OBSERVARE
Universidade Autónoma de Lisboa
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 10, Nº. 2 (Novembro 2019-Abril 2020), pp. 35-55
A INFLUÊNCIA DAS ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS NA ESCALADA DO CONFLITO
COMUNAL ENTRE PASTORES E AGRICULTORES:
O CASO DA ETNIA FULANI NA NIGÉRIA
Gustavo Furini
gustavofurini@gmail.com
Aluno de doutoramento em Relações Internacionais: Geopolítica e Geoeconomia, Universidade
Autónoma de Lisboa (Portugal). Mestre em Gestão de Recursos Naturais e Desenvolvimento Local
na Amazônia pela UFPA (Brasil) e bacharelado em Geografia pela UFRGS (Brasil). Atua na área
de alterações climáticas desde 2005, com experiência no setor público e privado.
Resumo
As atuais evidências científicas permitem comprovar que as atividades humanas estão a
causar interferência, em diferentes níveis, no clima global e na disponibilidade dos recursos
naturais, sendo que muitos autores já relacionam à escassez de água com o aumento do risco
de conflitos violentos, particularmente em sociedades rurais no continente africano. As
perturbações no clima causadas pelas alterações climáticas refletem-se em escala regional e
local, sendo que os maiores impactos estão a ser sentidos nas zonas mais pobres do
planeta. A Nigéria, país mais populoso da África, vem enfrentando problemas de ordem
ambiental em seu território que podem ser associados às mudanças climáticas, como por
exemplo, o aumento da temperatura, a diminuição das chuvas e o avanço da desertificação.
Considerando que todos estes fenômenos estão se intensificando desde o início do século XX
na Nigéria e, em função da escalada de conflitos violentos a partir do início do corrente século,
a presente proposta teve como objetivo analisar de que forma as alterações climáticas podem
interferir no conflito entre pastores e agricultores, bem como, o possível impacto da variação
sazonal do regime de chuvas na dinâmica destes conflitos comunais. O estudo concentrou-se
na revisão da literatura e o estudo de caso ocorreu em quatro estados nigerianos (Plateau,
Benue, Taraba e Nasarawa), para o período 2010-2017, tendo como foco o conflito comunal
envolvendo o grupo étnico Fulani. O método de abordagem adotado foi o indutivo em que se
comparou o comportamento da pluviosidade na área de estudo com o número de mortes
decorrentes do conflito, para mais, fez-se uso de software de geoprocessamento para
compreender a distribuição espacial e temporal das fatalidades. O quadro teórico utilizado foi
o proposto por Thomas Homer-Dixon (1994) e a recolha da informação deu-se a partir de
fontes primárias, com consulta de dados qualitativos e quantitativos, e a partir de fontes
secundárias mediante revisão em livros, publicações e periódicos em revistas científicas.
Embora não haja até o momento elementos suficientes para estabelecer uma relação direta
e linear entre alterações climáticas e conflitos violentos, a literatura revisada indica que as
mudanças climáticas têm impactado negativamente na disponibilidade de recursos naturais,
como no caso de água e pastagens, o que tem aumentado a competição pelo acesso dos
mesmos em determinadas porções da Nigéria. A análise dos dados aponta que na área de
estudo 46,4% mais mortes no período seco (Nov-Abr) do que no período chuvoso (Mai-
Out) em conflitos comunais envolvendo a etnia Fulani, o que pode sugerir maior competição
por água e pastagens.
Palavras-chave
Alterações climáticas; conflito comunal; Nigéria; Fulani; água
Como citar este artigo
Furini, Gustavo (2019). "A influência das alterações climáticas na escalada do conflito comunal
entre pastores e agricultores: o caso da etnia Fulani na Nigéria". JANUS.NET e-journal of
International Relations, Vol. 10, N.º 2, Novembro 2019-Abril 2020. Consultado [online] em
data da última consulta, https://doi.org/10.26619/1647-7251.10.2.3
Artigo recebido em 29 de Novembro de 2018 e aceite para publicação em 4 de Junho de 2019
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 10, Nº. 2 (Novembro 2019-Abril 2020), pp. 35-55
A influência das alterações climáticas na escalada do conflito comunal entre pastores e agricultores:
o caso da etnia Fulani na Nigéria
Gustavo Furini
36
A INFLUÊNCIA DAS ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS NA ESCALADA DO CONFLITO
COMUNAL ENTRE PASTORES E AGRICULTORES:
O CASO DA ETNIA FULANI NA NIGÉRIA
1
Gustavo Furini
Introdução
Com o final da Guerra Fria a definição do conceito de segurança passou a ter um
entendimento mais alargado, sendo incorporadas novas dimensões que ultrapassaram o
viés exclusivamente estatal (Tomé, 2010). Para além das questões militares, fatores
sociais, econômicos, e ambientais passaram a incorporar o rol de elementos necessários
para garantir a paz e a segurança no mundo a partir da década de 1990 (Dannreuther,
2013; Sheehan, 2005; UNSC, 1992). Nesse contexto de ampliação sobre a compreensão
de segurança, os desafios impostos pela escassez de recursos naturais
2
também
passaram a ser considerados (Homer-Dixon, 1994), tendo em vista o reconhecimento
que as tensões geradas em torno do acesso e uso de recursos naturais têm a capacidade
de desencadear conflitos violentos
3
entre diferentes atores e grupos, sobretudo em escala
intraestatal (Conca & Wallace, 2012).
Os desafios gerados pelos riscos
4
ambientais decorrem, sobretudo, do mau uso que a
sociedade tem feito dos recursos naturais, o que acabou por gerar problemas como o
esgotamento dos solos agricultáveis, a irreversível perda de biodiversidade, a poluição
do solo, das águas e do ar (Dannreuther, 2013; Sheehan, 2005). Dentre os diversos
impactos negativos causados ao ambiente destacamos as alterações climáticas, que de
acordo com evidências científicas, resultam da constante e crescente emissão de gases
de efeito estufa para a atmosfera, especialmente em função da queima de combustíveis
fósseis (IPCC, 2013). As alterações climáticas têm a capacidade de incrementar as
1
Dossiê temático de artigos apresentados na 1ª Conferência Internacional de Resolução de Conflitos e
Estudos da Paz realizada na UAL a 29 e 30 de Novembro de 2018.
2
Os recursos naturais ou ambientais são estoques de materiais que existem no ambiente natural, renováveis
e não renováveis, que em função do uso podem ser considerados bens comuns ou possuir valor econômico
(WTO, 2010).
3
Aqui utiliza-se o entendimento de conflito violento fornecido pelo The African Centre for the Constructive
Resolution of Disputes (ACCORD, 2012), em que se faz uso da violência letal pelas partes envolvidas no
conflito a fim de se obter o recurso em disputa, como por exemplo, terras ou poder.
4
Os efeitos negativos das alterações climáticas são frequentemente referidos como “ameaça” à segurança,
entretanto, preferiu-se seguir o entendimento dado pelo SIPRI (2016) que considera as alterações
climáticas como “risco”, que a crise climática é consequência direta da ação antrópica. Ademais, os
desafios que se impõem à humanidade em função das transformações ambientais provocadas pelo Homem
ao longo do último par de séculos, como as alterações no clima, enquadram-se no entendimento de
“Sociedade de Risco” proposto por Ulrich Beck (2016). Segundo o autor, os processos de industrialização e
modernização da sociedade promoveram desequilíbrios ambientais, e as respostas criadas pelo ambiente
na busca por um novo momento de equilíbrio trouxeram consigo riscos para a dinâmica social em geral,
inclusive no que se refere a questões relacionadas à segurança (Beck, 2017).
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 10, Nº. 2 (Novembro 2019-Abril 2020), pp. 35-55
A influência das alterações climáticas na escalada do conflito comunal entre pastores e agricultores:
o caso da etnia Fulani na Nigéria
Gustavo Furini
37
disparidades sociais por meio do agravamento da pobreza, da fome, da mobilidade
humana forçada e da maior dificuldade em aceder aos recursos naturais, sobretudo nos
países em desenvolvimento, historicamente responsáveis pelas menores contribuições
de gases estufa, mas que em contrapartida, são os que apresentam maior grau de
vulnerabilidade às nuances do clima (IPPC, 2014).
As análises de dados coletados na atmosfera, terra e oceano confirmam que fenômenos
decorrentes das alterações no clima estão a ocorrer, em maior ou menor grau, em
todo o planeta, sendo associado a tais mudanças uma elevada ameaça para a
estabilidade social e econômica de sociedades (IPCC, 2013). Observações e estudos
indicam que a banda ocidental do Sahel, região que inclui a porção setentrional da Nigéria
vem, ao longo das últimas décadas, apresentando diminuição nos níveis de chuva com
períodos de seca mais longos e aumento da temperatura (Assibong et al., 2017). Esta
variabilidade hídrica impacta negativamente a disponibilidade de recursos para pessoas
que utilizam a terra como meio de subsistência, cenário agravado em função da crescente
pressão exercida pelo crescimento populacional na Nigéria
5
(Eze, 2018).
É crescente o mero de pesquisadores que examinam as possíveis relações entre
fatores climáticos e conflitos não estatais (FOI, 2010), pelo que uma convergência
que, em determinadas situações, a variação na disponibilidade de água em economias
dependentes do setor primário pode exercer influência em conflitos violentos,
particularmente em sociedades rurais e pastoris no continente africano (IPCC, 2013;
ACCORD, 2012). Diante disso, as alterações climáticas têm a capacidade de interferir,
mesmo que indiretamente, sobre a dinâmica de conflitos violentos, em especial os
intraestatais, vez que podem intensificar a pobreza e agravar crises econômicas, eventos
que estão bem documentados como fatores que influenciam diretamente os conflitos
(IPCC, 2014).
E é precisamente isto que está a ocorrer nas regiões centro-leste e norte da Nigéria,
locais em que é possível verificar uma redução gradual na disponibilidade de certos
recursos naturais, sobretudo água e terras agricultáveis, escassez que tem sido associada
aos registros de aumento da temperatura e menores índices de chuva (Idowu, 2017;
Okoli & Atelhe, 2014; CCASTR, 2011). Tal diminuição no acesso aos recursos naturais é
posto como uma das principais causas da escalada dos conflitos não estatais existentes
entre pastores e agricultores nas zonas centro-leste e norte do país (Uze, 2018; Freeman,
2017).
Neste quadro, o presente ensaio centrou-se em dois objetivos: i) inicialmente buscou-se
analisar, com base na teoria sobre o assunto, de que forma a crescente escassez de
recursos naturais, em especial a escassez de água, que segundo as observações
científicas tem sido agravada em função das alterações climáticas, se aplica aos conflitos
comunais envolvendo a etnia Fulani, sobretudo nas áreas rurais nas porções norte e
centro-leste da Nigéria; e num segundo momento ii) verificou-se de que forma a variação
sazonal na disponibilidade de água, analisada a partir de dados do índice pluviométrico
no período de chuva (Mai-Out) e no período de estiagem (Nov-Abr), de 2010 a 2017,
relaciona-se com a dinâmica de conflitos comunais envolvendo a etnia Fulani em quatro
5
De acordo com dados do Banco Mundial, a população total da Nigéria em 2018 estava estimada em cerca
de 196 milhões de habitantes. Disponível em: https://data.worldbank.org/country/nigeria. Acesso em
20/06/2019.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 10, Nº. 2 (Novembro 2019-Abril 2020), pp. 35-55
A influência das alterações climáticas na escalada do conflito comunal entre pastores e agricultores:
o caso da etnia Fulani na Nigéria
Gustavo Furini
38
estados nigerianos (Plateau, Benue, Taraba e Nasarawa) localizados na zona centro-leste
do país.
Após revisão da teoria, optou-se por realizar a abordagem proposta por Thomas Homer-
Dixon (1994), a qual associa a escassez ambiental com conflitos violentos, sobretudo os
de origem étnica em nível intraestatal. O trabalho foi realizado a partir da análise estudo
de caso com recolha da informação em fontes primárias (base de dados sobre conflitos
fornecidos pela UCDP
6
), e pela revisão de fontes secundárias (livros, publicações e
periódicos em revistas científicas).
À parte desta introdução, o ensaio conta com quatro secções. A primeira parte aborda a
inclusão dos fatores ambientais, especialmente as alterações climáticas, no
entendimento mais alargado de segurança no período pós-Guerra Fria. Na seção seguinte
é discutido o nexo entre alterações climáticas e conflitos violentos, pelo que se discute
como as alterações no clima podem afetar negativamente a disponibilidade de recursos
naturais, e estes, por sua vez, gerar ou agravar conflitos. Na terceira seção aborda-se o
conflito comunal na Nigéria entre agricultores e pastores da etnia Fulani, com vista a
identificar a influência das alterações climáticas neste conflito por meio da redução na
disponibilidade de recursos naturais, em especial a água. Na quarta parte deste trabalho
é apresentado o estudo de caso sobre a interferência do regime de chuvas nos ataques
violentos, com fatalidades, envolvendo a etnia Fulani em quatro estados nigerianos. No
final do documento, são apresentadas a conclusão e as referências utilizadas no ensaio.
1. A inclusão das alterações climáticas no entendimento de segurança
A temática ambiental está formalmente presente na agenda internacional desde finais
dos anos 1960 e início de 1970, período que culminou com a Conferência de Estocolmo
em 1972, contudo, naquela época as questões centrais sobre segurança eram
determinadas pela Guerra Fria (Sheehan, 2005). A noção de que a humanidade estava
a causar danos irreparáveis ao ambiente e o temor de uma catástrofe nuclear eram as
principais preocupações da agenda ambiental na altura (ibid.). Durante o período
compreendido pela Guerra Fria, as preocupações com segurança estavam diretamente
relacionadas à ação militar estatal e, deste modo, não havia espaço para discussão de
temas como a segurança ambiental (Dannreuther, 2013). Ademais, tal conceito clássico
de segurança voltado para a proteção do Estado perdurou por mais de três séculos, desde
a criação da noção de Estado Weberiano até o início da década de 1990 (FOI, 2010).
Contudo, as mudanças e os desafios de ordem global que emergiram no cenário
internacional no final do século passado trouxeram consigo a necessidade de incluir
temas como a economia, a demografia e o ambiente, para assim poder-se ter uma
melhor compreensão dos novos rumos de segurança (Mathews, 1989). O exclusivismo
do viés estadocêntrico que havia guiado as instituições de segurança até então não se
mostrava adequado para gerir os novos desafios que se apresentavam (ibid.). Assim, o
fim da Guerra Fria permitiu que interpretações para além daquelas que prezavam
somente a abordagem estatal pudessem despontar, o que possibilitou a elaboração de
um entendimento de segurança mais alargado (Tomé, 2010). Tal entendimento passou
a depender da interação entre diversos fatores e, neste rol de novas dimensões, insere-
6
Uppsala Conflict Data Program (UCDP).
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 10, Nº. 2 (Novembro 2019-Abril 2020), pp. 35-55
A influência das alterações climáticas na escalada do conflito comunal entre pastores e agricultores:
o caso da etnia Fulani na Nigéria
Gustavo Furini
39
se a questão ambiental e seus temas correlatos, como é o caso das alterações climáticas
(ibid.). Como prova da alteração no cenário internacional em Janeiro de 1992, a
presidência do Conselho de Segurança das Nações Unidas emitiu nota enfatizando que o
fim de guerras e conflitos armados entre Estados, por si só, não eram suficientes para
garantira segurança internacional, admitindo que questões de ordem social, econômica,
humanitária e ecológica passaram a ser potenciais fontes de instabilidade para a
segurança e a paz (UNSC, 1992).
Diante deste cenário de transformação entre o final dos anos 1980 e o início da década
de 1990, a temática ambiental passou a compor os estudos sobre segurança, sendo
compreensível a necessidade de formular e desenvolver teorias e conceitos com vista à
delimitação do objeto de estudo (Sheehan, 2005). Nesta perspetiva é possível destacar
o conceito de segurança ambiental que, embora sua definição ainda renda acalorado
debate até os dias de hoje (Soromenho-Marques, 2015), vem sendo aplicado com o
objetivo de abordar os riscos de ordem ambiental que emergem dos sistemas naturais
em função da interferência humana (Dannreuther, 2013). Como exemplo, pode-se
destacar o mau uso dos recursos naturais, o desmatamento, a ocupação desordenada do
solo, a contaminação dos recursos dricos e da atmosfera e as alterações climáticas
(Sheehan, 2005; Homer-Dixon, 1994). As atividades antrópicas passaram a interferir de
tal forma nos processos naturais ao ponto da “Sociedade de Risco” passar a sofrer das
consequências ditadas por ela própria (Beck, 2016), fortalecendo o entendimento que
estamos a viver no período do Antropoceno
7
. Abordar a temática da segurança ambiental
suscita que sejam concatenados preceitos metodológicos da esfera ambiental com
disciplinas que tradicionalmente abordam as questões de segurança, como a estratégia
e as relações internacionais (Soromenho-Marques, 2015).
Para mais, os discursos que contemplam as alterações climáticas tendem a adotar o
conceito de “segurança humana” cuja origem é atribuída ao Relatório de
Desenvolvimento Humano, publicado pelo UNDP em 1994 (FOI, 2010). O documento
propõe um conceito de caráter integrativo e envolve sete diferentes dimensões de
segurança: econômica, pessoal, comunitária, política, alimentar, de saúde e do meio
ambiente (UNDP, 1994). Este conceito acolhe um amplo conjunto de fatores ao assentar-
se no entendimento que os conflitos passarão a ter maior intensidade dentro das nações,
e não mais entre elas, fundamentalmente por conta da privação de acesso aos recursos
e das disparidades socioeconômicas (ibid.). Ademais, em função da evolução e da
consolidação do conceito, o quinto relatório do Intergovernmental Panel on Climate
Change (IPCC) dedicou um capítulo exclusivo para a segurança humana, em que aborda
os riscos impostos pelas alterações climáticas, incluindo o aumento na probabilidade de
conflitos violentos em zonas com elevada vulnerabilidade econômica, social e ambiental
(IPCC, 2013).
Situações de insegurança aguda, como a fome, o conflito e a instabilidade sociopolítica,
quase sempre emergem da interação de múltiplos fatores (Burke et al., 2015). Contudo,
um crescente reconhecimento na ciência de que as alterações climáticas poderão
minar a segurança humana, visto que põem em causa os meios de subsistência de
populações, principalmente através da diminuição das reservas e do acesso aos recursos
7
O Antropoceno marca uma época em que a magnitude da interferência humana no ambiente é de tal ordem
que a sociedade pode ser caracterizada como uma força geofísica de influência global, capaz de trazer
impactos negativos em diversas áreas, inclusive em termos de segurança (Dalby, 2017).
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 10, Nº. 2 (Novembro 2019-Abril 2020), pp. 35-55
A influência das alterações climáticas na escalada do conflito comunal entre pastores e agricultores:
o caso da etnia Fulani na Nigéria
Gustavo Furini
40
naturais, podendo desencadear conflitos violentos tanto em escala local, quanto regional
(Raimi & Jack, 2017). As consequências das alterações climáticas devem ser tratadas
como um elemento adicional de ordem ambiental para a segurança humana, desde o
ponto de vista do Estado até a escala do indivíduo (ibid.), embora sejam reduzidos os
casos na literatura que abordam explicitamente as relações entre mudanças climáticas e
segurança, estes estudos indicam a existência de nexo (IPCC, 2013). Entretanto, é
fundamental ressalvar que a academia aponta que a relação entre alterações climáticas
e segurança humana é, na maior parte das vezes, indireta, e consideram que mudanças
no clima possuem efeito catalisador em determinados contextos de conflitos violentos
(Penny, 2018; Raimi & Jack, 2017; Buhaug, 2016; Uexkull et al., 2016; Burke et al.,
2015; Salehyan, 2014; UNGA, 2009).
2. Alterações climáticas, escassez de recursos naturais e conflitos
violentos
Thomas Homer-Dixon durante a década de 1990 foi um dos pioneiros a relacionar
problemas de acesso aos recursos naturais com segurança e conflitos violentos
(Dannreuther, 2013). O autor partiu da premissa que mudanças no ambiente provocadas
pelos seres humanos, as quais têm a capacidade de afetar diretamente não só a
qualidade como também a quantidade dos recursos naturais, em conjunto com o
crescimento populacional e a distribuição geográfica desigual dos recursos naturais,
constituem o trida escassez ambiental (Homer-Dixon, 1994). O autor defende que a
escassez ambiental pode, em determinadas circunstâncias, perturbar a segurança em
função da capacidade de interferir em processos sociais, políticos e econômicos e, em
Estados enfraquecidos, a elevação da tensão social provocada pela escassez de recursos
naturais poderá culminar na escalada dos níveis de violência intraestadual (ibid.).
Embora estudos de caso tenham sido capazes de documentar e estabelecer ligações entre
a degradação ou a indisponibilidade de recursos naturais com a ocorrência de conflitos
violentos, a teoria tem sido questionada em função das fragilidades para se estabelecer
uma relação de causalidade (Dannreuther, 2013). As muitas variáveis no contexto social,
sobretudo em termos econômicos e políticos, dificultam a identificação de nexo causal
entre variações na disponibilidade ambiental e conflitos violentos (SIDA, 2018; SIPRI,
2016; Conca & Wallace, 2012). Contudo, a falta de estudos quantitativos que sejam
estatisticamente robustos para confirmar o elo direto entre causas ambientais, como o
clima, e conflitos violentos, por si só, não pode ser tomada como parâmetro para
descartar completamente qualquer tipo de influência (Burke et al., 2015; UNGA, 2009).
Além do mais, é reconhecido por parte da comunidade científica que fatores ambientais
têm a capacidade de exacerbar a conflitualidade indiretamente através de múltiplas
formas, visto que agravam tensões sociais, políticas e econômicas já existentes (Penny,
2018; Freeman, 2017; IPCC, 2013; ACCORD, 2012; FOI, 2010; UNGA, 2009). Também
de se considerar que a dificuldade encontrada para demonstrar a existência de relação
direta e linear entre questões de ordem ambiental com conflitos violentos reforça a ideia
de que raramente a responsabilidade recai sob um único fator, mas sim a partir de uma
sucessão de acontecimentos interligados (Raimi & Jack, 2017; FOI, 2010). Em termos
de alterações climáticas, a dificuldade no estabelecimento desta relação direta -se,
sobretudo, pela baixa probabilidade de grupos decidirem entrar em conflito simplesmente
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 10, Nº. 2 (Novembro 2019-Abril 2020), pp. 35-55
A influência das alterações climáticas na escalada do conflito comunal entre pastores e agricultores:
o caso da etnia Fulani na Nigéria
Gustavo Furini
41
porque o calor tem se intensificado ou, então, por conta da diminuição da quantidade de
chuva, porém, os impactos negativos decorrentes das mudanças do clima, como a seca
e a desertificação, podem conduzir ao conflito violento (Buhaug, 2016).
A vulnerabilidade social e ambiental de cada sociedade é quem determinará se os
impactos negativos das alterações climáticas conduzirão ao conflito (Buhaug, 2016;
Scheffran et al., 2012). Nesse sentido, comunidades altamente dependentes da
agricultura e pecuária, localizadas em países pobres com baixa capacidade de resposta
às alterações climáticas poderão entrar em conflito pelo uso de recursos naturais que se
tornaram escassos em função dos efeitos causados pelo aumento da temperatura ou pela
diminuição dos veis de chuva (Buhaug, 2016; Theisen et al., 2011). Por outro lado,
uma sociedade localizada num país rico cuja resiliência assenta-se no desenvolvimento
tecnológico para adaptar-se a mudanças, bem como na capacidade de resposta de suas
instituições públicas e privadas, dificilmente teria que lidar com uma situação de conflito
violento por conta dos mesmos efeitos negativos decorrentes das alterações climáticas
(Salehyan, 2014; Theisen et al., 2011).
A questão que deve ser posta em causa o é “se” as mudanças no clima influenciam
nos conflitos violentos, mas sim “quando” e como” isso acontece (Salehyan, 2014). Para
poder estabelecer qualquer nculo a análise deverá ter em conta três dimensões, a
saber: i) a localização geográfica em que ocorre o impacto das alterações climáticas
(dimensão espacial); ii) o período em que este se desenrola (dimensão temporal) e; iii)
a capacidade de resposta da população e das instituições para enfrentarem a situação de
estresse ambiental (dimensão social) (ibid.). Todas estas dimensões se interrelacionam
e, para se ter uma interpretação concreta de uma situação específica em que estas
dimensões agem conjuntamente, a análise deve ser focada em um cenário
individualizado, evitando generalizações e busca de padrões, reforçando, mais uma vez,
a importância da análise de contexto (ibid.).
As mudanças no ambiente provocadas pela alteração no clima podem minar a segurança
humana vez que reduzem o acesso a determinados recursos naturais indispensáveis para
a subsistência de muitas sociedades, em especial, na África (Raimi & Jack, 2017; FOI,
2010; UNGA, 2009). A escassez de recursos naturais e a disputa por seu uso, como por
exemplo a água, poderá desencadear conflitos violentos (ACCORD, 2012), pelo que
variações nos índices pluviométricos, seja com o aumento ou com a diminuição das
chuvas, serão responsáveis por aumentar o risco de conflitos violentos em economias
altamente dependentes dos recursos naturais, em particular, nas sociedades rurais na
África (IPCC, 2014). O acesso à água é um grave problema para muitos países africanos,
tanto em quantidade como qualidade (IPCC, 2013), desta forma, um dos desafios nos
estudos das alterações climáticas é prever como se dará o comportamento dos padrões
de precipitação e do aumento da temperatura, visto que, consoante estes fatores, poder-
se-á gerar pressão adicional sobre os mananciais de água e as terras férteis (FOI, 2010).
Deve-se destacar que existe um debate entre os que argumentam que um risco
potencial cada vez maior de surgirem conflitos em função da escassez de água, enquanto
que outros valem-se de dados estatísticos para mostrar que as tensões em torno da
disponibilidade deste recurso natural geralmente terminam pela via da negociação e
diplomacia, sobretudo em disputas transfronteiriças (ibid.). Contudo, boa parte dos
estudos enfatizam que este cenário de acordos poderá não ser a tônica no futuro,
nomeadamente em termos intraestatais, que a as alterações climáticas podem agravar
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 10, Nº. 2 (Novembro 2019-Abril 2020), pp. 35-55
A influência das alterações climáticas na escalada do conflito comunal entre pastores e agricultores:
o caso da etnia Fulani na Nigéria
Gustavo Furini
42
a escassez de água em regiões com governos frágeis e sem capacidade institucional para
gerir este tipo de disputa entre comunidades locais (SIPRI, 2016).
É projetado que o aumento da temperatura global induza e prolongue períodos de seca
em muitas regiões, particularmente aquelas já vulneráveis à escassez de água, como é
o caso do continente africano, o que poderá influenciar na dinâmica de conflitos
intraestatais (Koubi, 2019; Penny, 2018). O estudo realizado por Koubi (2019) relacionou
os índices de seca no período de 2005 a 2014, obtidos através do método Palmer Drought
Severity Index (PDSI)
8
, com os dados de conflitos no continente africano de 1995 a 2015
disponibilizados pelo UCDP, conforme Figura 1. Por mais que os dados sobre os conflitos
tenham iniciado uma década antes dos valores cobertos pelo índice de seca (PSDI), é
possível perceber uma forte concentração de conflitos violentos em locais com
intensificação da escassez hídrica, sobretudo nos países da África Subsaariana, o que
também se aplica à Nigéria.
Figura 1. Relação entre seca (Palmer Drought Severity Index, de 2005 a 2014) e conflitos violentos
(UCDP, de 1995 a 2014) em parte do continente africano, com destaque para a Nigéria no círculo
vermelho.
Fonte: Adaptado a partir do original proposto por Koubi (2019)
certo consenso que a variabilidade climática no continente africano poderá conduzir
a maiores taxas de escassez de recursos naturais, os quais se configuram como principais
meios de subsistência para grande parcela da população (ACCORD, 2012). O aumento
da indisponibilidade de recursos naturais essenciais para a manutenção da subsistência
terá impacto negativo na segurança humana, sendo que os efeitos mais devastadores
são projetados para as economias menos capazes de se adaptar a tais mudanças, o que
8
O PDSI foi desenvolvido na década de 1960 e vem sendo utilizado para identificar ocorrência de secas a
partir de dados mensais de temperatura e precipitação, além de informações sobre a capacidade de
retenção de água no solo. Considera tanto a umidade recebida(precipitação), quanto a armazenada no solo,
representando assim a perda potencial de umidade devido a influência da temperatura (WMO & GWP, 2016).
Palmer Drought
Severity Index
Nigéria
Período do Conflito
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 10, Nº. 2 (Novembro 2019-Abril 2020), pp. 35-55
A influência das alterações climáticas na escalada do conflito comunal entre pastores e agricultores:
o caso da etnia Fulani na Nigéria
Gustavo Furini
43
ocorre essencialmente nos países em desenvolvimento (Uexkull et al., 2016).
Independentemente do andamento do debate do nexo causal entre mudanças climáticas
e conflitos violentos, diante da iminência dos riscos à segurança humana faria sentido
que o Conselho de Segurança das Nações Unidas assumisse uma postura mais pró-ativa
quanto ao tema (Scott & Ku, 2018; Penny, 2018).
Dada a responsabilidade primária do Conselho pela manutenção da paz e segurança em
nível global, não parece coerente que o órgão fique alheio à discussão ou assuma uma
postura de neutralidade, tendo em vista a dimensão que o fenômeno está a atingir (ibid.).
O Conselho de Segurança mostras que seu envolvimento tem caráter reativo e
protocolar quanto aos temas que envolvem as mudanças climáticas, muito
provavelmente em decorrência da resistência de alguns de seus principais membros
(Penny, 2018).
Mesmo diante deste cenário pouco participativo do Conselho de Segurança é importante
sublinhar o posicionamento que o órgão adotou com a Resolução S/RES/2349/2017, em
que reconheceu, de forma inédita, as alterações climáticas como fator de instabilidade
para a segurança, sobretudo em função da interferência na disponibilidade dos recursos
naturais na África (UNSC, 2017). A Resolução aborda a situação conflituosa existente na
área de influência da Bacia do Lago Chade, região na qual está inserida a zona nordeste
da Nigéria, e em seu subitem 26 reconhece que:
“… the adverse effects of climate change and ecological changes
among other factors on the stability of the Region, including through
water scarcity, drought, desertification, land degradation, and food
insecurity, and emphasises the need for adequate risk assessments
and risk management strategies by governments and the United
Nations relating to these factors… (UNSC, 2017:7).
Portanto, a ausência de elementos quantitativos e estatísticos que comprovem a relação
direta e linear da influência dos fatores ambientais em conflitos violentos, não pode
continuar servindo de pretexto para descaracterizar a potencial participação dos mesmos
(Salehyan, 2014). E tal apelo ganha ainda maior relevância tendo em vista os riscos à
segurança humana provocados pelas alterações climáticas nos países menos
desenvolvidos (IPCC, 2013). Diante do exposto, a próxima seção abordará o papel que
as alterações climáticas exercem na escassez ambiental na África, bem como, seu
contributo para o agravamento do conflito comunal, entre pastores e agricultores na
Nigéria, populações altamente dependentes do setor primário da economia.
3. Alterações climáticas, escassez ambiental e conflito comunal na
Nigéria: agricultores vs. pastores
A partir do conceito de escassez ambiental proposto por Homer-Dixon (Figura 2) utiliza-
se aqui a perspectiva que a diminuição na qualidade e quantidade dos recursos naturais,
agravada pelas alterações climáticas, participa da cadeia de eventos que podem
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 10, Nº. 2 (Novembro 2019-Abril 2020), pp. 35-55
A influência das alterações climáticas na escalada do conflito comunal entre pastores e agricultores:
o caso da etnia Fulani na Nigéria
Gustavo Furini
44
influenciar nos conflitos comunais
9
entre pastores e agricultores. Tais conflitos ocorrem
em diversos países da África Subsaariana, apresentando-se como um desafio em escala
nacional e regional (Gbaka, 2014), pelo que será analisado com maior detalhe o impacto
causado pela ação da etnia Fulani na Nigéria.
A África depara-se atualmente com uma série de problemas decorrentes da degradação
ambiental, sendo que nas regiões de influência do Sahel as maiores adversidades estão
relacionadas à disponibilidade de água, a qual se manifesta mais visivelmente em função
da seca e da desertificação, e como já mencionado, os efeitos negativos são acentuados
pelas alterações climáticas (IPCC, 2013). Ademais, os países do continente africano são
especialmente vulneráveis às alterações do clima por conta da baixa capacidade
adaptativa e dos impactos negativos projetados para lá ocorrerem (ibid.). A escassez de
recursos naturais tem provocado, por exemplo, uma série de disputas entre agricultores
e pastores, visto que a manutenção dos meios de subsistência das comunidades rurais
depende diretamente do acesso tais recursos (Ahmadu, 2018). É central nestes conflitos
comunais a busca pela defesa dos meios materiais, luta que fica mais evidente a partir
da escassez de água, a qual se reflete, dentre outras formas, através da desertificação
(ibid.).
Figura 2. Influência das alterações climáticas na escassez de recursos naturais e sua relação com
conflitos comunais.
Fonte: Adaptado a partir do esquema original proposto por Homer-Dixon (1994).
9
Conforme definição do UCDP (2016) os conflitos comunais são do tipo não estatais e ocorrem entre grupos
que compartilham linhas de identidade como religião, etnia ou que pertençam a um mesmo clã ou tribo.
Não são grupos permanentemente estruturados para o combate, mas às vezes se organizam para se
envolver em conflitos violentos, sendo que abrangência tende a ser intraestatal. Entretanto, afirmar que a
identidade comunal se refere apenas à identidade étnica ou religiosa pode dar ao termo um caráter pouco
flexível, pelo que a ACCORD (2012) sublinha que a principal identificação pode ser baseada por disputas
dos meios de subsistência, portanto, conflitos comunais também envolvem aqueles que ocorrem entre
pastores e agricultores.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 10, Nº. 2 (Novembro 2019-Abril 2020), pp. 35-55
A influência das alterações climáticas na escalada do conflito comunal entre pastores e agricultores:
o caso da etnia Fulani na Nigéria
Gustavo Furini
45
A insegurança dos meios naturais necessários à subsistência de populações rurais é
premente na Nigéria (CCASTR, 2011). Está comprovado que a temperatura média na
Nigéria aumentou, desde o ano 1900 até hoje, em 1.1 ºC, sendo que a temperatura
média mundial aumentou 0.74 ºC de 1860 até os dias de hoje (Akpodiogaga-a & Odjugo,
2010). Para além, estudos realizados na metade da década de 1980 já apontavam uma
tendência de seca para a Nigéria em decorrência da diminuição da incidência de chuva
na parte centro-leste e norte do país (Adefolalu, 1986). Atualmente, zonas localizadas
no norte da Nigéria m enfrentado um profundo processo de desertificação (Ahmadu,
2018; Nwokeoma & Chinedu, 2017; Assibong et al., 2017), e as populações dependentes
da agropecuária sofrem diretamente os efeitos, pelo que se verifica um aumento dos
fluxos populacionais, sobretudo para os que vivem da pecuária, em direção ao centro do
país (Freeman, 2017).
A África Ocidental, em particular a Nigéria, experimenta um aumento considerável de
conflitos intraestatais desde o início dos anos 90, em que se apresenta especialmente
preocupante a partir dos anos 2000 a intensificação de confrontos entre agricultores e
pastores por recursos naturais, cuja escassez tende a ser agravada em função das
nuances do clima (Okoli & Atelhe, 2014). Conflitos entre agricultores e pastores são
comuns em quase todas as partes da Nigéria e superá-los é um grande desafio para o
desenvolvimento econômico, para a segurança alimentar e para a sustentabilidade das
comunidades agrárias (Ukamana et al., 2017). Como apresentado ao longo deste
ensaio, a probabilidade dos efeitos do clima interferirem em conflitos violentos depende
do contexto, assim como, de aumentarem a probabilidade da ocorrência de conflitos
comunais em áreas de escassez de recursos naturais (Vestby, 2018). Esse quadro é
particularmente preocupante em regiões onde o governo não se faz presente, como nas
áreas onde se desencadeiam conflitos entre agricultores e pastores nas terras do centro
e norte da Nigéria (ibid.). Traçar linhas de causalidade entre mudanças climáticas e
conflitos requer cautela, visto que não se pode aferir indistintamente que os cidadãos
começam a brigar automaticamente por conta do simples aumento da temperatura
(Buhaug, 2016; Odoh & Chigozie, 2012).
A literatura aponta que o conflito entre agricultores e pastores é recorrente na Nigéria e
a interação entre ambos remonta a tempos antigos, com destaque para o grupo de
pastores Fulani, cuja entrada nas áreas que atualmente formam o território nigeriano
data do século XIV (Ahmadu & Ayuba, 2018). Tanto o viés religioso quanto étnico das
tensões entre pastores Fulani, maioritariamente muçulmanos, e os agricultores,
predominantemente cristãos, são importantes na determinação deste conflito comunal,
exacerbado pela escassez de recursos naturais e pela desertificação (IEP, 2017). A
Nigéria pode ser tido como um país dividido e os conflitos violentos intraestatais podem
rapidamente configurar o conflito comunal como de dimensão étnico-religiosa, visto que
os grupos étnicos usualmente apoiam sua “linhagem” na luta violenta, tendo como
premissa que devem prevalecer os direitos do grupo ao qual pertencem (Akov, 2017).
Os Fulani são um grupo étnico pastoril e nômade com cerca de 20 milhões de pessoas
que se encontram espalhados por diversos países da África Ocidental e Central
(Bamidele, 2018), porém, apenas uma reduzida parcela está envolvida em ataques
violentos na Nigéria (IEP, 2017). O grupo étnico Fulani detém 90% do rebanho do país,
sendo que a pecuária responde por um terço do PIB do setor primário (Bamidele, 2018;
Abbass, 2012). Problemas relacionados à escassez de água e da desertificação no Sahel
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 10, Nº. 2 (Novembro 2019-Abril 2020), pp. 35-55
A influência das alterações climáticas na escalada do conflito comunal entre pastores e agricultores:
o caso da etnia Fulani na Nigéria
Gustavo Furini
46
provocaram uma alteração no comportamento dos pastores nigerianos, que passaram a
buscar alternativas para manutenção do seu estilo de vida em zonas mais ao centro do
país (Abugu & Onuba, 2015). O quadro alarmante de desertificação que atravessa a
região do Sahel tem forçado os pastores Fulani à conduzirem seu gado para pastagens
localizadas nas porções centro e centro-leste do país, também conhecida como Middle
Belt (ibid.). Os pastores Fulani transformaram as regiões centrais do país em residência
permanente e não mais em morada temporária, como era comum durante os
deslocamentos entre os extremos norte e sul da Nigéria, conjuntura estaque contribui
para a exacerbar os conflitos com os agricultores (Akov, 2017; Abugu & Onuba, 2015;
Okoli & Atelhe, 2014).
Os conflitos entre estes dois grupos decorrem da competição e luta desesperada pela
sobrevivência e subsistência num ambiente marcado por insegurança e escassez de
recursos naturais, situação exacerbada pelas alterações climáticas (Okoli & Atelhe, 2014;
Odoh & Chigozie, 2012; Abbass, 2012). O estudo realizado por Okoli & Atelhe (2014)
identificou que as mudanças climáticas agravam os cenários de disponibilidade de água
(desertificação e seca), e em decorrência disso, aumentam o fluxo migratório de pastores
pelo território nigeriano. É de se destacar os elevados níveis de violência que envolvem
o grupo étnico Fulani desde o final da última década, e os dados do UCDP demonstram
que este grupo étnico esteve envolvido em centenas de conflitos na Nigéria de Janeiro
de 2010 até Dezembro de 2017, com 3.334 timas fatais. A maior parte dos ataques
ocorreram em vilas do interior do país, sobretudo em quatro estados localizado no centro-
leste do país (Benue, Plateau, Taraba e Nasarawa), em que se verificaram 3.085 mortes.
Especificamente nesses quatro estados, os Fulani entraram em conflito violento com
grupos de diferentes etnias, são elas: Birom, Tiv, Agatu, Eggon, Tarok, Jukun, Irigwe,
Mambila, Atakar, Bwatiye.
Contudo, é importante destacar que relativamente ao número expressivo de casos de
vítimas fatais por ataques violentos perpetrados pelos Fulani, estes atos podem ter
origem e natureza muito diversa, portanto, embora a disputa por recursos naturais tenha
grande importância na atualidade, esta não deve ser tomada como fator único
(Chinwokwu, 2017). As atividades criminosas são diversas e podem envolver assaltos a
mão armada, assassinatos, saques, sequestros, destruição de comunidades e igrejas
(ibid.). A maior parte dos episódios envolvendo atos criminosos realizados pelos Fulani,
em especial os hediondos, sequer o investigados pelas agências de segurança
governamentais da Nigéria (ibid.). Ademais, os pastores dificilmente solicitam permissão
para se deslocar ou permanecer em qualquer comunidade, o que na cultura local é visto
como afronta suficiente para gerar sérios conflitos (Bamidele, 2018). Setores da
sociedade nigeriana criticam a atuação do presidente, Muhammadu Buhari, que em
função de pertencer à etnia Fulani, parece agir de forma conivente com atos criminosos
realizados pelo grupo étnico do qual pertence (ibid.).
4. Influência do regime de chuvas na dinâmica do conflito comunal
envolvendo a etnia Fulani
Nesta seção é apresentado, a partir de estudo de caso, de que forma a disponibilidade
hídrica, fortemente marcada pelas estações do ano, relacionou-se aos eventos com
mortes no conflito comunal entre pastores e agricultores em quatro estados nigerianos
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 10, Nº. 2 (Novembro 2019-Abril 2020), pp. 35-55
A influência das alterações climáticas na escalada do conflito comunal entre pastores e agricultores:
o caso da etnia Fulani na Nigéria
Gustavo Furini
47
(Benue, Plateau, Taraba e Nasarawa), no período compreendido por Janeiro de 2010 a
Dezembro de 2017. Nestes estados, localizados na porção centro-leste do país, o regime
de chuvas é marcado pela presença de duas estações distintas e bem definidas, a de
chuvas ou úmida (Maio a Outubro) e a seca (Novembro a Março).
4.1. Metodologia utilizada
Como forma de abordagem do problema foi adotado o método hipotético-dedutivo a
partir de estudo de caso, tomando-se como premissa critérios temporais e espaciais para
a coleta, processamento e análise das informações. Recorreu-se à base de dados sobre
ataques violentos no continente africano disponibilizados pelo Uppsala Conflict Data
Program (UCDP), especificamente os dados do Georeferenced Event Dataset (GED)
Global Version 19.1
10
. Para fins de atendimento dos objetivos ora propostos foram
selecionadas apenas as informações de conflitos violentos com mortes ocorridos na
Nigéria envolvendo a etnia Fulani.
Relativamente ao recorte temporal determinou-se o período de Janeiro de 2010 a
Dezembro de 2017 em função da escalada de eventos com mortes a partir de 2010.
Contudo, é importante ressaltar que a base de dados do UCDP apresenta eventos
violentos esparsos na Nigéria envolvendo a etnia Fulani desde os anos 1990, com
aumento progressivo na frequência destes a partir dos primeiros anos do corrente século.
Sendo assim, os dados indicam que o conflito não apenas consolidou-se, pelo que
também alastrou-se geograficamente a partir de 2010. Quanto ao número de mortes
estas foram baseadas nas melhores estimativas (“best estimate”)
11
conforme
categorização do UCDP.
No que diz respeito ao recorte espacial foram analisados os eventos ocorridos em quatro
estados na região centro-leste da Nigéria (Plateau, Benue, Taraba e Nasarawa), a “área
de estudo” deste trabalho, escolha que se justifica tendo em conta que aí concentraram-
se 92,5% das vítimas fatais no período (Jan-2010 a Dez-2017), ou 3.085 mortes de um
total de 3.334 fatalidades (Figura 3). Para mais, a concentração dos ataques violentos
nessa porção do país corrobora com as informações coletadas na literatura, pelo que se
identifica uma tendência de migração do norte em direção ao centro-leste do país em
busca por locais com maior disponibilidade de água e de terras com pastagens. Os
eventos com fatalidades foram localizados no mapa a partir das informações de latitude
e longitude fornecidas pela base de dados do UCDP. Cabe referir que houve casos em
que eventos distintos envolvendo mortes ocorreram numa mesma localidade em datas
diferentes ao longo do período analisado, nesses casos, as localizações dos eventos se
sobrepuseram no mapa, mas que nesses casos acabaram por ser identificadas por um
único ponto.
10
Disponível para download em https://ucdp.uu.se/downloads/. Acesso em 20/05/2019.
11
Conforme UCDP Georeferenced Event Dataset Codebook Version 19.1, documento disponível para download
em https://ucdp.uu.se/downloads/ged/ged191.pdf. Acesso em 20/05/2019.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 10, Nº. 2 (Novembro 2019-Abril 2020), pp. 35-55
A influência das alterações climáticas na escalada do conflito comunal entre pastores e agricultores:
o caso da etnia Fulani na Nigéria
Gustavo Furini
48
Figura 3. Área de estudo e localização de conflitos com fatalidades
Fonte: Autor
Figura 4. Localização dos pontos de coleta de dados pluviométricos na Área de Estudo.
Fonte: Autor.
Com a finalidade de verificar a existência de relação entre fatalidades com a ocorrência
de chuvas, uma vez que a variação nos veis de precipitação tem a capacidade de
contribuir para maior ou menor escassez de água, foram utilizados dados mensais do
acumulado de chuva, em mimetros, em 15 localidades
12
, conforme Figura 4. De posse
dos dados do acumulado de chuva por localidade foi feita a média pluviométrica mensal
para cada um dos quatro estados nigerianos de Janeiro de 2010 a Dezembro de 2017,
num total de 96 meses. Por fim, gerou-se um gráfico combinando as informações do
índice pluviométrico mensal com o mês da ocorrência das fatalidades, de acordo com as
Figuras 6 a 9.
12
Dados médios de precipitação pluviométrica disponíveis em https://www.worldweatheronline.com. Acesso
em 15/05/2019.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 10, Nº. 2 (Novembro 2019-Abril 2020), pp. 35-55
A influência das alterações climáticas na escalada do conflito comunal entre pastores e agricultores:
o caso da etnia Fulani na Nigéria
Gustavo Furini
49
Relativamente as ferramentas utilizadas para averiguar dados e gerar produtos, foi
utilizado software de análise e edição de planilhas, igualmente empregue para elaboração
de gráficos e tabelas. Também se fez uso software em plataforma SIG (Sistema de
informação Geográfica) para análise de dados espaciais e produção de mapas.
4.2. Resultados
Pela análise dos dados, pode-se verificar na área de estudo, a ocorrência de um número
46,4% superior de mortes nos conflitos comunais envolvendo a etnia Fulani no período
seco (Novembro a Abril) do que no período chuvoso (Maio a Outubro), conforme Figura
5.
Figura 5. Distribuição das mortes por época do ano na área de estudo
Fonte: Autor
Relativamente à distribuição das mortes ao longo dos meses do ano de Janeiro de 2010
a Dezembro de 2017, buscou-se verificar a existência de relação entre maior ou menor
índice de precipitação com maior ou menor número fatalidades. As Figuras 6 a 9
representam graficamente a distribuição de precipitação média mensal com número de
mortes ao longo de todo período analisado em cada estado da área de estudo.
Figura 6. Relação entre fatalidades e índice pluviométrico (Plateau)
Fonte: Autor
1833
1252
0
200
400
600
800
1000
1200
1400
1600
1800
2000
NOV-ABR (SECO) MAI-OUT (CHUVOSO)
N.º M o r t e s
Fatalidades por período do ano
457
4
177
13
3
11
7
27
20
5
1
3
28
25
3
4
34
9
6
2
1
31
20
10
23
62
40 40
34
18
59
8
12
20
1
19
51
0
50
100
150
200
250
300
350
400
450
500
0
50
100
150
200
250
jan/10
mai/10
set/10
jan/11
mai/11
set/11
jan/12
mai/12
set/12
jan/13
mai/13
set/13
jan/14
mai/14
set/14
jan/15
mai/15
set/15
jan/16
mai/16
set/16
jan/17
mai/17
set/17
Nº M o r t e s
P r e c i p i t a ç ã o (mm)
Plateau
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 10, Nº. 2 (Novembro 2019-Abril 2020), pp. 35-55
A influência das alterações climáticas na escalada do conflito comunal entre pastores e agricultores:
o caso da etnia Fulani na Nigéria
Gustavo Furini
50
Figura 7. Relação entre fatalidades e índice pluviométrico (Benue).
Fonte: Autor
Figura 8. Relação entre fatalidades e índice pluviométrico (Nasarawa)
Fonte: Autor
4
29
56
35
50
30
20
30
4
46
75
8
62
33
35
13
10
42
2
2
99
12
23
81
3
128
27
15
106
15 15
5
6
26
19
1
0
20
40
60
80
100
120
140
0
50
100
150
200
250
300
350
jan/10
mai/10
set/10
jan/11
mai/11
set/11
jan/12
mai/12
set/12
jan/13
mai/13
set/13
jan/14
mai/14
set/14
jan/15
mai/15
set/15
jan/16
mai/16
set/16
jan/17
mai/17
set/17
Nº M o r t e s
P r e c i p i t a ç ã o (mm)
Benue
5
2
4
11
6
2
2
2
34
1
20
70
73
59
2
1
33
0
10
20
30
40
50
60
70
80
0
50
100
150
200
250
jan/10
mai/10
set/10
jan/11
mai/11
set/11
jan/12
mai/12
set/12
jan/13
mai/13
set/13
jan/14
mai/14
set/14
jan/15
mai/15
set/15
jan/16
mai/16
set/16
jan/17
mai/17
set/17
Nº M o r t e s
P r e c i p i t a ç ã o (mm)
Nasarawa
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 10, Nº. 2 (Novembro 2019-Abril 2020), pp. 35-55
A influência das alterações climáticas na escalada do conflito comunal entre pastores e agricultores:
o caso da etnia Fulani na Nigéria
Gustavo Furini
51
Figura 9. Relação entre fatalidades e índice pluviométrico (Taraba)
Fonte: Autor
Embora seja evidenciada uma propensão maior (46,4%) de ocorrerem conflitos com
mortes durante a época seca (Novembro a Abril), não é possível estabelecer uma relação
de causa-efeito entre a menor ocorrência de chuvas com as fatalidades, bem como,
afirmar que estes ataques ocorreram exclusivamente em função de disputa por recursos
naturais. Entretanto, é importante destacar que a área de estudo está compreendida na
região da Nigéria que Adefolalu (1986) evidenciava uma menor tendência de
precipitação nos meses secos, em especial nas regiões centrais do país, compreendidas
pelos paralelos 7N a 9N. A análise dos dados de precipitação ao longo dos 8 anos da série
(Jan 2010/Dez 2017) demonstra que nos períodos de Dezembro a Fevereiro praticamente
não qualquer ocorrência de chuvas, além do que, a precipitação anual média esteve
sempre abaixo dos 1.000 mm de chuva, valor que era expectável para esta porção da
Nigéria.
5. Conclusões
Para explicar a razão por detrás dos conflitos comunais é necessário buscar conhecer da
forma mais ampla possível o contexto do objeto de estudo, para então, tirar conclusões,
mesmo que sucintas num primeiro momento, visto que os conflitos normalmente estão
envoltos por uma complexa rede de acontecimentos. No caso em tela, a revisão da
literatura permitiu identificar, a partir de diversos estudos em diferentes fontes, que
piora na disponibilidade dos recursos naturais, especialmente de água e terras para
agropecuária, em regiões da Nigéria. Estudos científicos têm demonstrado que as
alterações climáticas desempenhem um papel importante no agravamento da seca e da
desertificação, o que contribui para o deslocamento forçado de populações rurais, que
oriundas do norte vão em direção ao centro-leste na expectativa de ali encontrarem
recursos naturais que permitam a manutenção do seu estilo de vida. Portanto, embora
as alterações climáticas não possam ser consideradas, até o momento, como elemento
4
3
14
13
4
9
52
13
21
34
27
5
10
12
9
31
11
40
0
10
20
30
40
50
60
0
50
100
150
200
250
jan/10
mai/10
set/10
jan/11
mai/11
set/11
jan/12
mai/12
set/12
jan/13
mai/13
set/13
jan/14
mai/14
set/14
jan/15
mai/15
set/15
jan/16
mai/16
set/16
jan/17
mai/17
set/17
Nº M o r t e s
P r e c i p i t a ç ã o (mm)
Taraba
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 10, Nº. 2 (Novembro 2019-Abril 2020), pp. 35-55
A influência das alterações climáticas na escalada do conflito comunal entre pastores e agricultores:
o caso da etnia Fulani na Nigéria
Gustavo Furini
52
que atua de forma direta e linear na origem de conflitos, os seus impactos são relevantes
e sua interferência deve ser considerada nos conflitos comunais, como o que ocorre entre
pastores de etnia Fulani e agricultores na Nigéria. Portanto, ao fim do trabalho é possível
concluir que a abordagem teórica escolhida, de Homer-Dixon (1994), aplica-se adequada
e satisfatoriamente à realidade do contexto investigado.
Com base na análise realizada na área de estudo durante a última seção deste trabalho,
por mais que não se tenha conseguido traçar uma relação de dependência direta entre a
maior ocorrência ou ausência de chuva com mortes provocadas por conflitos violentos,
pelo que tampouco tinha-se esta pretensão, é possível inferir que há uma probabilidade
46,4% maior das fatalidades ocorrem no período do ano marcado pela seca (Novembro
a Maio). Portanto, as causas dessa maior propensão da ocorrência de vítimas fatais em
conflitos violentos envolvendo os Fulani nos meses com ausência ou menor incidência de
chuvas pode ser agravado com a diminuição na disponibilidade drica em função das
alterações no clima do planeta, o que é tema para futuras investigações.
Por fim, na tentativa em contribuir na resolução do conflito comunal aqui examinado,
propõe-se que, uma vez compreendido e internalizado que os impactos das alterações
climáticas são um risco para a segurança humana no país, os decisores políticos da
Nigéria devem considerar, vividamente, todas as alternativas de adaptação às mudanças
do clima que estejam ao alcance, para além do que está em curso. Isto é válido não
somente para iniciativas apoiadas financeiramente com fundos locais, mas sobretudo,
deve-se buscar mais apoio e recurso junto aos países mais desenvolvidos, para assim,
ampliar os investimentos em projetos de adaptação.
Não apenas a Nigéria, mas os demais países localizados na África Subsaariana devem
aumentar suas reivindicações durante as rodadas multilaterais sobre o clima, em especial
no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima -
CQNUMC (ou UNFCCC em inglês). Isto porque o Fundo Verde para o Clima, aprovado por
todas as Partes da Convenção, deveria receber aportes financeiros anuais dos países
desenvolvidos de 100 bilhões de dólares para financiar projetos de adaptação e mitigação
em países pobres. Contudo, até o momento menos de 2% do total que deveria ter sido
depositado ao longo desta década chegou aos cofres do Fundo.
Referências bibliográficas
Abbass, I. M. (2012). No retreat no surrender conflict for survival between Fulani
pastoralists and farmers in northern Nigeria. In European Scientific Journal. Vol. 8, n.º
1.
Abugu, S. O.; Onuba, C. O. (2015). Climate change and pastoral conflicts in the middle
belt and south-east Nigeria: implication on human resource of the regions. In Global
Journal of Human Resource Management. Vol. 3, n.º 5.
ACCORD, The African Centre for the Constructive Resolution of Disputes (2012). Climate
change and conflict: Conflict-sensitive climate change adaptation in Africa.
Adefolalu, D. O. (1986). Rainfall Trends in Nigeria. In Theoretical and Applied
Climatology. Vol. 37.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 10, Nº. 2 (Novembro 2019-Abril 2020), pp. 35-55
A influência das alterações climáticas na escalada do conflito comunal entre pastores e agricultores:
o caso da etnia Fulani na Nigéria
Gustavo Furini
53
Ahmadu, H. J. (2018). Analysis on Some Causes and Consequences of North-South
Migration of Fulani Pastoralists in Nigeria. In International Journal of Innovative Research
& Development. Vol. 7, n.º 3.
Ahmadu, H. J. & Ayuba, H. (2018). The role of group solidarity in conflict between farmers
and Fulani pastoralists: A case study of Northern Nigeria. In African Journal of Political
Science and International Relations. Vol. 12, n.º 3.
Akov, E. T. (2017). The resource-conflict debate revisited: Untangling the case of farmer
herdsman clashes in the North Central region of Nigeria. In African Security Review. Vol.
26, n.º 3.
Akpodiogaga-a, P.; Odjugo, O. (2010). General Overview of Climate Change Impacts in
Nigeria. In Journal of Human Ecology.Vol. 29, n.º 1.
Assibong, P. A.; Chidozie, F.; Bakare, J. (2017). The politico-socio-economic
consequences of climate change in Nigeria. In Covenant University Conference on e-
Governance in Nigeria (CUCEN2017).
Bamidele, S. (2018). ‘Bandidos de Terras’ ou ‘Grileiros’: conflitos sangrentos e
incessantes entre pastores Fulani e fazendeiros locais na Nigéria. In Revista Brasileira de
Estudos Africanos. Vol. 3, n.º 6.
Beck, U. (2016). A sociedade de risco mundial: em busca da segurança perdida. Edições
70: Lisboa.
Beck, U. (2017). A metamorfose do mundo. Edições 70: Lisboa.
Buhaug, H. (2016). Climate Change and Conflict: Taking Stock. Peace Economics. In
Peace Science and Public Policy. n.º 22 (4).
Burke, M.; Hsiang, S. M.; Miguel, E. (2015). Climate and Conflict. In Annual Review of
Economics. n.º 7.
CCASTR, Climate Change Adaptation Strategy Technical Reports (2011). Building
Nigeria's Response to Climate Change (BNRCC) Project.
Chinwokwu, E. C. (2017). Glamorization of Fulani herdsmen’s criminality and its
implications on national security in Nigeria. In Online Journal of Arts, Management and
Social Sciences (OJAMSS). Vol.2, n.º 2.
Conca, K. & Wallace, J. (2012). Environment and peacebuilding in war-torn societies:
Lessons from the UN Environment Programme’s experience with post-conflict
assessment. In Assessing and Restoring Natural Resources in Post-Conflict Peacebuilding.
Jensen, D. & Lonergan, S. (Ed.). Londres: Earthscan.
Dalby, S. (2017). Anthropocene Formations: Environmental Security, Geopolitics and
Disaster. In Theory, Culture & Society. Vol. 34 (2-3).
Dannreuther, R. (2013). International Security: the comtemporary agenda. Ed.
Cambridge: Polity Press.
FOI, Swedish Defence Research Agency (2010). On Connecting Climate Change with
Security and Armed Conflict. Department of Defence Analysis. Estocolmo.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 10, Nº. 2 (Novembro 2019-Abril 2020), pp. 35-55
A influência das alterações climáticas na escalada do conflito comunal entre pastores e agricultores:
o caso da etnia Fulani na Nigéria
Gustavo Furini
54
Freeman, L. (2017). Environmental change, migration, and conflict in Africa: A critical
examination of the interconnection. In Journal of Environment and Development. Sage
Publications.
Gbaka, E. (2014). Managing Conflict Between Farmers and Pastoralists in Benue State,
Nigeria. In Peace Trends. Vol. 2, n.º 3.
Homer-Dixon, T. F. (1994). Environmental Scarcities and Violent Conflict: Evidence from
cases. In International Security, Vol. 19, n.º 1.
Idowu, D. L. (2017). Causes, consequences and resolution of environmental conflict in
Nigeria. In International Journal of Social Science and Economic Research. Vol. 02, nº.
01.
IEP, Institute for Economics & Peace (2017). Global Terrorism Index.
IPCC (2013). The Physical Science Basis. Fifth Assessment Report.
IPCC, Intergovernmental Panel on Climate Change. (2014). Climate Change 2014:
Impacts, Adaptation, and Vulnerability. IPPC Working Group II.
Koubi, V. (2019). Climate Change and Conflict. In Annual Review of Political Science. Vol.
22.
Mathews, J. T. (1989). Redefining Security. In Foreign Affairs. Spring 1989.
Nwokeoma, B. N. & Chinedu, A. K. (2017). Climate Variability and Consequences for
Crime, Insurgency in North East Nigeria. In Mediterranean Journal of Social Sciences. Vol
8, n.º 3.
Odoh, S.I. & Chigozie, C. F. (2012). Climate change and conflict in Nigeria: a theoretical
and empirical examination of the worsening incidence of conflict between Fulani
herdsmen and farmers in northern Nigeria. In Arabian Journal of Business and
Management Review (OMAN Chapter). Vol. 2, n.º 1.
Okoli, A. C. & Atelhe, G. A. (2014). Nomads against Natives: A Political Ecology of
Herder/Farmer Conflicts in Nasarawa State, Nigeria. In American International Journal of
Contemporary Research. Vol. 4, n2.
Penny, C. K. (2018). Climate change as a ‘threat to international peace and security’. In
Climate Change and the UN Security Council. Scott, S. V. & Ku, C. (Ed.). Cheltenham:
Edward Elgar Publishing.
Raimi, L. & Jack, J. T. C. B. (2017). How does climate change pose human security risks
in the Niger delta? Implication for policy makers. In Maiduguri Journal of Arts & Social
Sciences. Vol. 14.
Salehyan, I. (2014). Climate change and conflict: Making sense of disparate findings. In
Political Geography.
Scheffran, J.; Brzoska, M.; Kominek, J.; P. Link, M.; Schilling, J. (2012). Climate change
and violent conflict. In Science. Vol. 336.
Scott, S. V. & Ku, C. (2018). The UN Security Council and global action on climate change.
In Climate Change and the UN Security Council. Scott, S. V. & Ku, C. (Ed.). Cheltenham:
Edward Elgar Publishing.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 10, Nº. 2 (Novembro 2019-Abril 2020), pp. 35-55
A influência das alterações climáticas na escalada do conflito comunal entre pastores e agricultores:
o caso da etnia Fulani na Nigéria
Gustavo Furini
55
Sheehan, M. (2005). International Security: An analitical survey. Boulder: Lynne Rienner
Publishers.
SIPRI, Stockholm International Peace Research Institute (2016). Climate-related security
risks: towards an integrated approach. Estocolmo.
Soromenho-Marques, V. (2015). Segurança Ambiental. In Enciclopédia de Direito e
Segurança. Bacelar Gouveia, J. & Santos, S. Coimbra: Almedina.
Theisen, O. M.; Holtermann, H.; Buhaug, H. (2011). Climate Wars? In International
Security. Vol. 36, n.º 3.
Tomé, L. (2010). Security and security complex: operational concepts. In JANUS.NET e-
journal of International Relations, No. 1, Autumn.
UCDP, The Uppsala Conflict Data Program (2016). Non-State Conflict Codebook. Versão
2.5.
Uexkull, N. V.; Croicu, M., Fjelde, H.; Buhaug, H. (2016). Civil conflict sensitivity to
growing-season drought. Proceedings of the National Academy of Sciences of the United
States of America PNAS. n.º113 (44).
Ukamana, D. M. et al. (2017). Livelihood issues in herdsmen-farmers’ conflict among
farming communities in Kogi State, Nigeria. In African Journal of Agricultural Research.
Vol. 12, n.º 24.
UNDP, United Nations Development Programme (1994). Human Development Report
1994. Nova Iorque: Oxford University Press.
UNGA, United Nations General Assembly (2009). Climate change and its possible security
implications, Report of the Secretary-General. Sixty-fourth session. A/64/350.
UNSC, United Nations Security Council (1992). S/23500. Note by the President of the
Security Council. Nova Iorque.
UNSC, United Nations Security Council (2017). Resolution 2349. Adopted by the Security
Council at its 7911th meeting, on 31 March 2017. Nova Iorque.
Vestby, J. (2018). Climate, development, and conflict: Learning from the past and
mapping uncertainties of the future. Tese de doutoramento. Departamento de Ciências
Políticas, Faculdade de Ciências Sociais. Oslo: Universidade de Oslo.
WMO, World Meteorological Organization & GWP, Global Water Partnership (2016).
Handbook of Drought Indicators and Indices. Genebra.
WTO, World Trade Organization (2010). World Trade Report 2010: Trade in Natural
Resources. Genebra.