicação (TIC) que, ao reduzir drasticamente os custos de transação, tornaram dispensáveis os modelos organizacionais baseados na centralização, na concentração e na integração vertical, e possibilitaram a externalização e deslocalização de vastos segmentos das cadeias de valor para países ou regiões de
O resultado foi um crescimento espetacular da criação de riqueza, que conduziu a uma melhoria generalizada das condições de vida da população mundial.
A globalização fez surgir um mercado global de trabalho, em que o talento compete entre si à escala planetária. Este mercado é potenciado pela escassez que começa a
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A esta mobilidade internacional de “ciclo longo” há que acrescentar as carreiras internacionais compostas por expatriações de maior ou menor duração, bem como todo o tipo de viagens de negócios, e ainda o que se poderá designar por “mobilidade virtual”, isto é, o contacto regular com trabalhadores de outros países e culturas sem necessidade de deslocação física, potenciado pelo predomínio do “trabalho do conhecimento” e suportado pelas novas TIC.
Todos estes tipos de mobilidade estão a fazer emergir um ambiente de trabalho caraterizado por um alargamento brutal das redes de relações e uma exposição intercultural sem precedentes – que paradoxalmente tem sido acompanhado pela adoção acrítica de uma cultura organizacional e de um modelo de gestão de matriz
c. O envelhecimento global
Dos oito fenómenos escolhidos como condicionantes do futuro da gestão das pessoas, o envelhecimento global é o que se apresenta com um maior grau de certeza, pois todos os desenvolvimentos que vão determinar a evolução da população mundial nas próximas duas ou três décadas já ocorreram e são conhecidos.
Este problema não é exclusivo dos países ditos desenvolvidos.
Na China, o índice de fertilidade já só é de 1.79 – bastante inferior aos 2.1 do limiar de substituição; aliás, só se mantém acima daquele valor em algumas províncias do interior, pois nas províncias mais desenvolvidas do litoral já não ultrapassa 1.5. Na Índia, o nível de fertilidade nacional ainda é de 2.81; contudo, a fertilidade já caiu abaixo do limiar de substituição num conjunto de estados com uma população combinada superior a 200 milhões de pessoas.
Uma população em rápido envelhecimento e uma força de trabalho cada vez mais escassa levam a um aumento do rácio de dependência.
1No Japão, onde o envelhecimento se fará sentir de forma ainda mais acentuada, o agravamento será de 1/3.8 para 1/1.9 ativos
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Ilustração 1 – Comparação das quotas (percentagem) das faixas etárias
Fonte: Eurostat 2004 Demographic Proj. (Baseline scen.); UN World Population Prospects (2002 Rev. - Medium variant)
Ilustração 2 – Rácio de dependência (idosos) total de indivíduos com 65+
anos / total de indivíduos com
EU25 |
CC |
Europa |
América |
América África |
China |
Índia Japão |
Ásia |
Oceânia Mundo |
|
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(outros) |
do Norte |
Latina |
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(outros) |
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Fonte: UN World Population prospects (2002 Rev. - Medium Variant); For EU25 : Eurostat 2004 Demographic Projection (Baseline scenario); CC= BG, RO, HU, TR
A imigração a partir de países com uma demografia ainda pujante tem vindo assim a
Estes fluxos transnacionais, embora necessários, não serão suficientes para manter a população ativa em níveis capazes de assegurar algum crescimento económico. Em
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alguns países, é tal a escala do problema que a proporção de imigrantes em relação à população autóctone levaria a uma inevitável reação xenófoba por parte destas últimas2. Por outro lado, os excedentes demográficos nos países de origem tenderão a
Parece pois inevitável o aumento da idade da reforma, que apesar de impopular (sobretudo entre os trabalhadores mais velhos!), é uma medida inevitável e justificada, uma vez que a “longevidade saudável” têm vindo a aumentar continuamente: a generalidade dos indivíduos atinge a atual idade de reforma de boa saúde e em condições de continuar a trabalhar, e
Muito provavelmente, com o prolongamento da vida ativa, a transição para a reforma
Esta transição será acompanhada pela mudança e diversificação do vínculo entre a organização e o trabalhador, que passará de trabalhador dependente e permanente integrado na força de trabalho “core” a trabalhador temporário, “boomerang”3, prestador de serviços, consultor mais ou menos independente, trabalhador das organizações fornecedoras e clientes, etc. Neste contexto, é possível que os trabalhadores mais experientes e qualificados, com maior capacidade de liderança e menor aversão ao risco decidam (e sejam encorajados a)
Num outro plano, passarão pela primeira vez a coexistir sistematicamente três gerações na força de trabalho da maioria das organizações. O relacionamento entre elas – o confronto entre os respetivos valores, a divisão do trabalho, a relação hierárquica – irá marcar profundamente a vida da organização e alterar de forma radical os dados da gestão das pessoas.
d. A evolução tecnológica
Os meios de comunicação à distância nascidos do rápido desenvolvimento das TIC e da ubiquidade global da internet – desde o correio eletrónico ao instant messaging, da videoconferência aos serviços de banda larga, dos sites de pesquisa às redes sociais – estão na base de uma das maiores revoluções na forma como as organizações se estruturam e funcionam.
2
constante.
3
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As TIC permitem que as organizações se libertem das suas barreiras físicas e ganhem acesso a reservas de talento que de outra forma dificilmente conseguiriam mobilizar, como especialistas baseados em locais distantes e jovens mães ou idosos que preferem trabalhar a partir de casa. São ainda mais importantes as possibilidades abertas pelo abatimento das próprias barreiras mentais, que permitem explorar um capital humano situado muito para além da sua força de trabalho “convencional”: as “organizações abertas”, a “open innovation”, as
As organizações do futuro serão assim estruturas cada vez mais abertas e difusas, constituídas por várias coroas concêntricas em que se movimentam “produtores” ligados à organização por vários tipos de vínculos e de modalidades de envolvimento: trabalhadores a tempo inteiro e em regime de exclusividade, temporários, reformados, prestadores de serviços, trabalhadores de organizações fornecedoras e subcontratadas, clientes, consultores, etc. Estes vários tipos de “produtores” podem
Os retornos decrescentes da “curva de experiência” típica das organizações tradicionais estão a ser substituídos pelos ganhos crescentes da “curva de colaboração” própria das redes abertas (Hagel e Brown, 2010): em vez de tender para um limite à medida que a experiência “interna” se vai acumulando, o valor criado tende a crescer sempre que novos membros se juntam à rede e contribuem com a sua experiência e as suas ideias.
Apesar dos mecanismos de controlo e censura que alguns estados procuram impor, o acesso à informação e a própria produção de conteúdos continuam a
Esta utilização de uma lógica “pull” em vez de uma lógica “push” tenderá a
Nas novas organizações do século XXI, o valor passou a residir no conhecimento, e o conhecimento cria tanto mais riqueza quanto mais é partilhado; a “proteção” desse conhecimento, numa lógica de acumulação e de sigilo, resulta invariavelmente na sua
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degradação. É o fluxo de conhecimento, e não o seu “stock”, que está na origem da criação de valor4.
Esta nova lógica representa uma total revolução na cultura de muitas organizações, e o fim do equívoco de que o poder resulta do acesso privilegiado à informação. Uma caraterística sintomática das organizações
e. A ascensão socioprofissional da mulher
A entrada das mulheres no mercado formal de trabalho assume uma dimensão massiva na segunda metade do século XX, em consequência da terciarização da economia e do declínio do emprego no setor secundário.
De um modo geral, o crescimento da participação feminina na economia
Cerca de dois terços dos nos novos empregos criados nas últimas décadas em todo o mundo são preenchidos por mulheres, que acumulam um poder de compra crescente –
Contudo, a participação das mulheres na economia, na sociedade e na política em pé de igualdade com os homens continua a ser uma miragem em vastas extensões do globo. Mesmo nos países mais desenvolvidos, as mulheres ganham menos do que os homens, são mais afetadas pela precariedade e pelo desemprego, e continuam conspicuamente ausentes dos lugares de topo na economia e na política.
Na União Europeia
A situação é semelhante no que respeita ao exercício de atividades políticas, como mostra o gráfico da ilustração 3: com exceção dos Países Nórdicos, a percentagem de mulheres nos parlamentos nacionais anda à volta dos 20%, e nos Países Árabes cai mesmo abaixo dos 10%.
4A informação que importa manter sob reserva – e.g. determinados detalhes críticos sobre novos produtos em desenvolvimento – representa uma fração muito pequena da informação que circula na organização e através das suas fronteiras, e não põe em causa o princípio geral de abertura enunciado.
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Ilustração 3 – Percentagem de mulheres em parlamentos nacionais em todo o
mundo (2010)
Países Nórdicos
Americas
Europa (OSCE) - com Países Nórdicos
Europa (OSCE) - sem Países Nórdicos Ásia África Subsahariana Pacífico
Países Árabes
0.0% |
10.0% |
20.0% |
30.0% |
40.0% |
50.0% |
Fonte:
As dificuldades enfrentadas pelas mulheres resultam essencialmente de dois obstáculos. O primeiro é um problema objetivo e tem a ver com as responsabilidades ligadas à família e a sobrecarga das tarefas domésticas, que podem variar de acordo com fatores culturais, mas estão sempre presentes.
O segundo assenta em mitos e preconceitos quanto à capacidade e motivação das mulheres para desempenhar funções ao mais alto nível: estão menos comprometidas com as suas carreiras, não têm disponibilidade para viajar nem para trabalhar as horas necessárias, o temperamento feminino não tem as caraterísticas certas, as mulheres não são suficientemente assertivas (ou, pelo contrário, são demasiado agressivas), etc.
A superação destes obstáculos é imprescindível para realizar o formidável potencial existente na plena participação da mulher da economia e na sociedade, em igualdade com o homem. As mulheres representam metade da humanidade, e não existe qualquer prova de que a inteligência, a energia e outras qualidades estejam desigualmente distribuídas entre os sexos; as mulheres beneficiam de uma educação cada vez melhor – em muitos países igual ou superior à dos homens. A assunção do papel a que têm direito reforçará a diversidade e pluralidade da força de trabalho, e acarretará mudanças em muitos aspetos da cultura organizacional, incluindo os modelos de liderança, a comunicação interna e externa, a natureza e a resiliência do “contrato psicológico”, a responsabilidade social, e o
f. A alteração do contrato psicológico
Na segunda metade do século XX, este contrato psicológico – ou seja, as crenças, as perceções, as expectativas e as obrigações informais recíprocas entre o trabalhador e a organização que o emprega – evoluiu no sentido de um conjunto de garantias mútuas visando assegurar a paz e a estabilidade laboral: em troco da promessa de segurança e estabilidade do emprego, de tratamento equitativo e de proteção social, os
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trabalhadores
Este acordo tácito está presentemente sujeito a tensões insuportáveis, e já deixou mesmo de fazer qualquer sentido para as gerações que mais recentemente entraram na vida ativa.
A responsabilidade cabe em primeiro lugar às próprias organizações, cujo comportamento nas últimas duas ou três décadas5 –
Por outro lado, nos últimos sessenta ou setenta anos, a relação entre a longevidade das tecnologias, das organizações e das carreiras
Toda esta dinâmica de destruição e reconversão “schumpeteriana”, todas estas constantes fusões e aquisições,
Conforme discutido mais adiante na secção sobre os valores emergentes, o aumento de participação das mulheres significou o fim da aceitabilidade de subalternização da vida pessoal e familiar, e a primazia conquistada pelo trabalho do conhecimento substituiu a lealdade para com a organização pela identificação mais forte com o grupo profissional.
Por sua vez, a nova geração nascida a partir de 1980 que nesta última década começou a entrar na vida ativa – a “Geração Y” – parece
5Muitos autores situam a génese deste processo no início dos anos 80, com a vaga de liberalização e
desregulamentação iniciadas respetivamente nos Estados Unidos e no Reino Unido pelos governos Reagan e Thatcher, então recentemente eleitos.
6Ver p.ex. a conversão dos planos de pensões de “benefício definido” para “contributo definido” que tem sido levada a cabo um pouco por toda a parte nos últimos dois ou três anos.
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Tudo isto conduz à emergência de um novo tipo de contrato psicológico, em que a lealdade à organização já não é determinada pela promessa de estabilidade e segurança, mas condicionada por expectativas de desenvolvimento, de empregabilidade e realização profissional.
g. A erosão das formas tradicionais de autoridade
Na sua forma tradicional, a autoridade é legitimada pelo estatuto, e não necessariamente pela competência. Esta forma de autoridade ainda hoje perdura em inúmeras organizações – em particular nas organizações familiares de menor dimensão onde impera a personalidade do patriarca, e mesmo em grandes organizações fortemente marcadas pelo carisma do seu fundador – mas é, por toda a parte, cada vez mais posta em causa pela convergência de múltiplos desenvolvimentos verificados na economia e na sociedade.
Nas organizações
étambém eminentemente plástica: em função do problema enfrentado, a autoridade transita para aquele ou aqueles cuja competência coloca em melhores condições de liderar.
A arquitetura aberta destas organizações, a sua dispersão geográfica e diversidade cultural, e a natureza informal do relacionamento de muitos dos intervenientes na produção do conhecimento – prestadores de serviços, membros de comunidades de prática, e mesmo clientes – torna extremamente difícil a projeção da autoridade pelos meios convencionais de coerção e punição. As redes colaborativas costumam por isso ser fortemente igualitárias, e costumam funcionar satisfatoriamente com uma divisão de responsabilidades meramente funcional e um mínimo de coordenação formalmente atribuída.
A geração mais nova, por sua vez, atribui grande importância à dimensão ética da autoridade, cuja legitimidade dependerá não só das caraterísticas da pessoa que dela está investida – competências, capacidade relacional, etc. – mas sobretudo da bondade das suas intenções. Esta exigência tem vindo a
Todos estes processos têm sido potenciados pela crescente ubiquidade do modelo de gestão
Em síntese, está a
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h. Os valores emergentes
A preocupação com a ética não se limita aos fundamentos da autoridade. Nos últimos anos
A reivindicação de um maior equilíbrio entre as exigências da profissão e da vida familiar resulta em grande parte do aumento da participação feminina na força de trabalho, e tem por fundamento a procura de um maior equilíbrio entre os papéis do homem e da mulher tanto no trabalho como na família e a melhoria a qualidade de vida familiar.
Por outro lado, aqueles valores correspondem de perto ao ideário da geração “Geração Y”. As desta geração (ver e.g. Pew Research Centre, 2007) revelam algo paradoxal. Por um lado,
Por outro lado, porém, muitos destes jovens adultos viram os seus pais ficarem sem emprego na turbulência das
A conjugação destes eventos
No domínio da política e dos costumes – por exemplo em relação a questões como a homossexualidade, as famílias não convencionais, a imigração e as relações interculturais – exibem uma atitude mais cosmopolita e mais tolerante do que qualquer das gerações anteriores.
No trabalho são impacientes e têm uma elevada autoestima, são fortemente orientados para a inovação e para as tecnologias, e apreciam o trabalho em equipa e a interação em redes informais. Manifestam uma intensa relutância por atividades cujo valor acrescentado não conseguem descortinar. Querem
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Éesta geração, com estes valores, que irá conviver na força de trabalho não com uma, mas com as duas que a antecederam – a chamada “Geração X” e os “Baby Boomers” – cujos valores e prioridades diferem por vezes substancialmente dos seus.
Ilustração 4 – Prioridades relativas das três gerações
Prioridade relativa atribuída ao |
Geração X |
Geração Y |
||
trabalho ou à família |
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Trabalho |
22% |
13% |
13% |
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Ambos |
37% |
35% |
37% |
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|
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Família |
41% |
52% |
50% |
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|
Fonte: Generation and Gender in the Workplace, 2002
O futuro da gestão de pessoas
A complexidade e intensidade dos fatores em presença dão a escala das transformações que a gestão das pessoas terá de sofrer para responder eficazmente às novas realidades.
i. Gerir a escassez
Nas organizações
Esta escassez tem duas origens: a erosão cada vez mais rápida dos conhecimentos gerada pelo constante avanço da ciência e da técnica, e a retração da força de trabalho provocada pelo envelhecimento e declínio populacional. Cada uma destas causas exige respostas específicas.
A constante erosão da base de conhecimentos exigirá a generalização da aprendizagem ao longo da vida. A formação terá de deixar de ser encarada como um recurso escasso, e pelo contrário oferecida em abundância. Contudo, os métodos, os formatos e os canais de distribuição usados serão radicalmente diferentes dos que hoje existem. O elevado risco de desatualização dos conteúdos desencorajará os programas de formação longos e abrangentes, concebidos como investimentos pesados
A fragmentação e modularização dos conteúdos facilitarão também a personalização das aprendizagens, permitindo uma variedade quase ilimitada de combinações capazes de satisfazer as necessidades específicas de cada formando. A oferta de formação estará também omnipresente na rede global, sob os mais diversos formatos e de acordo com as mais diversas conveniências: texto convencional, hipertexto,
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A modularização e a ubiquidade dos conteúdos permitirão que a aprendizagem passe a
As preocupações centrais da formação
As medidas para combater a escassez da força de trabalho - imigração, prolongamento da vida ativa - já foram enunciadas na secção sobre o envelhecimento global, tal como algumas das suas possíveis consequências na vida das organizações e na gestão do seu capital humano.
O adiamento da idade da reforma suscita ainda uma outra questão extremamente sensível – a da remuneração no troço final da carreira. Em concreto, a regra de que a esta cresce (pelo menos em valor unitário) até ao final da vida ativa terá de ser re- examinada. Não se trata de que os trabalhadores mais idosos sejam menos produtivos; pelo contrário,
j. Gerir a pluralidade
As organizações do futuro
O termo é aqui usado expressamente para denotar um conceito mais amplo e mais rico do que o da simples “diversidade”. Esta pluralidade
-Da pluralidade da força de trabalho, caraterizada por múltiplas dimensões de diversidade: a diversidade cultural originada pelos fluxos físicos globais (imigração, expatriações, viagens) e pela interação remota entre dos trabalhadores de países e culturas diferentes; a diversidade geracional provocada pelo convívio inédito entre três gerações; a representação mais equilibrada de homens e mulheres em todas as instâncias das organizações; e por fim, para além da força de trabalho no sentido
7Esta faculdade de produção de conteúdos pelos próprios consumidores, tal como o envolvimento dos clientes nos processos internos das organizações, representa a realização da profecia do “prosumidor” (i.e. simultaneamente produtor e consumidor) proposta por Toffler (1980).
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convencional, a diversidade de inputs e envolvimentos da constelação de stakeholders que juntam o seu contributo ao dos trabalhadores.
-De uma pluralidade funcional, presente na diversificação e desmassificação das atividades dos trabalhadores.
-De uma pluralidade estrutural e geográfica, decorrente da internacionalização, da especialização ou mesmo externalização de algumas operações, e das idiossincrasias das unidades de negócio que entram e saem do perímetro da organização ao sabor de sucessivas fusões, aquisições e alienações; e também da possibilidade de os trabalhadores do conhecimento desempenharem eficazmente as suas funções independentemente do local onde se encontrem.
-E até mesmo de uma pluralidade cronológica, visível na coexistência de partes da organização que se encontram em diferentes fases do seu percurso rumo aos novos paradigmas.
Esta pluralidade representa uma formidável fonte de riqueza, e as organizações vencedoras serão aquelas que melhor conseguirem
O desenvolvimento da inteligência intercultural passará pois a ser uma prioridade da gestão das pessoas. É indispensável que os trabalhadores saibam não só valorizar a diferença, mas também dominar os instrumentos necessários para lidar com ela e dela tirar partido: línguas estrangeiras, comunicação interpessoal, aplicações e plataformas de comunicação, conhecimento das caraterísticas das diferentes culturas, e tantos outros. Apesar dos constantes preitos à valorização da diferença e ao desenvolvimento da sensibilidade intercultural, a distância a percorrer é enorme: quantos colaboradores de empresas ocidentais (ou mesmo quantos executivos) com negócios em países islâmicos têm consciência de que o fim de semana nesses países calha à
Será também indispensável passar de uma atitude dominante de antagonismo para outra de procura ativa da vantagem recíproca: nas organizações abertas, a criação de valor depende fortemente da confiança entre os vários tipos de “produtores” que trocam conhecimento através das suas fronteiras – os clientes que participam na inovação, os profissionais da mesma especialidade que contribuem com soluções técnicas, e até mesmo dos concorrentes que colaboram na definição de normas e standards vantajosos para todos na lógica de “coopetição” preconizada por Toffler (1980).
Em síntese,
k. Gerir as motivações e o mérito
Nas organizações abertas e plurais, os fatores de motivação são seguramente muito distintos entre os diversos grupos que as compõem. A identificação e a compreensão destas motivações é essencial para orquestrar eficazmente todo o potencial presente
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nesta “força de trabalho alargada”. Gerir pessoas significa facultar a todas elas estas chaves essenciais para compreender o outro e com ele colaborar. Na organização do futuro, a gestão das motivações não poderá ser uma reserva de competência do líder. A natureza aberta e horizontal do trabalho colaborativo exige que todos os trabalhadores consigam entender aquilo que faz correr todos aqueles com quem se relacionam.
Éum
A organização do futuro será muito exigente quanto aos fundamentos do mérito. Em primeiro lugar, evidentemente, a contribuição para a criação de valor. Mas a par desta, todos os comportamentos e atitudes exigidos pelo seu funcionamento: tolerância e valorização da diferença, capacidade de comunicação em todos os contextos, autonomia e iniciativa, procura das vantagens mútuas, curiosidade e aprendizagem permanente, ética. Porque sem estes, aquele valor não pode ser criado. (E para muitos, não vale a pena ser criado.)
l. Gerir fluxos de talento em vez de stocks
O modelo convencional de gestão do talento obedece a uma lógica de acumulação. Uma vez adquirido, o talento deve ser preservado e retido a todo o custo – incluindo diversas formas mais ou menos manifestas de aliciamento e chantagem – e a perda para o exterior é considerada uma rotura litigiosa entre a organização e o trabalhador. Nestas circunstâncias, é legítimo
Este modelo não serve, evidentemente, as necessidades da economia do conhecimento.
Não é possível hoje em dia conceber o desenvolvimento do talento em ambiente fechado. Por razões já apresentadas, a atualização e enriquecimento das competências do trabalhador do conhecimento exigem o seu relacionamento permanente com uma rede que se estende muito para além das fronteiras da sua organização.
Por outro lado, os novos termos do contrato psicológico – que aliás nascem em parte de uma reação contra uma visão tão paternalista – retiram todo e qualquer sentido às estratégias de acumulação e preservação do talento.
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Vol. 2, n.º 1 (Primavera 2011), pp.
A gestão das pessoas e do conhecimento nas organizações – os desafios das próximas décadas João Paulo Feijoo
Os novos modelos de gestão das pessoas têm pois de passar a incorporar a gestão do talento para além das fronteiras da organização – uma mudança radical de mentalidades, atendendo a que a rotura litigiosa deve ser substituída por uma saída amigável, e em certos casos mesmo recomendada pela organização. Na organização do futuro, a existência de talento benevolente, disponível e reconhecido para com a organização é um ativo de valor inestimável e facilmente superior ao da sua eventual retenção. A preservação de um bom relacionamento entre as partes vai permitir que ele faça parte das redes da organização, que seja parceiro na partilha de conhecimento, fonte de oportunidades de negócio e de ideias inovadores, e contribuinte de soluções técnicas dentro da sua especialidade.
Gerir fluxos de talento significa pois, sucessivamente:
1.Compreender os tempos, os ritmos e as motivações de carreira de cada trabalhador do conhecimento, e detetar os momentos em que uma transição faz sentido para ele8;
2.Se necessário, tomar mesmo a iniciativa de lhe recomendar essa transição: uma recomendação fundamentada e coerente, ajustada aos projetos do trabalhador, só reforçará a sua gratidão e benevolência futura, mesmo que não se concretize; além disso, permite controlar melhor o risco de perda direta para a concorrência, que pode dificultar as possibilidades de cooperação futura;
3.Manter e acarinhar o contacto para além das fronteiras da organização
m. Uma nova liderança
Tal como agora, os líderes das organizações do século XXI também terão a responsabilidade de motivar e desenvolver os trabalhadores do conhecimento, orquestrar a sua colaboração, e orientar as suas carreiras – mas terão de o fazer de forma muito diferente.
Os trabalhadores do conhecimento têm uma visão essencialmente igualitária acerca de si mesmos. Acreditam que os contributos valem pela sua qualidade objetiva e não pelo estatuto de quem os produz. A natureza do seu trabalho é mais autónoma, e
A influência exercida pelos líderes terá por isso que assentar na capacidade demonstrada de agir de acordo com aquelas expectativas. Estará mais próxima da auctoritas dos Romanos – a autoridade dos sábios, que convencem pela pertinência e pela justeza dos seus argumentos, com base na credibilidade do seu testemunho – do que da potestas, ou direito dos magistrados eleitos de exercer coerção e de aplicar punições.
8Esta capacidade já é razoavelmente dominada pelas organizações que praticam uma rotação interna sistemática. A diferença está na possibilidade de a “rotação” se fazer para o exterior.
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A liderança baseada na auctoritas terá um papel fundamental na relação entre gerações. O prolongamento da vida ativa, a transição gradual para a reforma, e a migração dos trabalhadores mais velhos para funções de aconselhamento e apoio
Só há uma maneira de aprender esta forma de liderar: é aprendendo a ser liderado. Certamente, desde logo, aprendendo com o exemplo dos bons líderes, mas também com tudo aquilo que não deve ser feito, com os comportamentos que, em vez de granjearem a adesão do subordinado, suscitam nele a revulsão e a oposição: a arrogância, deslealdade para com os subordinados, o egoísmo, a incapacidade para dizer não aos próprios superiores, a falta de rigor ético – numa palavra, a falta de caráter. Este treino do followership (ou “seguidança”) dará aos candidatos a futuros líderes uma perspetiva muito mais rica da exigência ética e humana da liderança.
Esta exigência
Mas para respeitar é preciso conhecer, e conhecer significa
Este é certamente um dos grandes desafios da gestão das pessoas nas próximas décadas: ajudar a que, apesar de todos os obstáculos e dificuldades, os trabalhadores sejam reconhecidos como pessoas de carne e osso, com as suas ambições e as suas frustrações, as suas convicções e as suas angústias, as suas alegrias e as suas tristezas, o seu passado e o seu futuro – e não como meras representações abstratas numa base de dados, cuja verdadeira realidade nenhuma quantidade de informação, por maior que seja, conseguirá captar.
A situação em Portugal
A problemática da gestão das pessoas em Portugal não difere muito, na sua essência, do panorama apresentado.
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A sua população é das mais envelhecidas, mas com indicadores comparáveis aos de outros países do Sul da Europa, e a sua taxa de fertilidade está abaixo da média da União Europeia.
Apesar de nos últimos anos ter acolhido um considerável número de imigrantes, continua a ser uma fonte de emigração de trabalhadores pouco qualificados para economias mais desenvolvidas, mas nos últimos anos tem visto crescer a “fuga de cérebros” em consequência da dificuldade que os jovens altamente qualificados têm em encontrar empregos compatíveis com as suas expectativas.
No domínio das TIC apresenta indicadores comparáveis aos de muitos outros países desenvolvidos (penetração da internet e dos serviços de banda larga, adesão a redes sociais...).
Tem uma das mais elevadas taxas de participação feminina na economia, uma das mais baixas diferenças salariais da União Europeia (9.2%), e um elevado output de diplomados do sexo feminino (64%), mas no acesso das mulheres a lugares cimeiros na economia e na política compara desfavoravelmente com os seus pares.
Uma história de instabilidade económica, uma tradição de dependência do poder, um baixo índice de individualismo e um elevadíssimo índice de aversão ao risco (Hofstede, 1991) levam a que a estabilidade do emprego por conta de outrem seja fortemente valorizada em detrimento da iniciativa e do empreendedorismo., o que de resto é reforçado pela rigidez das leis laborais.
A autoridade é marcada por uma elevada distância de poder (Hofstede, 1991), patente na aceitação social da desigualdade de estatuto, nas fórmulas de deferência usadas, e na existência de uma elite dirigente bastante fechada em consequência da pequena dimensão do meio e das relações forjadas na vida política e académica.
De um modo geral, os novos valores organizacionais mostram dificuldade em
Perante este panorama, não se afigura que as orientações para a gestão das pessoas em Portugal deva ser muito diferente da preconizada no capítulo anterior. Há no entanto alguns aspetos que merecem ser relevados.
No que se refere à gestão da pluralidade, a sociedade portuguesa parece ser suficientemente tolerante para aceitar e tirar partido de uma muito maior exposição à diversidade. Absorveu sem grande desconforto várias centenas de milhar de imigrantes nos últimos vinte anos, apesar da discriminação visível contra algumas comunidades (africanos pobres, ciganos) – e mesmo esta parece desaparecer ao nível das relações entre indivíduos. Ainda assim, não devem ser poupados esforços no sentido de uma verdadeira educação intercultural das novas gerações, por meio da aprendizagem de
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línguas, de intercâmbios, de viagens, de períodos de estudo ou trabalho no estrangeiro, de pertença a redes sociais internacionais, etc.
Algumas das caraterísticas culturais da sociedade portuguesa – em particular o baixo índice de individualismo e a tradição de dependência (seja ela da família, do empregador ou do Estado), a atribuição causal externa, a forte aversão ao risco, a inveja, e a elevada distância de poder – vão certamente dificultar algumas daquelas orientações.
O baixo individualismo e a aversão ao risco tenderão também a desencorajar a mobilidade profissional e a preservar o contrato psicológico na sua versão paternalista.
Simetricamente, o desenvolvimento de uma atitude mais aberta em relação aos fluxos de talento colidirá frontalmente com o primado do coletivo sobre o indivíduo, com a preferência pela evitação de incertezas e ambiguidades, e com a inveja para com alguém que conseguiu uma situação melhor. Por estas razões, exigirá um esforço muito maior. O mesmo se passará com a procura proativa de vantagens mútuas.
Tal como a aversão ao risco e a apetência pela dependência desencorajarão os trabalhadores mais velhos a encetar projetos de empreendedorismo no troço final das suas carreiras, também a distância de poder e a valorização do estatuto poderão dificultar a convivência e a colaboração intergeracionais.
O advento de uma liderança assente na auctoritas terá dificuldade em vencer a barreira da distância de poder.
Todos estes problemas serão agravados pela natureza do tecido empresarial português, em que 95% das empresas empregam menos de 10 trabalhadores e têm maioritariamente uma estrutura familiar. Pura e simplesmente, estas micro- organizações não têm a dimensão nem os recursos suficientes para por em prática as medidas preconizadas no capítulo anterior, ainda que muitas delas já se movimentem na economia do conhecimento. A única exceção poderia ter a ver com a liderança, já que a pequena dimensão facilita a aproximação entre os trabalhadores e o patrão; a falta de preparação deste (a maioria só tem habilitações ao nível do 1º ciclo do Ensino Básico), a sua insensibilidade ao que significa liderar, e a atitude fortemente paternalista típica das culturas coletivistas são porém obstáculos de monta.
A situação está no entanto longe de ser desesperada. As dificuldades são apenas de natureza quantitativa, e são superáveis com o esforço e o investimento apropriados. Várias das maiores organizações presentes no país, sejam de origem nacional ou multinacionais estrangeiras, já adotam muitos dos princípios e práticas aqui preconizados.
A boa gestão das pessoas na economia do conhecimento é possível em Portugal.
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