OBSERVARE
Universidade Autónoma de Lisboa
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 7, Nº. 1 (Maio-Outubro 2016)
NOTA INTRODUTÓRIA
Este número temático da Janus.net é dedicado à Gestão e Resolução de Conflitos e
insere-se no âmbito mais geral de um projeto sobre esta temática, em curso no
Observare. Pretendemos com esta iniciativa contribuir para o estudo da Gestão e
Resolução de Conflitos de uma forma sistetica e articulada, plenamente convictos da
sua importância e da necessidade da Academia em Portugal lhe dedicar uma maior
atenção. O Observare está de parabéns pela coragem em promover esta iniciativa.
Os conflitos do século XX/XXI revelaram uma capacidade muito especial para ameaçar
a estabilidade e a paz à escala global. A sua complexidade não se pode compadecer
com abordagens simplistas. Este número especial procura dar um contributo para a
reflexão sobre estes temas, tanto no domínio teórico como prático, cientes de que os
esforços para inibir o potencial de agressão organizada dos/nos Estados ou, pelo
menos, reduzi-lo significativamente requer uma análise aturada.
Este exercício será efetuado adotando uma abordagem construtiva dos conflitos,
através da qual se procura minimizar a violência, ultrapassar o antagonismo entre
adversários, persuadi-los a aceitar as soluções políticas propostas, e fazer com que
aquelas produzem resultados estáveis e duradouros.
Ao ser a Gestão e Resolução de Conflitos um domínio deveras complexo, com muitas
interdependências procurámos neste trabalho explorar a convergência e
complementaridade de saberes entre a Resolução de Conflitos e as Relações
Internacionais, as quais têm levado académicos e praticantes de estas disciplinas a
construir elos de comunicação entre ambas as comunidades.
Especificamente este número temático apresenta um conjunto de abordagens à Gestão
e Resolução de Conflitos intra-estado com base em métodos não-violentos e violentos
utilizados em períodos de guerra, paz negativa e transição para uma paz positiva.
O artigo do Gilberto Oliveira apresenta o pacifismo pragmático conceptualizando-o no
seu aspecto estratégico-pragmático da ação não violenta distinto de outras abordagens
não-violentas pela sua agência não institucional e pela sua “ação direta” como
mecanismo de pressão e resistência. O pragmatismo é baseado no facto de que o
poder político e as hierarquias dependem, em última análise, do consentimento e
cooperação. Através da ação não violenta é possível negar ou bloquear essa fonte de
poder e assim fortalecer o poder dos grupos que resistem. A estratégia é um requisito
das ações não violentas de protesto, persuao, não-cooperação ou intervenção não-
violenta de forma a poderem ser bem-sucedidas. Apesar de ser umtodo mais
frequente em períodos de paz negativa, como, por exemplo, na recente “Primavera
Árabe”, também é utilizado em períodos de guerra como foi o caso na década de 90
nas guerras na região dos Balcãs ou da ação de massas das mulheres da Libéria pela
paz (Women of Liberia Mass Action for Peace) em 2003.
O artigo do Alexandre de Sousa Carvalho problematiza as soluções institucionais de
partilha de poder como forma de evitar a violência, frequentemente aplicadas em
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 7, Nº. 1 (Maio-Outubro 2016), pp. 1-2
Nota introdutória
Carlos Branco e Ricardo de Sousa
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sociedades multi-étnicas. Estando intimamente relacionado com a teoria da paz
democrática como forma de evitar jogos de soma nula, é também encontrada como
solução governativa em estados autocráticos. No entanto, a frequente utilização de
modelos de partilha de poder como mecanismos de resolução de conflitos, em período
pós-eleitoral ou de escalada no conflito, coloca questões específicas de poder que
podem minar o modelo democrático.
O artigo de António Oliveira debruça-se sobre a transformação dos objetivos de
resolução de conflito com recurso ao uso da força, de uma intervenção exclusivamente
militar na guerra para uma intervenção que também compreenda a segurança social,
civil e policial. No contexto de intervenções cada vez mais complexas e
multidimensionais, o artigo problematiza os princípios para o uso da força, seus
desafios e efetividade.
O artigo da Madalena Moita foca-se na evolução do conceito de paz nas Nações Unidas
onde juntamente com o conceito de manutenção de paz é adoptado o conceito de
construção de paz, no espírito do conceito de paz positiva de Galtung. Através de uma
análise das intervenções das Nações Unidas na Guatemala e Haiti constata que o
conceito de paz positiva não foi conseguido e como os processos de avaliação utilizados
nas Nações Unidas devem-se focar não em resultados, mas também nos processos
através dos quais os mandatos são implementados.
O artigo do Ricardo Sousa procura identificar os mecanismos na génese da transição da
paz negativa para a guerra civil como forma de melhor identificar formas de resolução
de conflito. O artigo testa o modelo de “ganância” e “reivindicações” juntamente com o
papel da liderança e interveões externas, em quatro períodos de iniciação ou
intensificação do conflito em Angola entre 1961 e 2002. Os resultados sugerem como
factores mais salientes as intervenções externas durante a Guerra Fria e a “ganância”
económica (associada ao petleo, diamantes, pobreza e capital de guerra) e liderança
no pós-Guerra Fria. O estudo de caso identifica também como “ganância” e
“reclamações” podem estar interligadas e não serem mecanismos independentes.
O número inclui também notas e reflexões de José Milhazes sobre o encontro de
Francisco I e Kirill I a 12 de Fevereiro de 2016, chefe da Igreja Católica e da Igreja
Ortodoxa respectivamente. O encontro é enquadrado nos seus aspectos políticos, mas
também de reflexão sobre o papel das duas Igrejas na “guerra entre cristãos” na
Ucrânia.
Carlos Branco e Ricardo de Sousa
Como citar esta Nota
Branco, Carlos; Sousa, Ricardo (2016). "Nota introdutória", JANUS.NET e-journal of International
Relations, Vol. 7, Nº. 1, Maio-Outubro 2016. Consultado [online] em data da última consulta,
observare.ual.pt/janus.net/pt_vol7_n1_notint (http://hdl.handle.net/11144/2618)