difundindo como modelando e flexibilizando os processos culturais. O elo entre a
determinação de espaços de soberania, as modalidades de circulação da informação e a
sua difusão por um dispositivo de tecnologias apropriadas permite recontextualizar o
Estado-nação e reequacionar a questão da soberania.
A globalização tem, pois, dois efeitos muito precisos: em primeiro lugar, no quadro
geopolítico, o Estado-nação enquanto referente estável tinha uma importância muito
vincada que conferia aos membros da sociedade o seu ponto de ancoragem privilegiado.
O discurso sobre a nação opunha dicotomicamente semelhança e diferença, pertença e
exclusão, que era próprio da cultura moderna (Anderson, 1991). Um contexto onde os
processos de indução identitária se produziam no âmbito de uma dinâmica permanente
de oposição entre o «nós» e «eles», entre o interior e o exterior. Ora, as migrações, por
um lado, e os fluxos mediáticos pelo outro abalaram este quadro outrora dominante. As
condições da modernidade tardia têm colocado dificuldades ao pensamento binário,
criando nos Estados-nações cenários que Anderson (1991) definiu como a «crise do
hífen», sendo hoje difícil a muitos Estados equacionarem-se como nações unitárias.
Em segundo lugar, num mundo marcado pelo «poder da imaginação», Appadurai (1996)
não deixa de por a questão da relação entre o local e o global. Numa certa medida, o
autor reage à visão pessimista segundo a qual a globalização significa a longo prazo a
desaparição das especificidades culturais próprias do mundo territorializado de outrora.
O “fim dos territórios” estaria associado à crise que abala os Estados cujas soberanias
são postas em causa com a proliferação dos fluxos económicos e a constituição de novos
conjuntos transnacionais. A globalização marcaria, então, em grande medida o declínio
de uma civilização onde a transmissão e a tradição jogavam um papel preponderante, e
onde o sujeito se definia a partir de uma localidade, região e nação.
A proliferação de grupos desterritorializados, a diversidade das diásporas observadas um
pouco por todo o lado, tem por efeito a criação de novas solidariedades translocais
(Appadurai, 1996). Vimos emergir construções identitárias que ultrapassam o quadro
nacional. As políticas estatais contribuem à sua maneira para manter esta situação e
provocar movimentos migratórios. Appadurai (1996) insiste na grande heterogeneidade
destas formas de circulação. Os refugiados, os trabalhadores especializados de empresas
e organizações internacionais, os turistas, os estudantes, representam tipos muito
diferentes de migrantes e constituem à sua maneira uma «transnação» deslocalizada.
Nestas condições, estaremos doravante a entrar na era do pós-nacional? As novas formas
de organização que desempenham um papel político de primeiro plano em domínios tão
diversos como o ambiente, a economia, e as relações humanitárias, apresentam uma
fluidez, uma flexibilidade que contrasta com as estruturas rígidas dos aparelhos estatais
tradicionais. A afirmação das cidades na governança global, as organizações não-
governamentais (ONG) que se desenvolvem, muitas vezes em ligação com situações de
crise, são bem representativas de um novo modelo político mais directamente ancorado
na sociedade civil que transcende claramente as fronteiras nacionais. A
transnacionalidade que caracteriza cada vez mais o universo mundializado impõe novas
solidariedades em rede e modos de acção mais flexíveis. Assim, podemos interpretar as
soberanias pós-nacionais emergentes, e a própria ideia de patriotismo não perde de todo
valor na medida em que faz sentido que falemos de um patriotismo «móvel plural e
contextual». Esta é mais uma noção que defronta as concepções clássicas de Estado-
nação que não admitem que possam existir formas móveis de soberania às quais
corresponde um novo tipo de compromisso dentro do qual a acção cívica e política faz