OBSERVARE

Universidade Autónoma de Lisboa

ISSN: 1647-7251

Vol. 2, n.º 1 (Primavera 2011), pp. 16-28

A IDENTIDADE EUROPEIA – A CIDADANIA SUPRANACIONAL

Paula Marques Santos

Licenciada em Relações Internacionais e Doutora em História das Relações Internacionais. Directora da licenciatura de Secretariado de Administração da Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Lamego. Membro da Team Europe.

Mónica Silva

Licenciada e Mestranda em Relações Internacionais.

Docente da Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Lamego

Resumo

Pretende-se com esta comunicação apresentar uma reflexão sobre a construção da cidadania/identidade comunitária europeia, procurando identificar os principais desafios à consolidação desse vínculo de cidadania e as dificuldades em tornar os indivíduos do espaço comunitário mais participativos no processo de integração e as instituições europeias mais próximas do cidadão comum.

Palavras-chave

Cidadania Europeia; Tratado de Lisboa; supranacionalidade; direitos fundamentais; cidadania democrática; desafios

Como citar este artigo

Santos, Paula Marques; Silva, Mónica (2011). "A identidade europeia – a cidadania supranacional”. JANUS.NET e-journal of International Relations, Vol. 2, N.º 1, Primavera 2011. Consultado [online] em data da última consulta, observare.ual.pt/janus.net/pt_vol2_n1_art2.

Artigo recebido em Dezembro de 2010 e aceite para publicação em Março de 2011

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A identidade europeia – a cidadania supranacional

Paula Marques Santos e Mónica Silva

A IDENTIDADE EUROPEIA – A CIDADANIA SUPRANACIONAL

Paula Marques Santos e Mónica Silva

Contextualização

A cidadania europeia tem vindo, nos últimos anos a ganhar um espaço relevante no debate acerca da importância do seu reforço eficiente para que o próprio aprofundamento da integração europeia seja possível e passível de aproximar as instituições aos cidadãos.

De facto, embora já Monnet se referisse à construção comunitária como uma união de homens e não apenas de Estados, apenas na década de 19901 com o Tratado da União Europeia (TUE) e com o Tratado das Comunidades Europeias (TCE) se define claramente, nos termos do disposto no seu artigo 17º, a qualidade de cidadão da União

esta seria reconhecida a qualquer pessoa que detivesse a nacionalidade de um Estado-Membro (EM), sendo esta última definida com base na aplicação da legislação nacional desse mesmo Estado-Membro.

Este conceito de cidadania revestiu-se de imediato de um carácter supranacional e complementar ao de cidadania nacional. Ou seja, a cidadania da União complementaria a cidadania nacional, mas não a substituindo, e comportando um conjunto de direitos e deveres que vêm associar-se aos que decorrem da qualidade de cidadão de um EM2.

O estatuto de cidadania da União implicava, até agora e apenas, para todos os cidadãos da União uma enumeração de direitos, dos quais destacamos: o direito à livre circulação e o direito à permanência no território dos EMs; o exercício da capacidade eleitoral activa e passiva nas eleições para o Parlamento Europeu e nas eleições autárquicas do EM de residência, nas mesmas condições que os nacionais do EM em questão; o direito à concessão de protecção diplomática, por parte das autoridades diplomáticas e consulares de um outro EM, no território do país terceiro (não membro da UE) em que o EM de que é nacional não se encontrasse representado, nas condições aplicáveis aos nacionais do EM em causa; o direito de petição ao Parlamento Europeu e o direito de recurso a um provedor de Justiça nomeado pelo Parlamento Europeu sobre casos de má administração na actuação das Instituições e órgãos comunitários (cf. Art. 194.º e 195.º do TCE); o direito de se dirigir por

1Antes da assinatura do TUE e do TCE, houve um trabalho conjunto, com o objectivo de tornar o espaço comunitário mais coeso. Nos anos de 1990 foram feitos significativos desenvolvimentos para a conceptualização e implementação da cidadania e da educação para a cidadania na Europa, processo em que participaram diversas instituições e entidades, incluindo o Conselho da Europa, a Comissão Europeia, entre outras. O Conselho da Europa envolveu-se com a educação dos direitos humanos e da cidadania desde os anos de 1980. Exemplo desse esforço, em 1987 a Comissão Europeia iniciou projectos transnacionais de educação, através do programa Erasmus. A razão comum a todas as iniciativas foi a

promoção de um sentido de identidade e cidadania europeia.

2Os deveres enunciados serão, por isso, os que decorrem da nacionalidade nacional de cada cidadão, não existindo qualquer dever acrescido, resultante da cidadania da União, além do respeito pela cidadania europeia e do dever de se defender essa mesma cidadania.

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escrito a qualquer das instituições ou órgãos da União numa das línguas dos EMs e de obter uma resposta redigida na mesma língua (artigo 21.º, terceiro parágrafo, do TCE); e o direito de acesso aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho3 e da Comissão, sob determinadas condições (cf. artigo 255.º do TCE).

Todavia, esses direitos associados à cidadania europeia sempre contiveram restrições evidentes e óbvias: de acordo com o art. 18, nº 1 (TCE) “todos os cidadãos da União têm o direito de mobilidade e residência dentro dos territórios dos Estados membros, sujeitos às limitações e condições definidas no Tratado e nas medidas de funcionamento”. Esta reserva refere-se em particular ao interesse legítimo dos EMs para requerer cobertura social e financeira antes de garantirem a permissão de residência, para proteger os seus recursos públicos. Por analogia, como evidencia Besson (2007), estas limitações e reservas aplicam-se a todos os direitos de cidadania europeia, direitos esses garantidos e limitados pelos Tratados. Esta situação tem sido objecto de preocupação, já que essas limitações podem ser aceites em relação às liberdades fundamentais económicas, mas não nas áreas social e política. A dificuldade aumentou a partir do momento em que a jurisprudência comunitária se tornou mais generosa em garantir a justificação para as limitações nacionais para os direitos da cidadania europeia do que devia, deixou que estes direitos fossem invocados como uma das quatro liberdades fundamentais. E, se é verdade que o TJ iniciou uma inédita e altamente necessária acção ao desenvolvimento de expansão do âmbito material e pessoal dos direitos de cidadania da UE, esta extensão tem infelizmente sido compensado pela elaboração de justificações overbroad para as restrições a esses direitos.

Na sequência da aprovação do Tratado de Lisboa, a mesma ideia de reforço da cidadania da União transparece no seu articulado, procurando-se envolver cada vez mais o cidadão na construção da União e nos processos de tomada de decisão (policy- making), através de diversos mecanismos e ferramentas (manutenção/reforço de alguns já referidos supra e criação de outros que iremos abordar no ponto seguinte e que serão a base da nossa análise).

Neste sentido, consideramos de extrema relevância tentar perceber a abrangência do conceito de cidadania europeia e de que forma ela poderá ser verdadeiramente operacionalizada para que a dicotomia instituições-cidadão seja um verdadeiro vector de aprofundamento e de interacção na construção da União, dadas as suas especificidades ímpares. Quer dizer, se cidadania strictu sensu é um vínculo jurídico entre o indivíduo e o respectivo Estado, que se traduz num conjunto de direitos e deveres, necessitamos de conseguir enquadrar este novo vínculo supranacional estabelecido entre cidadãos e União, tendo sempre em conta a ausência de deveres directamente imputados a esta relação supranacional, mesmo com a entrada em vigor do Tratado de Lisboa e da vinculação/obrigatoriedade da Carta dos Direitos Fundamentais.

De facto, este conceito tem sido alvo de diversas reflexões, tentando-se por um lado identificar os problemas e preocupações existentes e que evitam a consolidação da cidadania europeia e, por outro, delinear a definição do conceito, abrangente o suficiente, para esclarecer este novo tipo de vínculo que extravasa fronteiras nacionais. Nyers (cf. 2007) apresenta uma síntese de algumas das abordagens e contributos de

3Entenda-se Conselho de Ministros, de acordo com a numenclatura do Tratado de Lisboa. 18

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alguns investigadores. Destacamos aqui Gerard Delanty que analisa a política da cidadania europeia e regista algumas preocupações relacionadas com a falta de solidariedade e justiça social neste modelo emergente de cidadania. Para outros autores como Aihwa Ong, a preocupação está na questão de saber se as concepções territoriais de cidadania ainda são actuais e relevantes ou se, actualmente, o conceito deve encontrar outros significados de acordo com os movimentos globais que marcam a política contemporânea4. Para Figueroa, por sua vez, a cidadania envolve: um compromisso para com a sociedade tendo em atenção a sua diversidade; abertura e solidariedade para com os outros indivíduos e as diferenças; aceitação de todas as outras pessoas; rejeição de qualquer forma de exploração, tratamento discriminatório ou racismo (Figueroa, 2000, 57).

Perante todas estas incertezas, não podemos esquecer que, tal como defende Yeatman (op. cit.), qualquer discussão acerca da cidadania europeia no futuro deve ter sempre em conta a relação complexa mas duradoura entre soberania e subjectividade, entre a procura da auto-preservação pelo indivíduo e os Estados e outras entidades que procuram legitimar a sua autoridade (onde inserimos a UE). Ou seja, o conceito de cidadania terá de ser reformulado, pois como Preuss realçou “citizenship does not presuppose the community of which the citizen is a member, but creates this very community” (apud Osler, 2006).

O grau de realização da cidadania da União alcançado até à data deve-se preponderantemente (excepção feita à capacidade eleitoral) a uma mera sistematização de direitos já existentes (sobretudo no referente à liberdade de circulação, ao direito de permanência e ao direito de petição), assistindo-se agora à sua consagração no direito primário em nome de um projecto político. Contrariamente ao observado relativamente à noção de constituição existente nos Estados europeus desde a proclamação da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789), à cidadania da União não se encontram associadas quaisquer garantias específicas em matéria de direitos fundamentais5. Embora o n.º 2 do artigo 6.º do TUE se previsse que a “União respeitará” os direitos fundamentais consagrados na Convenção Europeia de Salvaguarda dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, bem como pelas “tradições constitucionais comuns” aos EMs, enquanto princípios gerais do direito comunitário, o referido artigo não remetia, todavia, para o estatuto jurídico da cidadania da União (relativo ao direitos fundamentais da União)6. Não obstante o enunciado do n.º 2 do artigo 17.º do Tratado CE, a cidadania da União não comporta, por isso, quaisquer deveres para os cidadãos da União, o que representa uma diferença substancial relativamente à cidadania dos EMs, salvo o respeito pelos Direitos Fundamentais e pelo respeito da cidadania e defesa da UE, como referimos.

Com a entrada em vigor do Tratado de Lisboa, necessitamos de perceber de que forma a Carta dos Direitos Fundamentais, com o carácter vinculativo que adquiriu, e as modalidades de participação directa dos cidadãos no processo de policy-making (essencialmente com a criação da Iniciativa de Cidadania Europeia) poderão favorecer

4Ong realça as grandes metrópoles urbanas que acolhem as migrações globais, teorizando como esses centros se podem tornar numa “zona de mutação da cidadania” onde os castigos e recompensas estão

distribuídos de acordo com os activos que contribuem para a economia urbana. Cf. Nyers, 2007.

5Procurou-se alterar esta situação com o TL, onde a Carta dos Direitos Fundamentais passou a ser vinculativa.

6Cf. “Os cidadãos da União e os seus direitos”. Fichas Técnicas sobre a União Europeia. [CD-ROM] Parlamento Europeu: 2009.

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o aumento do envolvimento dos cidadãos na integração europeia, ou seja, de que forma os mecanismos previstos poderão potencializar efectivamente a defesa dos cidadãos e a cidadania activa que, segundo a definição de Hoskins, implica a participação na sociedade civil, comunidade e/ou vida política, caracterizada pelo respeito mútuo e não-violência e de acordo com os direitos humanos e com a democracia (Hoskins et al., 2006). Este autor procura demonstrar a heterogeneidade que se verifica ainda entre os EMs da UE, em termos de cidadania activa, de acordo com a construção do indicador compósito7.

Figura 1 - Indicador compósito da cidadania activa

Fonte: Hoskins et al. (2006)

Além disso, será também importante avaliar a capacidade e vontade que cada EM terá para participar no aprofundamento deste projecto contínuo de experimentação política que implica a interdependência muito partilhada e a busca de arranjos institucionais perante contestações e conflitos, dentro de uma comunidade de comunidades. Devido à adesão à UE, os próprios EMs vêem-se forçados a questionar o conceito de soberania e de cidadania, aceitando o impacto da Europa na sua organização, instituições e políticas

7O Indicador compósito da cidadania Activa (Hoskins et al.) foi elaborado com dados de 19 países europeus e baseado em 63 indicadores, com base no Documento Social Europeu de 2002. O enquadramento teórico utilizado para construir o índice composto da cidadania activa foi desenvolvido – em cooperação com o Conselho da Europa – por uma rede de peritos europeus e apresentado numa conferência internacional em Ispra em Setembro de 2006. Os autores estabeleceram diversos itens, organizados em quatro grandes áreas, nomeadamente: a dimensão da vida política, a dimensão da sociedade civil, a dimensão da comunidade e a dimensão dos valores. Como se demonstra com o indicador construído, verificamos uma Europa heterogénea, onde os países nórdicos lideram e os países do sul apresentam performances positivas apenas em relação aos valores e à vida política, mas negativas relativamente à sociedade civil e à vida em comunidade. Os cinco países top de acordo com o indicador compósito são Suécia, Noruega, Dinamarca, Áustria e Bélgica, enquanto que no fim do ranking estão a Itália, Portugal, Grécia, Hungria e a Polónia. Todavia, os cinco mais bem posicionados não têm as pontuações mais elevadas nas 4 dimensões. O mesmo se aplica aos menos bem colocados. Por exemplo, a Polónia tem uma das mais elevadas performances na dimensão dos valores e Portugal fica a meio da tabela na mesma dimensão.

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e aceitar o facto que as decisões políticas comunitárias não reflectirão exclusivamente os seus interesses nacionais.

1. A Cidadania europeia no Tratado de Lisboa

O conceito de cidadania, tendo por base o definido nos tratados anteriores, está explicitamente actualmente definido no artigo 9º do Tratado de Lisboa (TL), que define que “Em todas as suas actividades, a União respeita o princípio da igualdade dos seus cidadãos, que beneficiam de igual atenção por parte das suas instituições, órgãos e organismos. É cidadão da União qualquer pessoa que tenha a nacionalidade de um Estado-Membro. A “cidadania da União acresce à cidadania nacional, não a substituindo” (sublinhado nosso).

O Tratado de Lisboa consagra ainda os princípios fundamentais da igualdade democrática, da democracia representativa (art. 10º)8 e da democracia participativa. Neste Tratado, e exemplo da preocupação para a promoção da democracia participativa, prevê-se ainda um novo mecanismo de interacção – de facto, no artigo 11º, nº 4, surge um novo direito para os cidadãos da União: “Um milhão, pelo menos, de cidadãos da União, nacionais de um número significativo de Estados-Membros, pode tomar a iniciativa de convidar a Comissão Europeia a, no âmbito das suas atribuições, apresentar uma proposta adequada em matérias sobre as quais esses cidadãos considerem necessário um acto jurídico da União para aplicar os Tratados”.

A Iniciativa dos Cidadãos Europeus (ICE) torna-se, assim, numa das mais importantes inovações do TL em termos de cidadania e que, a par dos mecanismos já anteriormente previstos de interacção com as instituições e órgãos, donde se destacavam o Parlamento Europeu e o Provedor de Justiça, respectivamente, procura aprofundar a capacidade do cidadão se envolver pro-activamente no processo de policy-making da União.

Além da novidade da ICE, a partir de 2009, a Carta dos Direitos Fundamentais passa também a ser vinculativa, o que demonstra a preocupação em tornar a Europa numa união mais uniforme em termos sociais. Estes (ICE e carácter vinculativo da Carta) serão os dois exemplos que procuraremos aprofundar na nossa análise acerca da construção da identidade europeia.

2.A Carta dos Direitos Fundamentais e a Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem

De forma, a consagrar os direitos civis, políticos, económicos e sociais, o Tratado de Lisboa torna também vinculativa a Carta dos Direitos Fundamentais9, reconhecendo-lhe o mesmo valor jurídico dos Tratados, uma nomenclatura de direitos, liberdades e garantias. Como explica Isabel Camisão, “… constitui um avanço na protecção dos direitos dos cidadãos europeus…”, e tem a “… vantagem de permitir aos cidadãos europeus um maior conhecimento e compreensão das garantias que lhe advêm da sua condição de cidadãos da União.” (www.ieei.pt, 22.12.09). Confirma a adesão da União

8De acordo com o nº 3 do art. 10º “todos os cidadãos têm o direito de participar na vida democrática da União. As decisões são tomadas de forma tão aberta e tão próxima dos cidadãos quanto possível”.

9Os Estados-membros já haviam assinado a Carta em 2000. 21

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àConvenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem, cujos direitos fundamentais passam a fazer parte integrante do ordenamento jurídico.

A Carta dos Direitos Fundamentais não será directamente incorporada no Tratado de Lisboa, mas adquire força jurídica vinculativa nos termos do n.º 1 do artigo 6.º do Tratado UE, que confere à Carta o mesmo valor jurídico que é atribuído aos Tratados. Tal como se estabelece na própria Carta, esta não alarga as competências da União previstas nos Tratados. Acresce à Carta um protocolo introduzindo medidas específicas para o Reino Unido e a Polónia, as quais prevêem excepções à natureza juridicamente vinculativa da Carta perante os tribunais nacionais destes países.

A UE aderirá à Convenção Europeia assim que o 14.º protocolo da CEPDH entrar em vigor, permitindo que tanto Estados como organizações internacionais se tornem signatários da CEPDH. Não obstante, o acto de adesão tem de ser ratificado por todos os Estados-Membros da UE.

A Carta dos Direitos Fundamentais (CDF)10 consagra os direitos civis, políticos, económicos e sociais que assistem a todos os cidadãos da União. Trata-se de uma nomenclatura de direitos, liberdades e garantias que contribui de forma decisiva para a consolidação do conceito de cidadania europeia, representando uma sinopse dos valores comuns dos EMs da União. A Carta tem por desiderato promover a dignidade humana, ilustrar os direitos fundamentais dos cidadãos europeus, expor os alicerces intelectuais e jurídicos da União Europeia patenteando-a como uma comunidade de valores e de direito. Este documento garante que todas as instituições europeias respeitarão e farão respeitar os direitos fundamentais explanados.

O Conselho Europeu de Colónia, reunido em Junho de 1999, considerou conveniente reunir num único documento a panóplia de direitos que assistem a todos os cidadãos do espaço comunitário, de modo a serem clarificados. Pela primeira vez, na história jurídica do projecto europeu, seria elaborado um documento onde estariam agrupados todos os direitos fundamentais atribuídos aos cidadãos, que até então se encontravam dispersos por vários textos jurídicos, constituindo assim, uma autêntica inovação. Deste modo, o Conselho Europeu conferiu um mandato a uma Convenção para redigir um projecto de Carta. A Convenção sobre os Direitos Fundamentais da UE seria instituída em Dezembro do mesmo ano, presidida por Roman Herzog, e contaria com representantes11 dos parlamentos nacionais e dos governos dos EMs, deputados do Parlamento Europeu e o comissário europeu responsável na matéria. As reuniões da Convenção12 foram públicas, e toda a documentação produzida estava disponível on- line para que os cidadãos pudessem consultar e acompanhar os trabalhos. A escolha do método utilizado para a elaboração da Carta proporcionou um debate alargado, originando um documento que reuniu consensos vindo a ser aprovado por uma vasta maioria em 2 de Outubro de 2000. O Conselho Europeu de Biarritz reunido em 13/14 de Outubro do mesmo ano deu o seu aval unânime ao projecto de Carta e expediu-o ao Parlamento Europeu e à Comissão Europeia. O Parlamento Europeu e a Comissão

10Trata-se da mais recente declaração de direitos fundamentais na esfera mundial e a primeira do novo milénio.

11Portugal fez-se representar pela eurodeputada Teresa Almeida Garret, pela deputada Maria Eduarda Azevedo, e por Pedro Bacelar de Vasconcelos e Miguel de Serpa Soares (suplente) em representação do governo.

12Foram promovidas audiências públicas de representantes da sociedade civil, originando mais de 1500 propostas de redacção da Carta. Os parlamentos nacionais encetaram audiências, debates parlamentares e recolheram opiniões sobre o texto da Carta.

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Europeia deram a sua aprovação em 14 de Novembro e 6 de Dezembro de 2000 respectivamente. Em 7 de Dezembro seguinte, no Conselho Europeu de Nice, os Presidentes do Parlamento Europeu, Nicole Fontaine, do Conselho, Jacques Chirac, e da Comissão, Romano Prodi, assinaram a Carta em nome das respectivas instituições. No momento da sua adopção em Nice foi-lhe reconhecido o valor político. O Tratado Constitucional13 previa a sua inclusão integral na Parte II, tornando-a juridicamente vinculativa.

A Carta vai beber a várias fontes jurídicas sendo fruto do espírito da legislação existente, derivada do Tratado que institui a Comunidade Europeia, do Tratado da União Europeia, das tradições constitucionais dos 15 EMs, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem do Conselho da Europa de 1950, com os seus protocolos adicionais, da jurisprudência do Tribunal dos Direitos do Homem de Estrasburgo, da jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, da Carta Social Europeia do Conselho da Europa de 1961, da Carta Comunitária dos Direitos Sociais Fundamentais dos Trabalhadores de 1989, da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, do Estatuto do Tribunal Penal Internacional, entre outras. A Carta congrega 54 artigos, divididos em 6 capítulos: dignidade, liberdade, igualdade, solidariedade, cidadania, justiça.

Não existiu a pretensão de redigir uma Constituição Europeia, nem formular novos direitos, tão pouco se fez tenção de transferir responsabilidades dos EMs para a União14, o intento era aclarar a legislação existente. A Carta tem o propósito de certificar os direitos fundamentais individuais, de elucidar que as instituições europeias e os EMs quando promovem e aplicam o direito da União, e também nas negociações com países candidatos ou países terceiros, estão vinculados aos direitos fundamentais dos cidadãos, reafirmar que a União Europeia sempre foi um espaço de valores e direitos partilhados, e salvaguardar os cidadãos do abuso do poder por parte do Estado. Houve, também, uma preocupação com os desafios actuais dando assim, relevância à bioética, a protecção de dados ou o meio ambiente, a defesa do consumidor, e alertando para a urgência em acabar com a descriminação em razão da raça, do sexo, da cor ou da religião. Ela constitui um importante instrumento de auxílio de interpretação para o Tribunal de Justiça Europeu na sua jurisprudência.

A Carta dos Direitos Fundamentais foi solenemente proclamada no dia 12 de Dezembro de 2007, em Estrasburgo, pelos Presidentes das instituições europeias, não será directamente incorporada no Tratado de Lisboa, mas adquire força jurídica vinculativa nos termos do n.º 1 do artigo 6.º do Tratado UE, que confere à Carta o mesmo valor jurídico que é atribuído aos Tratados. Tal como se estabelece na própria Carta, esta não alarga as competências da União previstas nos Tratados. Acresce à Carta um protocolo introduzindo medidas específicas para o Reino Unido e a Polónia, as quais prevêem excepções à natureza juridicamente vinculativa da Carta perante os tribunais nacionais destes países. O Tratado de Lisboa vem confirmar a adesão da União à Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem, cujos direitos fundamentais passam a fazer parte integrante do ordenamento jurídico. A UE aderirá à Convenção Europeia assim que o 14.º protocolo da CEPDH entrar em vigor, permitindo que tanto Estados como organizações internacionais se tornem signatários da CEPDH.

13Assinado em 29 de Outubro de 2004, não entrou em vigor.

14A alteração de responsabilidades é um direito e uma função que assiste exclusivamente aos EMs, sob a forma de alteração aos Tratados.

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Não obstante, o acto de adesão tem de ser ratificado por todos os Estados-Membros da UE.

Com a Carta os líderes políticos europeus aspiraram passar uma mensagem de comprometimento com os valores e com o direito para os cidadãos, para os países candidatos ao espaço europeus, aos países vizinhos e à comunidade internacional em geral. A Carta dos Direitos Fundamentais não vem conferir novas responsabilidades à União, nem tão pouco obrigar os EMs a alterarem as suas Constituições, o seu propósito é enfatizar o respeito pelos valores democráticos, pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais. Desta forma, apraz-nos afirmar que se trata de um documento inspirador e de referência que espelha a liberdade e o respeito pela democracia e pelos direitos fundamentais que se vive no seio da União. Como explica Isabel Camisão, “… constitui um avanço na protecção dos direitos dos cidadãos europeus…”, e tem a “… vantagem de permitir aos cidadãos europeus um maior conhecimento e compreensão das garantias que lhe advêm da sua condição de cidadãos da União.” (www.ieei.pt, 22.12.09). Este documento é um sinal de que o projecto de integração europeia empreendido ao longo dos últimos 50 anos foi alicerçado desde o inicio em valores fundamentais.

3. A Iniciativa de cidadania europeia (ICE) – o artigo 11º, nº 415

A introdução da ICE, como já referimos, demonstra a vontade plasmada no TL de uma preocupação para o envolvimento cada vez maior dos cidadãos junto das instituições e, neste caso, junto da Comissão Europeia especificamente, situação à qual a prática de realização de consultas públicas à sociedade civil já não conseguia responder da forma mais eficiente16.

Pelo artigo 11º, nº 4 foi instituído um novo mecanismo de promoção da cidadania activa da União. Por este artigo, um milhão, pelo menos, de cidadãos da União, nacionais de um número significativo de Estados-Membros, pode tomar a iniciativa de convidar a Comissão Europeia a, no âmbito das suas atribuições, apresentar uma proposta adequada em matérias sobre as quais esses cidadãos considerem necessário um acto jurídico da União para aplicar os Tratados. Os procedimentos e condições para a apresentação de tal iniciativa são estabelecidos nos termos do primeiro parágrafo do

15Para esclarecimento e uniformização, adoptamos a numeração indicada nas versões consolidadas dos Tratados, publicada no Jornal Oficial da EU C115, de 9 de Maio de 2008, dado que a versão do Tratado de Lisboa publicada em 17 de Dezembro de 2007, apresenta uma numeração distinta.

16A Comissão Europeia desenvolveu um espaço electrónico dedicado exclusivamente à consulta da sociedade civil sobre as temáticas em discussão na Agenda europeia, procurando obter o feedback necessário dos cidadãos relativamente às mais diversas áreas. Desta forma pretende-se envolver directamente os cidadãos nos processos de tomadas de decisão. Cf. http://ec.europa.eu/yourvoice/consultations/index_en.htm.

Outro exemplo de boas práticas, foi a criação pela Comissão de diversos fora temáticos (também on- line), nos quais os cidadãos podem colocar as suas questões e debater as problemáticas comuns aos diversos EMs e procurar influenciar os processos de policy-making, bem como as negociação da União com países terceiros em determinadas parcerias, os direitos dos cidadãos, etc. Como exemplo, podemos falar do Fórum dos Cidadãos sobre Energia. O Fórum foi lançado pela Comissão em colaboração com as associações nacionais e europeias dos consumidores, representantes dos EMs, representantes da Comunidade da Energia, entre outras entidades e tem como principal objectivo proteger os interesses dos consumidores na formulação das políticas e verificar o respeito pelos direitos dos consumidores na sua implementação.

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artigo 24º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, mas que ainda necessitarão de regulamentação17.

No entanto, apesar do estabelecimento desse mecanismo continuam a existir várias questões de ordem prática que estão ainda em aberto e às quais têm de ser dadas respostas rapidamente, para que esse mecanismo se torne efectivo e não deixe de ser uma oportunidade perdida e letra morta do tratado. Por exemplo, o que se entende exactamente por "número significativo" de países? Quantas assinaturas têm de vir de cada um desses países? Qual a idade mínima dos participantes e a quem incumbe verificar as assinaturas? Quem deve submeter no final a iniciativa? Será que a Comissão está obrigada a responder ou a tomar a iniciativa? Ou, se concordar com a pertinência do assunto apresentado, será que pode fazer alguma alteração ao pedido submetido pelos cidadãos? Qual a real capacidade dos cidadãos de realizarem uma ICE?

Alguns aspectos práticos da iniciativa de cidadania, como podemos verificar, têm ainda de ser definidos, e a Comissão Europeia tem procurado reunir as informações e dados necessários para regulamentar tal medida, de forma a definir regras e procedimentos mínimos. Nesse sentido, e como a ICE deve estar regulamentada até ao final de 2010, a Comissão lançou uma consulta pública18 para recolher opiniões dos cidadãos antes de terminar os seus trabalhos na matéria.

As principais questões que se pretendiam abordar no Livro Verde e na consulta pública versaram pontos para definir questões práticas e concretas para a realização da ICE:

-número mínimo de países da UE a que devem pertencer os signatários;

-número mínimo de signatários por país;

-idade mínima dos signatários;

-aspectos formais e de redacção de uma iniciativa de cidadania;

-regras relativas à recolha, verificação e autenticação das assinaturas;

-prazo para a recolha das assinaturas;

-formas de registo oficial das iniciativas;

-regras em matéria de transparência e de financiamento (aplicáveis aos organizadores);

-eventual prazo de resposta da Comissão;

-como proceder caso existam várias iniciativas sobre uma mesma questão.

Como podemos verificar, a capacidade e eficiência da ICE ainda não pode ser efectivamente medida, já que ainda não pode ser aplicada nem sabemos se este mecanismos se traduzirá numa real forma de aproximação e envolvimento dos cidadãos ao processo de policy making da União. De facto, a complexidade das exigências para a realização e validade de uma ICE poderá ter um efeito contraproducente, afastando mais uma vez os cidadãos e deixando a capacidade de elaboração destes processos para associações e/ou movimentos sociais que, por vezes, poderão estar mais centrados em atingir os seus objectivos específicos e relegando o bem comum (e comunitário) da sociedade europeia para segundo plano.

17A regulamentação da forma de procedimento da ICE deverá estar finalizada até ao final do ano de 2010, para entrar em vigor em 2011.

18Cf. Livro Verde sobre a ICE, da Comissão Europeia – consulta pública realizada até 31 de Janeiro de 2010.

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A identidade europeia – a cidadania supranacional

Paula Marques Santos e Mónica Silva

Considerações finais

O clima europeu com a Estratégia de Lisboa renovada (Estratégia 2020) e o Tratado de Lisboa trouxe a coesão social para o centro da agenda da política europeia. A cidadania europeia é um elemento crucial de toda a estratégia, focando-se nos valores, democracia representativa e sociedade civil. Mas antes de podermos avaliar a importância da cidadania europeia e do seu verdadeiro impacto no processo de integração e aprofundamento europeu, necessitamos saber se os cidadãos se sentem efectivamente cidadãos da União e se desejam estar no meio desse processo. Ou seja, se poderemos falar na capacidade de coesão que equivalha a uma identidade europeia.

Éevidente que as divergências e as oposições de interesses subsistirão por longo tempo nesta Europa de 27 Estados, como no interior das sociedades nacionais. A Europa real é, pois, um grande e longo processo de aprendizagem e de experimentação à escala continental, com todas as dificuldades e resistências que isso comporta (cf. Ribeiro, 2009).

A capacidade de acesso à informação disponibilizada pelas instituições e organismos europeus não implica uma equivalente adesão pelos cidadãos a essa mesma informação nem a detenção de uma sociedade mais informada, pró-activa e preocupada com a integração europeia. De facto, falar de cidadania europeia, implica antes de mais, falar de cidadania nacional e na capacidade que as entidades de cada país têm para formar cidadãos mais preocupados e envolvidos na vida em comunidade.

Neste sentido, as entidades de ensino superior têm um papel fundamental para a formação de jovens cidadãos interessados em participar no processo de decisão que influenciará a nossa vivência em sociedade. A criação de espaços onde os jovens possam esclarecer as suas dúvidas e conhecer melhor a união europeia à qual pertencem e a qual se tornou no espaço por excelência da sua empregabilidade, competitividade, mas também de concorrência natural. Só através da aposta numa formação centrada em valores como a cidadania, o voluntariado e a responsabilidade poderemos esperar que os cidadãos contribuam de uma forma mais activa no processo de aprofundamento europeu. Ou seja, a aproximação dos cidadãos do processo de integração fundamenta-se na cidadania activa e na capacidade dos Estados em promover e reforçar a importância do seu capital social. Tal como Robert Putman afirma, a cidadania activa está fortemente relacionada com o "envolvimento cívico" que desempenha um papel crucial na formação do capital social. Ou seja, a busca de objectivos comuns fornece uma maneira para as pessoas experienciarem a "reciprocidade" e, assim, ajuda a criar redes apoiadas em valores partilhados. Os níveis elevados resultantes da confiança social promovem uma maior cooperação entre as pessoas e reduzem as oportunidades de um comportamento anti-social (Putnam, 2000).

O futuro da discussão sobre esta temática passa pelo destaque da importância em adoptar um processo baseado numa orientação reflexiva para o estudo da cidadania europeia, ou seja, em vez de procurar estabelecer a primazia de um determinado nível de cidadania, padronizados consciente ou insconscientemente por influências ideológicas (cf. Kostakopoulou, Set. 2007), o mais importante será tomar como base o pressuposto de que a UE e as cidadanias nacionais são interdependentes, examinando a sua interacção e transformação gradual.

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Paula Marques Santos e Mónica Silva

Com o Tratado de Lisboa, demonstra-se a vontade de transformar uma Europa baseada na economia para uma Europa dos Cidadãos, uma Europa Social, que procura transmitir o sentimento de pertença a uma entidade supranacional. De facto, a cidadania europeia fez repensar o “impossível”, procurando um novo modelo que conceda aos cidadãos formas de combate à discriminação, à exclusão e à incapacidade de alcançar a empregabilidade e a estabilidade pessoal e colectiva. Talvez seja este o caminho para redefinir o conceito de cidadania e responder, simultaneamente, aos problemas que se enfrentam actualmente, tornando a UE num espaço mais competitivo e líder ao nível da formação e da cidadania.

Se o principal objectivo da cidadania europeia, enquanto conceito supranacional, é reforçar a protecção dos direitos e dos interesses dos cidadãos dos Estados-Membros ao mesmo tempo que pretende reforçar e consolidar a identidade da Europa, criando um conjunto de direitos e deveres que permita uma maior participação dos cidadãos europeus no processo de integração, designadamente o direito de residência como um direito fundamental, incluindo também a participação política dos cidadãos, a protecção diplomática e consular, o direito de petição, entre outros, a necessidade de se efectivar e difundir esse sentimento de pertença a uma mesma comunidade torna-se no ponto- chave do debate sobre esta problemática, procurando identificar metodologias para o reforço dessa mesma cidadania supranacional.

A cidadania europeia só poderá ser reforçada depois do reforço da cidadania nacional em cada EM, através da formação de cidadãos mais informados e preocupados com a comunidade onde se inserem, ou seja, através da formação “… all young people acquire the competencies required for personal autonomy and for citizenship, to enter the world of work and social life, with a view to respecting their identity, openness to the world and social and cultural diversity. (UNESCO, 2004, p. 3).

Nesse sentido, caminhamos para a necessidade de implementação dos mecanismos previstos nos Tratados. De facto, após a votação do Parlamento Europeu em Dezembro de 2010, o Conselho adoptou a 15 de Fevereiro de 2011 o regulamento sobre a iniciativa de cidadania europeia. Assim, a iniciativa de cidadania europeia estará operacional a partir de finais de Março de 2012.

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