OBSERVARE

Universidade Autónoma de Lisboa

ISSN: 1647-7251

Vol. 2, n.º 1 (Primavera 2011), pp. 1-15

EQUILÍBRIO POSITIVO NAS RELAÇÕES CHINA-EUA:

DURADOURO OU NÃO?

Robert Sutter

Professor Visitante na School of Foreign Service da Universidade de Georgetown. Especialista em assuntos da Ásia e do Pacífico e em política externa dos EUA. Ocupou várias posições de análise e de supervisão na Biblioteca do Congresso e trabalhou com a Agência Central de

Inteligência, o Departamento de Estado, e com a Comissão de Relações Exteriores do Senado. Foi Especialista Principal em Política Internacional do Serviço de Investigação do Congresso, Director Nacional de Inteligência para o Leste Asiático e Pacífico do National Intelligence Council do governo dos Estados Unidos. Doutor em História e em Línguas do Leste Asiático pela Universidade de Harvard e Professor Adjunto nas Universidades de Georgetown, George Washington, Johns Hopkins e da Virgínia. Publicou 18 livros, numerosos artigos e centenas de relatórios governamentais sobre países do Leste Asiático e Pacífico e respectivas relações com os Estados Unidos.

Resumo

Os vários exemplos de pressão exercida pela opinião pública chinesa sobre os Estados Unidos durante 2009 e 2010, acerca de uma vasta gama de questões que envolvem os mares perto da China, o Taiwan e o Tibete, assim como as disputas económicas, estão sujeitas a interpretações diferentes, mas, no geral, não parecem perturbar seriamente o actual equilíbrio positivo entre os governos Chinês e Norte-americano.

Palavras-chave

Estados Unidos; China; envolvimento; assertividade; push-back (empurrão para trás)

Como citar este artigo

Sutter, Robert (2011). "Equilíbrio positivo nas relações China-EUA: duradouro ou não?”. JANUS.NET e-journal of International Relations, Vol. 2, N.º 1, Primavera 2011. Consultado [online] em data da última consulta, observare.ual.pt/janus.net/pt_vol2_n1_art1.

Artigo recebido em Dezembro de 2010 e aceite para publicação em Março de 2011

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Equilíbrio positivo nas relações China-EUA: duradouro ou não?

Robert Sutter

EQUILÍBRIO POSITIVO NAS RELAÇÕES CHINA-EUA:

DURADOURO OU NÃO?

Robert Sutter

Introdução

As relações entre os Estados Unidos e a China surgiram como a mais importante relação bilateral do século XXI. A importância económica global da China e o seu crescente poder político e militar decorreu numa ordem mundial na qual os Estados Unidos enfrentavam muitos desafios, mas onde continuava a exercer uma ampla liderança que reflectia o seu estatuto de superpotência. Até que ponto é que os dois poderes apoiarão a paz internacional e o desenvolvimento, estreitando as suas ligações de cooperação, ou se tornarão antagonistas à medida que os seus interesses colidem, ou optarão por qualquer outro caminho em matéria de assuntos mundiais, continua a ser assunto de debate entre especialistas e decisores políticos dos dois países.1

Publicamente, ao longo da presente década, as autoridades da China e dos Estados Unidos têm tendido a enfatizar os aspectos positivos da relação, onde se incluem ligações comerciais e de investimento cada vez mais estreitas conducentes ao aprofundamento da interdependência económica entre os Estados Unidos e a China, interesses convergentes em matéria de segurança relativamente ao terrorismo internacional, o programa de armas nucleares da Coreia do Norte, missões de paz da ONU e outros assuntos que envolvem situações delicadas na Ásia e no mundo. No período pós Mao Zedong (falecido em 1976), a China, apoiada pelos Estados Unidos, avançou muito na adopção de normas que traduziam um comportamento económico assente no mercado livre, e que eram essenciais para poder gerir com sucesso as condições impostas pela globalização económica da presente era. A China alterou igualmente a sua política sobre proliferação de armas de destruição maciça de forma significativa, com vista a uma maior sintonia com as normais internacionais apoiadas pelos EUA.

Nos últimos tempos, a cooperação EUA-China em matéria de alterações climáticas e questões ambientais aumentou, e as discussões bilaterais sobre direitos humanos prosseguem no seio de análises contraditórias sobre os progressos da China em aceitar as normas internacionais de inspiração norte-americana.

As diferenças entre os EUA e a China relativamente ao Taiwan diminuíram com a chegada ao poder do Presidente do Taiwan Ma Ying-jeou em 2008, que rapidamente fez o Taiwan mudar de direcção a favor de uma atitude de maior cooperação nas relações com a China. De forma geral e com algumas reservas, o governo norte- americano aceita e apoia o governo comunista chinês como actor principal nos assuntos mundiais; o governo chinês acabaria por aceitar, pelo menos até à data, a ordem

1Aaron Friedberg, “Is China a Military Threat?—Menace,” The National Interest (Setembro-Outubro de 2009, 19-25, 31-32.

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internacional vigente na qual os Estados Unidos assumem um papel preponderante nos assuntos asiáticos e mundiais.2

A imagem benigna das relações China-EUA que transparece no recente discurso público das autoridades chinesas e norte-americanas foi reforçada por analistas proeminentes, especialmente nos Estados Unidos, que destacaram a convergência de interesses entre os dois países, tendo alguns defendido a necessidade de uma ordem internacional definida essencialmente pela cooperação entre os dois governos, a que se chamou uma ordem mundial "G-2" para o século XXI.3

Na prática, porém, as relações sino-americanas continuam a ser mais complicadas e conflituosas do que o recente discurso oficial e os argumentos avançados pelos analistas a favor de um condomínio internacional sino-americano levaria a crer.

A análise das relações sino-americanas de muitas décadas indica a presença de enormes mudanças ao longo do tempo, com padrões de confronto, animosidade e desconfiança muito mais prevalentes do que os padrões de concordância e de cooperação.

As últimas quatro décadas foram palco, em várias ocasiões, de melhorias notáveis nas relações entre os dois países, na medida em que dirigentes de ambos os lados se propuseram alcançar benefícios práticos recorrendo a meios pragmáticos. O facto de a base da cooperação ser frequentemente incompleta, precária, e dependente de uma série de circunstâncias variáveis, tanto em casa como no exterior, demonstra que, frequentemente, as sociedades e governos revelam ter posições muito distintas sobre uma multiplicidade de assuntos críticos em matéria de segurança, valores, e economia. Se olharmos mais fundo e mais além do recente discurso oficial positivo, a análise dos desenvolvimentos e tendências indicam que as autoridades, elites e opinião pública dos dois países sentem suspeita e desconfiança umas das outras e das possíveis intenções nefastas, ou das implicações das mesmas, que afectarão as relações entre os dois países.4

Equilíbrio positivo nas relações entre os governos dos EUA e da China

Felizmente para aqueles que procuram uma melhoria nas relações sino-americanas, as muitas diferenças entre os Estados Unidos e a China na primeira década do século XXI foram frequentemente despoletadas por circunstâncias que levaram a que as duas lideranças gerissem as suas diferenças de forma pragmática, ao mesmo tempo que procuraram evitar problemas e, sempre que possível, desenvolver uma base comum.

O processo não foi uniforme ou fácil, mas o resultado foi um equilíbrio positivo entre os governos norte-americano e chinês que provavelmente continuará na segunda década do século XXI, apesar das muitas diferenças e conflitos.5 Durante este período, ambos governos se preocuparam com outras questões, mostrando-se, no geral, relutantes em exacerbar as tensões um com o outro.

2Kenneth Liberthal, “The China-US Relationship Goes Global,” Current History 108: 719 (Setembro de

2009) 243-246.

3Elizabeth Economy and Adam Segal, “The G-2 Mirage,” Foreign Affairs 88:3 (Maio-Junho de 2009) 56-

72.

4Robert Sutter, U.S.-Chinese Relations: Perilous Past, Pragmatic Present Lanham, Md.: Rowman and Littlefield, 2010

5Sutter, U.S.-Chinese Relations, 147-168.

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A crescente interdependência económica e cooperação sobre questões chave dos assuntos asiáticos e mundiais vieram reforçar a tendência de cada governo em acentuar os aspectos positivos e manter relações construtivas com o outro. A emergente situação positiva nas relações sino-americanas serve de base a uma maior cooperação em matéria de segurança, economia, e outros assuntos e interesses. No entanto, as diferenças em assuntos de cariz estratégico, económico e político, e outros interesses, também se mantiveram fortes e levantam grandes obstáculos a uma maior cooperação entre os dois países. Os responsáveis políticos dos dois países continuam a alimentar suspeitas sobre as intenções de cada um, e permanecem em alerta relativamente a qualquer mudança de circunstâncias no Taiwan, Japão e Coreia do Norte, assim como face a tendências económicas internacionais, políticas internas nos EUA e China, e outros desenvolvimentos que poderiam complicar seriamente a relação bilateral.

Assim, surgiu um modelo dualista nas relações EUA-China como parte do equilíbrio aparentemente positivo nesta década. O modelo envolve, por um lado, uma participação construtiva e de cooperação, e por outro, planos de contingência ou de prevenção de risco. Tal postura reflecte a combinação acima referida entre convergência e concorrência de interesses e suspeitas quanto aos líderes e cooperação.

Os planos de contingência e de prevenção chineses e norte-americanos contra o outro por vezes envolvem acções com os respectivos armamentos militares, e que constituem iniciativas separadas que são levadas a cabo em simultâneo com as respectivas políticas de envolvimento entre os dois países. O dualismo revela-se ainda na forma como cada governo usou o envolvimento para estabelecer laços positivos e de cooperação com o outro, ao mesmo tempo que os utilizavam na construção de interdependências e teias de relações que têm o efeito de limitar o outro na tomada de medidas que se oponham aos seus interesses. Apesar de a analogia não ser exacta, as políticas de envolvimento seguidas pelos Estados Unidos e pela China para com o outro contêm as suas respectivas "estratégias Gulliver", que se destinam a reprimir tendências políticas agressivas, assertivas ou negativas do outro país através de teias de interdependência criadas nas relações bilaterais e multilaterais.

Arecente situação positiva nas relações EUA-China baseia-se numa convergência crescente entre as respectivas políticas de envolvimento e as estratégias Gulliver. Contudo, o facto é que essas estratégias Gulliver reflectem suspeitas subjacentes e conflito de interesses que têm uma presença significativa nos cálculos dos governos dos EUA e da China nas relações que mantêm um com o outro.6

No início da última metade da década de noventa, os líderes chineses reexaminaram e reavaliaram a atitude confrontacional que até então haviam mantido face às pressões exercidas pelos Estados Unidos contra a China e a velha oposição chinesa ao domínio e

àdenominada "hegemonia" americana em assuntos asiáticos e mundiais. Essas pressões e domínio dos EUA tinham anteriormente sido encarados como a antítese dos interesses chineses, exigindo uma forte oposição e resistência por parte da China. Isto conduziu a um debate entre especialistas estrangeiros e chineses sobre o significado desta reavaliação. De acordo com alguns especialistas estrangeiros que entrevistaram

6Este dualismo e respectivas estratégias Gulliver são analisados in Robert Sutter, “China and US Security and Economic Interests: Opportunities and Challenges,” in Robert Ross e Oystein Tunsjo eds., US-China EU Relations: Managing The New World Order Londres: Routledge, 2010.

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várias autoridades chinesas e especialistas em política externa, os líderes chineses no final da década de noventa adoptaram uma estratégia que minimizava a oposição e as diferenças relativamente aos Estados Unidos, a favor de uma abordagem de maior cooperação com o governo americano. Diz-se que esta abordagem permaneceu sensível às intromissões norte-americanas nos interesses chineses fundamentais quanto ao Taiwan, mas retirou importância às preocupações chineses relativamente às políticas e atitude dos EUA, concebidas para solidificar a liderança americana nos assuntos asiáticos e mundiais.7

Neste contexto, alguns especialistas americanos e chineses consideraram que a nova abordagem de adaptação pragmática dos chineses obteve a aprovação dos EUA e continuará a obtê-la, resultando numa maior convergência e cooperação nas relações EUA-China. Alegaram que a adaptação chinesa se baseou numa maior maturidade e confiança por parte dos líderes chineses na forma como lidavam com os Estados Unidos e os assuntos mundiais. A maturidade e confiança chinesas foram encaradas como resultado do sucesso dos líderes chineses na promoção do notável crescimento económico ao longo de décadas, juntamente com a modernização militar e mudança social na China. Na verdade, a maturidade e a confiança foram interpretadas como estando por trás da "nova forma de pensar " que alegadamente estava a influenciar o maior envolvimento chinês em organizações regionais e multilaterais, e a contrapesar a opinião tradicional chinesa de vitimização pelos poderes externos e necessidade de estar de sobreaviso para prevenir quaisquer formas de opressão ou exploração futuras.8

Uma escola de pensamento oposta que reúne especialistas chineses e norte americanos, onde me incluo, acredita que as circunstâncias em torno da política externa chinesa e da política chinesa relativamente aos Estados Unidos foram e continuam a ser excessivamente incertas para que seja possível postular uma verdadeira e duradoura estratégia chinesa de cooperação e convergência com os Estados Unidos. Tem havido reviravoltas marcantes nas relações sino-americanas, mesmo após a publicitada decisão dos líderes chineses, na década de noventa, de adoptar uma política moderada para com os Estados Unidos.

A estabilidade do que se apresenta como uma frágil relação inerente foi contestada na presente década pela antipatia dos Estados Unidos relativamente às políticas e práticas chinesas em matéria de segurança, economia e outras áreas, e às políticas e práticas do Taiwan, Coreia do Norte, Japão e outros actores internacionais.9 Nem eu nem os restantes especialistas no grupo nos convencemos que os líderes chineses estão confiantes e suficientemente maduros na sua nova atitude de moderação para com os Estados Unidos. Pelo contrário, os líderes chineses são frequentemente vistos como sendo vulneráveis e imprevisíveis na forma como reagem e respondem a políticas e práticas, particularmente por parte do poderoso e por vezes imprevisível governo dos Estados Unidos, mas onde também se incluem os líderes de Taiwan, Japão, Rússia, Coreia do Norte, e Índia, entre outros. Adaptam-se à medida que as circunstâncias se

7Avery Goldstein. Rising to the Challenge: China’s Grand Strategy and International Security. Stanford,

Calif.: Stanford University Press, 2005.

8Evan Medeiros e R. Taylor Fravel, “China’s New Diplomacy,” Foreign Affairs 82:6 (Novembro-Dezembro

2003) 22-35.

9Susan Shirk, China: Fragile Superpower. New York: Oxford University Press, 2007.Robert Sutter, Chinese

Foreign Relations: Power and Policy since the Cold War Lanham, Md.: Rowman e Littlefield 2007, p. 3- 12.

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alteram, pesando a cada instante as vantagens e custos de manterem ou modificarem as suas políticas, para assim poderem manter as principais prioridades da liderança chinesa e promover o que denominam por poder nacional abrangente da China.

Na opinião deste grupo de analistas, nos últimos anos os líderes chineses têm apostado em convencer os Estados Unidos e outras importantes potências mundiais da determinação da China em prosseguir o caminho da paz e do desenvolvimento. Assim,

anova forma de pensar, traduzida num maior activismo internacional chinês e na atitude positiva para com organizações multilaterais e política mundial realçados em Dezembro de 2005 no Livro Branco da China intitulado Via do Desenvolvimento Pacífico da China (China’s Peaceful Development Road) parece ser apenas uma parte da recente política externa chinesa.

Esta nova forma de pensar positiva e equilibrada aparenta ter por contrapeso um grande aumento das forças militares chinesas, que corre em paralelo e é apoiado por afirmações nos livros brancos chineses sobre segurança nacional, declarações oficiais e acções diplomáticas e militares assertivas que indicam claramente que os líderes chineses estão efectivamente preparados para proteger os seus interesses de forma intensa e assertiva face a situações que justifiquem esse tipo de medidas.

Entretanto, o novo activismo internacional chinês e atitude positiva não só promovem uma imagem positiva e benéfica para a China, como são interpretados pelos analistas acima referidos como servindo um objectivo prático importante de promoção das normas e práticas em organizações internacionais e regionais, em circunstâncias que criam um amortecedor contra aquilo que interpretam como sendo os esforços do EUA para "conter" a China e impedir a ascensão do poder da China. Geralmente consistentes com a imagem da “estratégia Gulliver” referida anteriormente, os chineses promovem teias de relações de interdependência que visam prejudicar e dificultar acções unilaterais ou de outro tipo por parte da superpotência EUA que poderiam interferir em importantes interesses chineses no mundo e nos assuntos asiáticos.10

2009-2010- período de “teste” nas relações sino-americanas

Eventos em 2009

Foi neste contexto que o presidente Barack Obama tomou posse em Janeiro de 2009. O ano de 2009 expôs os pontos fortes e fracos do actual envolvimento americano com a China. O presidente Barack Obama iniciou o seu mandato enfrentando uma série de importantes problemas internacionais e domésticos, mas a política com a China não se incluía nesses problemas. A campanha do presidente fora invulgar na medida em que a política com a China esteve ausente como questão importante do debate. A opinião dos peritos insistiu junto do novo governo dos EUA para que prosseguisse o equilíbrio positivo no envolvimento entre os EUA e a China que se desenvolvera durante os últimos anos da administração de George W. Bush.11

10Phillip Saunders China’s Global Activism: Strategy, Drivers, and Tools (Washington, D.C.: National Defense University Press Institute for National Strategic Studies Occasional Paper 4 de Junho de 2006) 8-9.

11Jacques deLisle, China Policy Under Obama Foreign Policy Research Institute E-Notes 15 de Fevereiro de 2009.

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Como referido anteriormente, figuras americanas de relevo encaravam a cooperação entre a China e os Estados Unidos como a relação mais importante da política internacional do século XXI. Defendiam o estabelecimento de um condomínio “G-2" entre Washington e Pequim que dirigisse os assuntos internacionais mais importantes, incluindo a recessão económica mundial, alterações climáticas, conflito no Afeganistão e Paquistão, e o desenvolvimento de armas nucleares na Coreia do Norte e no Irão. A administração Obama foi mais realista quanto ao que se podia esperar da cooperação com a China. Procurou a ajuda da China, assim como a de outras potências importantes, para lidar com as complexas questões internacionais, e tentou tranquilizar os líderes chineses que o governo dos EUA não desafiaria seriamente a China na forma de lidar com questões sensíveis, tais como o proteccionismo comercial, direitos humanos, o encontro com o Dalai Lama do Tibete, e a venda de armas ao Taiwan. Prosseguiu o modelo desenvolvido durante a administração Bush para lidar com as muitas diferenças nas relações EUA-China, através de vários diálogos bilaterais. Realizaram-se para cima de sessenta encontros deste tipo, incluindo uma reunião anual conduzida pelos secretários americanos de Estado e do Tesouro, onde líderes americanos e chineses procuraram gerir as suas diferenças e alargar a base de cooperação, longe dos holofotes do escrutínio da comunicação social. Como resultado, a gestão cuidadosa do discurso público entre os governos dos EUA e da China continuou a enfatizar os aspectos positivos do relacionamento, enquanto as diferenças eram discutidas em reuniões privadas.12

No entanto, muitas diferenças importantes tornaram-se claramente perceptíveis à medida que o ano se desenrolava, sublinhando os limites do envolvimento positivo entre os EUA e a China. As autoridades chinesas criticaram a estratégia do governo Obama no Sudoeste Asiático e evitaram qualquer envolvimento significativo contra os talibãs. Os líderes chineses queixaram-se frequentemente do peso dos EUA na economia global e fizeram várias alusões à diversificação do mercado dos EUA, investimento em títulos do governo americano, e utilização do dólar americano. Os americanos queixavam-se do acesso restrito ao mercado chinês no contexto do enorme défice comercial com a China e houve alguns movimentos com vista a limitar as importações chinesas e outras medidas, ais quais a China ripostou com uma retaliação comercial e elevadas taxas proteccionistas.13

As autoridades chinesas e norte-americanos esforçaram-se por desenvolver uma base comum sobre as alterações climáticas, mas os progressos foram limitados e a reunião internacional de Dezembro em Copenhaga ficou marcada pela animosidade pública entre as delegações dos EUA e da China. O Presidente Obama fez um esforço extraordinário de última hora para obter o apoio da China, Índia, Brasil e África do Sul no acordo limitado que foi estabelecido.14

A cooperação sino-americana obteve melhores resultados na forma como lidaram com o segundo teste de armas nucleares e outras provocações levadas a cabo pela Coreia do Norte, mas as duas potências continuaram a discordar sobre a utilidade de recorrer

12Liberthal, “The China-US Relationship Goes Global.”

13Bonnie Glaser, “Obama-Hu Summit: Success or Disappointment?” Comparative Connections 11:4 (Janeiro 2010), 25-35.

14Charles Babington and Jennifer Loven, “Obama raced clock, chaos, comedy for climate deal,” www.ap.com 19 de Dezembr0, 2009 (consultado em 21 de Dezembro, 2009)

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àpressão internacional para obrigar a Coreia do Norte a cooperar. Pequim mostrou-se ainda mais relutante em exercer pressão contra o desenvolvimento nuclear do Irão.15

As relações militares permaneceram tensas. Os navios governamentais chineses confrontaram e assediaram navios militares de vigilância americanos que patrulhavam as águas internacionais reivindicadas pela China como zona especial no Mar da China Meridional. A China bloqueou trocas militares durante meses por causa de uma transferência de armas dos EUA para o Taiwan no final do governo Bush. Novas trocas militares em 2009 foram recebidas com fortes advertências chinesas contra a venda de armas dos Estados Unidos ao Taiwan.16

Neste contexto, as expectativas quanto às relações entre os EUA e a China eram cautelosas. Os intercâmbios oficiais entre os EUA e a China caracterizaram-se por uma grande desconfiança mútua, e houve várias manifestações não-governamentais de repúdio, especialmente no lado americano. A comunicação social americana criticou duramente a “fraqueza” do presidente Obama em questões de direitos humanos, trocas comerciais e outras matérias sensíveis aos americanos por ocasião da sua visita à China em Novembro. A grande maioria dos americanos não se deixou impressionar com as alegadas vantagens do envolvimento com a China e continuou a não aprovar as medidas adoptadas pelo governo chinês, encarando a China como uma ameaça crescente aos Estados Unidos.17

Apesar de importantes, as disputas e diferenças nas relações EUA-China em 2009 não foram suficientes para perturbar significativamente o modelo duradouro de decisão pragmática por parte dos líderes chineses e norte-americanos, que se mostraram decididos em manter um envolvimento contínuo entre os dois países.

A administração Obama continuou a preocupar-se com um vasto leque de questões importantes da política externa e doméstica. Neste contexto, uma disputa significativa com a China era das últimas coisas que o governo dos EUA, preocupado com outros assuntos, pretendia. Pelo contrário, havia um forte incentivo em prosseguir nem que fosse um simulacro de cooperação e evitar conflitos com a China.

O governo do presidente Hu Jintao definiu os objectivos de uma política central interna e externa para a década seguinte centrada na China, que promovia a continuação da situação internacional em geral, encarada como vantajosa para a China, a fim de permitir a modernização rápida da China. As vantagens que se poderiam colher neste período, entendido como uma “oportunidade estratégica” nos assuntos internacionais, parecia exigir que as relações EUA-China continuassem a mover-se numa direcção positiva.18 A administração Hu Jintao envidou esforços na promoção de relações comerciais e construtivas com o governo de George W. Bush. Em 2009, o governo chinês garantiu que as suas iniciativas e interferências não perturbariam seriamente as vantagens que advinham para a China em manter, de forma geral, as suas relações positivas com os Estados Unidos.

15Mark Landler, “Clinton warns China on Iran Sanctions,” New York Times 29 de Janeiro de 2010 www.nytimes.com (consultado em 23 de Fevereiro de 2010.

16Chris Buckley, “China PLA officers urge economic punch against US,” Reuters 9 de Fevereiro de 2010 www.reuters.com (consultado em 12 de Fevereiro de 2010)

17Glaser, “Obama-Hu Summit.”

18David Michael Lampton, The Three Faces of Chinese Power Berkely CA: University of California Press, 32- 36.

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Assim, as investidas chinesas contra a vigilância militar dos EUA no Mar da China Meridional diminuíram. Apesar das críticas e ameaças públicas, os investimentos chineses em títulos dos EUA continuaram, e a dependência chinesa no dólar americano manteve-se. Embora as autoridades chinesas tivessem previsto que a China se apoiasse nos consumidores chineses para impulsionar o crescimento económico, os empresários chineses pareciam determinados em manter e expandir a sua quota no revitalizado mercado americano. A China também concordou, a vários níveis, com os argumentos dos EUA sobre a Coreia do Norte, Irão e alterações climáticas, e retomou contactos militares no activo que haviam sido cortados devido à venda de armamento ao Taiwan por parte dos Estados Unidos em 2008.19

Início de 2010

Infelizmente para aqueles que procuram reforçar a imagem positiva de cooperação e envolvimento entre as duas potências mundiais, o início de 2010 foi marcado por desavenças. Fevereiro foi um mês particularmente mau. As autoridades chinesas e os comentários oficiais tomaram a iniciativa incomum de aumentar as críticas e ameaças contra os EUA perante notícias dos planos de venda de armas ao Taiwan. O governo chinês sabia que as vendas eram esperadas e que provavelmente tinham sido adiadas para evitar polémicas antes da visita do presidente Obama à China, em Novembro de 2009. No entanto, no início de 2010 a comunicação social chinesa estava repleta de avisos contra a venda. Quando o pacote de vendas de sistemas de armamento americano, no valor de 6,4 bilhões de dólares, foi publicamente anunciado no início de Fevereiro, a reacção chinesa foi publicamente forte. As medidas concretas de retaliação incluíam travar algumas negociações em matéria de defesa, ameaças de represália contra empresas dos EUA que vendiam equipamento militar ao Taiwan, e advertências que a China colaboraria menos com as autoridades dos EUA em importantes questões internacionais, como as suspeitas em torno do programa de armas nucleares do Irão.20

O governo Obama não escondeu o facto de, em deferência para com a China e devido à preocupação com a viagem do presidente a Pequim em Novembro, tinha adiado o encontro do presidente com o Dalai Lama para não ter que se reunir com o líder tibetano aquando da visita deste último a Washington em Outubro de 2009. Assim, quando a notícia da nova data do encontro entre Obama e o Dalai Lama foi anunciada em Fevereiro de 2010, as autoridades chinesas e a comunicação social mais uma vez pareceram intimidar os americanos, advertindo contra a reunião e respectivas consequências para as relações EUA-China.21

O endurecimento da atitude da China — posições opostas

Na sequência da por vezes interacção hostil sino-americana na cimeira internacional sobre alterações climáticas em Copenhaga, e do reduzido êxito dos Estados Unidos em obter um maior apoio da China aos objectivos internacionais fundamentais americanos

19Veja-se as análises trimestrais das relações entre os EUA e a China in Comparative Connections www.csis.org/pacfor

20Alan Romberg, “Beijing’s Hard Line against US Arms Sales to Taiwan,” PACNET Newsletter #4 3 de Fevereiro de 2010 www.csis.org/pacfor

21“China warns against Obama-Dalai Lama meeting,” Reuters 3 de Fevereiro de 2010 www.reuters.com (consultado em 23 de Fevereiro de 2010).

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em matéria de alterações climáticas, programa nuclear do Irão, e assuntos internacionais relacionadas com a questão cambial e o comércio, a posição pública endurecida da China despoletou uma série de especulações por parte de observadores da comunicação social e especialistas em assuntos internacionais nos Estados Unidos, China, e outros pontos da Ásia e do Ocidente. Apesar de frequentemente se esgrimirem posições e pontos de vista muito variados, o debate gerou-se entre dois grupos principais.

O grupo mais proeminente alertou para um real ou eventual ponto de viragem na relação entre a China e os EUA.22 Os especialistas e analistas da comunicação social que faziam parte deste grupo tendiam a ver a China em ascensão como tendo alcançado maior poder e influência nos assuntos mundiais, e que este crescimento faria com que a China exercesse pressão sobre os Estados Unidos para que fizesse concessões em questões chave da disputa de longa data, como o Taiwan e Tibete. A "confiança" e "agressividade" acrescidas da China fazia igualmente com que Pequim tomasse posições duras nas disputas com os Estados Unidos sobre questões cambiais e comerciais, práticas de direitos humanos e ciberataques, e a cooperar menos com os esforços internacionais apoiados pelos EUA relativamente ao Irão, Coreia do Norte e alterações climáticas. Alguns viam a China a assumir a liderança e a definir a agenda nas relações EUA-China, e os Estados Unidos a adoptarem uma posição mais fraca e reactiva.23 Para esses analistas americanos, assim como para outros na Ásia e no Ocidente, era normal defenderem uma postura mais dura por parte dos Estados Unidos frente à China, o que se designou por “empurrão para trás” (push-back) americano para conter a assertividade Chinesa.24 Contudo, alguns dos especialistas no grupo defendiam que o governo Obama, com tanto assunto com que se preocupar, não estava à altura da tarefa de gerir a nova assertividade chinesa, e previram uma mudança na dinâmica do poder internacional em assuntos asiáticos e mundiais em detrimento dos Estados Unidos e a favor de uma liderança chinesa. 25

Os pontos específicos avançados por estes comentadores e especialistas incluíam o seguinte:

-A China emergiu da crise económica mundial de 2008-2009 mais forte que as outras grandes potências, incluindo os Estados Unidos, que ficou preso numa recuperação lenta e com desemprego elevado. No geral, os comentadores na China e no exterior encararam a economia como a principal causa para a mudança da liderança dos EUA a favor da China, que na sua opinião já estava amplamente em curso nos assuntos mundiais e asiáticos. De facto, alguns avançavam que o sistema económico internacional estava a atravessar uma mudança significativa que se afastava das normas e instituições ocidentais, aproximando-se de regimes internacionais onde a China desempenharia um papel cada vez mais significativo que se opunha à ordem liberal ocidental estimulada pelos Estados Unidos.

22David Shambaugh, “The Chinese tiger shows its claws,” Financial Times February 17, 2010 www.ft.com (consultado em 23 de Fevereiro de 2010).

23James Hoagland, “As Obama bets on Asia, regional players hedge,” Washington Post , 11 de Fevereiro de 2010 www.washingtonpost.com (consultado em 23 de Fevereiro de 2010)

24Kendra Marr, “W.H. takes tougher tone with China, “ Politico 16 de Fevereiro de 2010 www.politico.com (consultado em 23 de Fevereiro de 2010)

25Martin Jacques, “Crouching dragon, weakened eagle,” International Herald Tribune 16 de Fevereiro de 2010 www.iht.com (consultado em 23 de Fevereiro de 2010).

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Equilíbrio positivo nas relações China-EUA: duradouro ou não?

Robert Sutter

-Na sua visita à China em Novembro de 2009 e noutras formas de envolvimento EUA-China, o presidente Obama e a sua administração sublinharam a grande necessidade de cooperação entre os EUA e a China numa série de questões internacionais e bilaterais. A agenda política dos EUA salientava a necessidade do governo americano trabalhar em estreita colaboração com a China. Nestas circunstâncias, os especialistas chineses e estrangeiros indicaram que os líderes chineses se tinham apercebido que a América precisava mais da China do que a China precisava dos Estados Unidos. No passado, essa opinião foi entendida como estando por trás dos surtos de pressão chinesa sobre o governo dos EUA relativamente ao Taiwan e outros assuntos. No caso actual, o presidente Obama foi visto como “fraco” e a necessitar de ir ao encontro dos desejos da China, que agora se encontrava em posição de poder fazer maiores exigências e satisfazer menos as do seu parceiro americano.

-Uma linha de análise neste grupo afirmou que o incentivo que levou os altos dirigentes chineses a adoptarem políticas mais duras e menos cooperantes com os Estados Unidos tinha menos a ver com a sua confiança nos assuntos internacionais e mais a ver com as suas preocupações sobre a gestão das pressões domésticas chinesas. As elites chinesas e a opinião pública foram, alegadamente, influenciadas pelos comentários internacionais e chineses que destacaram a ascensão da China na sua saída da crise económica, enquanto os Estados Unidos ficavam para trás. Estes segmentos da opinião chinesa foram acompanhados pelas autoridades militares e económicas chinesas, assim com outros intervenientes no crescente perfil internacional da China, que não estavam associados à abordagem geralmente mais experiente e profissional conduzida pelos responsáveis pela diplomacia externa chinesa profissional. As forças domésticas, militares e outras autoridades juntaram- se à opinião pública e à da elite na pressão por uma maior atenção para com os interesses chineses e maior resistência às exigências ou pressões exercidas pelos Estados Unidos. A fim de preservar a estabilidade interna e a continuidade serena do governo do Partido Comunista Chinês, a posição assumida por Hu Jintao e outros líderes foi interpretada como não tendo grande escolha senão aceitar as exigências das forças internas a favor de uma posição mais dura contra os EUA.26

O segundo grupo de observadores chineses e internacionais assumiu uma posição muito menos proeminente do que o grupo de comentadores referido acima no início de 2010. Os comentadores e especialistas do segundo grupo reconheceram devidamente a atitude pública mais assertiva da China em relação ao Taiwan e ao Tibete. A reduzida cooperação da China com os Estados Unidos em assuntos que iam desde a questão cambial e comércio até às alterações climáticas e ao programa nuclear do Irão foi igualmente notada. Estes observadores previam um ano difícil para as relações sino- americanas, sobretudo porque o governo Obama estava sob pressão das forças económicas e políticas domésticas a favor de uma atitude mais firme por parte dos Estados Unidos contra a China em assuntos relacionados com direitos internacionais, disputas comerciais e o Irão. Contudo, estes especialistas e comentadores viam maior continuidade do que mudança nas relações sino-americanas.27 Discordavam da ideia

26Edward Wong, “Rift grows as US and China seek differing goals,” New York Times 20 de Fevereiro de 2010 www.nytimes.com (consultado em 23 de Fevereiro de 2010).

27Minxin Pei, “The Tension is overstated,” International Herald Tribune February 16, 2010 www.iht.com (consultado em 23 de Fevereiro de 2010); Elizabeth Economy, “The US and China Have at it Again; but

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que a China tivesse atingido um ponto em que se sentisse preparada para confrontar a América em assuntos chave, e que estivesse disposta a colocar em risco uma deterioração substancial das relações sino-americanas. Alguns destes analistas encaravam a pressão chinesa relativamente ao Taiwan e ao Tibete como “ensaios” ou “testes” à determinação americana, semelhantes aos testes que a China aparentava ter conduzido no Mar da China Meridional em 2009 e às ameaças que fez nesse ano de se afastar substancialmente do dólar americano e de desviar o centro da atenção das exportações chinesas do mercado americano. Como foi já referido, a interpretação para o facto de a China ter desistido dessas iniciativas em 2009 foi o ter constatado que as consequências prejudicariam os interesses chineses na sua generalidade.28

Entre as razões específicas a favor da continuidade dos esforços chineses para evitar um conflito substancial e manter o envolvimento positivo com os Estados Unidos destacam-se as seguintes:

-A dependência da China da economia dos Estados Unidos e a sua dependência da ordem internacional liderada pelos EUA continuava a ser enorme. A capacidade de uns Estados Unidos irritados de complicar e prejudicar os interesses chineses na manutenção da “oportunidade estratégica” fornecida por um ambiente internacional vantajoso nas primeiras duas décadas do século XXI continuava a ser igualmente enorme.

-Na década anterior, a China tinha sido obrigada a inverter a sua forte oposição ao hegemonismo dos Estados Unidos em prol de uma política que oferecesse garantias aos EUA e associados que a ascensão da China seria pacífica. Fê-lo em grande parte para evitar que os EUA reagissem e impedissem o crescimento da China, complicando a sua ascensão, de forma a conduzir ao fim do regime do Partido Comunista Chinês.29 A inversão dessa abordagem política teria sido uma medida muito difícil de adoptar pela administração Hu Jintao nos seus últimos anos, que se concentrava numa transição harmoniosa de uma geração de liderança para a seguinte. Dessa forma, o incentivo para a administração Hu Jintao manter as geralmente positivas relações sino-americanas for reforçado pela sucessão geracional de liderança que se aproximava e terá lugar no 18º Congresso do Partido Comunista Chinês em 2012. Os preparativos para este evento decenal envolvem amplas negociações de bastidores sobre política, poder e nomeações que se conduzem melhor num ambiente em que os líderes chineses não são perturbados por assuntos controversos sérios, para além dos muitos com que têm que lidar em casa e no exterior, nomeadamente as relações sino-americanas.

-Se a China decidisse confrontar os Estados Unidos, provavelmente optaria pelo padrão utilizado anteriormente para lidar com iniciativas internacionais contra adversários reais ou em potência. Este padrão envolve o recurso a tácticas de “frente unida”, através das quais a China se mostra sensibilizada e procura estreitar laços com outras potências à medida que se prepara para confrontar o adversário, o “alvo” principal. Contudo, as condições existentes nas relações diplomáticas

it’s much ado about nothing,” http://blogs.cfr.org 2 de Fevereiro de 2010 (consultado em 12 de Fevereiro de 2010).

28Estes pontos e os referidos nos parágrafos assinalados por marcadores beneficiaram das trocas de impressões e reuniões extra-oficiais que o autor manteve com vinte e quatro especialistas americanos e cinco altos funcionários chineses em Washington DC em Fevereiro de 2010.

29Lampton, Three Faces of Chinese Power 32-34; Robert Sutter, Chinese Foreign Relations: Power and

Policy since the Cold War (segunda edição) Lanham, MD: Rowman and Littlefield, 2010, p. 10.

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chinesas indicavam que a China não mantinha relações particularmente favoráveis com muitos centros mundiais de poder caso optasse por enfrentar os Estados Unidos em 2010. Os laços com a Índia, Japão, Europa Ocidental, Coreia do Sul, Austrália e, discutivelmente, a Rússia, eram muito variáveis e por vezes conturbados. À excepção de com o Japão, as relações eram mais problemáticas e menos assentes na cooperação do que tinham sido na década anterior.

Eventos posteriores - equilíbrio positivo sustentado

Os eventos que tiveram lugar no final de 2010 não resolveram o debate entre os comentadores que viam uma China assertiva disposta a pressionar os Estados Unidos relativamente às diferenças existentes, e os comentadores que pensavam que os líderes americanos e chineses viam os seus interesses como estando bem servidos através de políticas e práticas que evitavam o conflito e mantinham um equilíbrio positivo nas relações entre a China e os Estados Unidos. Contudo, os ziguezagues na atitude chinesa de desafio às políticas e acções americanas pareciam ter limites. Os altos dirigentes chineses expressaram claramente a sua preocupação em manter e desenvolver o equilíbrio positivo nas relações sino-americanas, nomeadamente dando início aos preparativos da visita oficial do presidente HU aos Estados Unidos no início de 2011.30

Os americanos ficaram decepcionados com a recusa da China em condenar a Coreia do Norte pelo afundamento de um navio de guerra sul-coreano, o Choenan, que causou a morte a 46 marinheiros sul-coreanos. A Coreia do Sul, apoiada pelos Estados Unidos, procurou punir a Coreia do Norte através de medidas que não chegassem a assumir contornos de violência, nomeadamente através das Nações Unidas. A China assegurou que a Coreia do Norte não se tornaria oficialmente o alvo das medidas da ONU. A Coreia do Sul e os Estados Unidos anunciaram manobras militares nos mares de cada lado da península. Pela primeira vez na memória recente, a China opôs-se publicamente às manobras no Mar Amarelo como constituindo uma ameaça à China. Os protestos chineses tornaram-se o foco de comentários incisivos nos meios de comunicação oficiais e não oficiais chineses durante várias semanas. A opinião chinesa opunha-se particularmente ao envolvimento do porta-aviões americano posicionado no Japão, o George Washington, nas manobras no Mar Amarelo.

Enquanto isso, as autoridades chinesas expandiam e refinavam em privado e publicamente a sua preocupação mais recente em apoiar os “seus interesses fundamentais” de forma a incluir reivindicações mais abrangentes, onde se incluíam grupos de ilhas situadas no Mar da China Meridional igualmente reclamadas por outros estados. As supostamente pretensões inflexíveis que envolviam os interesses “fundamentais” da China abrangiam afirmações unilaterais chinesas e tentativas de regulamentação de vigilância militar, pescas, prospecção de petróleo e outros direitos até então utilizados nos Estados Unidos e países vizinhos do Sudeste Asiático, entre outros.31

30Bonnie Glaser, “U.S.-Chinese Relations,” Comparative Connections 12:3 (Outubro de 2010) www.csis.org/pacfor.

31“China-Southeast Asia Relations,” Comparative Connections 12:3 (Outubro de 2010) www.csis.org/pacfor

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A China colocou-se na defensiva ao reagir às intervenções, incluindo uma declaração notável pela secretária de Estado dos EUA Hillary Clinton, no encontro anual do Fórum Regional da ASEAN (ARF) em Hanói em 23 de Julho de 2010 sobre as tensões recentes no Mar da China Meridional. O Ministro dos Negócios Estrangeiros da China interpretou a intervenção dos EUA como um ataque à China. A reunião da ARF também assistiu a um novo compromisso por parte da presidência dos EUA, apoiado pelo ASEAN, de participar activamente na Cimeira do Leste Asiático, elevando o perfil daquele órgão regional acima da preferência da China por grupos regionais exclusivamente asiáticos.

Os avanços importantes nas relações militares, entre outras, dos EUA com o Vietname, expostos durante as celebrações de um aniversário EUA-Vietename em Agosto, e que envolviam manobras com um porta-aviões dos Estados Unidos posicionado perto das regiões disputadas no Mar da China Meridional vieram complicar ainda mais as previsões regionais da China. O porta-aviões George Washington era o mesmo navio cuja sua participação nas manobras da Coreia do Sul e dos EUA no Mar Amarelo a imprensa chinesa havia colocado severas objecções. O contingente de navios americanos incluía um torpedeiro avançado que tinha entrado no porto vietnamita de Danang e que tinha um nome simbólico importante, The John McCain.

Há muito que a China adoptara uma abordagem regional baseada no crescimento do comércio, noutros contactos económicos e na diplomacia bilateral e multilateral destinada a tranquilizar os vizinhos do Sudeste Asiático e o respectivo agrupamento regional, a Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN). À medida que as disputas no Mar da China Meridional com países regionais e os Estados Unidos ganharam relevo nos últimos anos, a China tornou-se mais assertiva na defesa das suas pretensões. Destacam-se a adaptação de navios militares para levar a cabo proibições unilaterais de pesca, a exibição da força das três frotas navais chinesas em exibições de poder na região, e a afirmação que as pretensões chinesas às ilhas, águas e recursos do Mar da China Meridional representavam um “interesse vital” para a China que não tolerava qualquer tipo de compromisso.

As autoridades chinesas e comentários na comunicação social chinesa começaram por se opor à intervenção dos EUA na reunião do ARF, e a outras iniciativas da política norte-americana no sudeste da Ásia, com ataques dirigidos aos Estados Unidos pelas suas supostas intenções de servir os seus próprios interesses e intenções desestabilizadoras.

Esses ataques foram efectuados juntamente com outros ataques públicos por parte da China contra as manobras militares que se realizavam em simultâneo com as forças sul-coreanas em retaliação ao afundamento do navio de guerra sul-coreano Cheonan pela Coreia do Norte.

Posteriormente, algumas das opiniões chinesas desviaram-se da dura abordagem pública contra os Estados Unidos. A crítica dos EUA e de outros países relativamente às disputas no Mar da China Meridional e outros assuntos diminuíram. Pelo menos momentaneamente, parecia que a China continuaria a afirmar publicamente a necessidade de manter os laços comerciais e uma diplomacia tranquilizadora no Sudeste Asiático, ao mesmo tempo que defendia as suas pretensões territoriais e continuava a construir as suas capacidades militares.

Em suma, a China parecia não estar preparada para permitir que as disputas com os Estados Unidos sobre o Mar da China Meridional, Mar Amarelo, e assuntos afins

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aumentassem de forma a poder prejudicar gravemente as relações EUA-China. O presidente Hu Jintao e outros líderes chineses fizeram um grande esforço em receber enviados dos EUA de posição inferior, e transmitiram uma forte mensagem pública de confiança de que a China iria manter um envolvimento positivo com os Estados Unidos.

Como exemplo dos limites à assertividade chinesa perante os interesses dos Estados Unidos, destaca-se a atitude de altos dirigentes militares chineses ao inverterem críticas recentes, dando a entender aos dirigentes americanos e mundiais que a China procurava retomar trocas militares com os Estados Unidos. Ainda mais importante, o Presidente Hu iniciou preparativos para uma importante visita oficial a Washington no início de 2011.

Bibliografia

Goldstein, Avery (2005). Rising to the Challenge: China’s Grand Strategy and

International Security. Stanford, Calif.: Stanford University Press.

Lampton, David Michael (2008). The Three Faces of Chinese Power Berkeley CA: University of California Press.

Shirk, Susan (2007). China: Fragile Superpower. New York: Oxford University Press.

Sutter, Robert (2010). U.S.-Chinese Relations: Perilous Past, Pragmatic Present

Lanham, Md.: Rowman and Littlefield.

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