O papel dos meios de comunicação social na procura da verdade e na construção de
narrativas sobre o passado (cobertura noticiosa) pode mudar ao longo do tempo,
especialmente durante a transição. Por exemplo, Nagy e Gillespie (2015) concluem que
a atitude dos meios de comunicação social mudou relativamente à cobertura noticiosa
dos abusos cometidos em escolas residenciais indianas no Canadá. No entanto, salientam
também que a cobertura jornalística "ainda está muito aquém de desafiar os canadianos
a pensar nas escolas residenciais indianas em termos expansivos que enquadram a
reconciliação como exigindo descolonização e mudança sistémica" (2015: 37).
Tradicionalmente, os meios de comunicação social têm assumido um dos papéis mais
significativos na investigação das condições em que têm ocorrido violações dos direitos
humanos (Barbeito 2009: 47). No passado, o monopólio da verdade mediada estava com
jornalistas e poderosas organizações noticiosas, mas, com a transformação dos meios de
comunicação social e a expansão da cobertura noticiosa liderada pelos cidadãos, este
domínio também está em constante evolução. O papel dos meios de comunicação já não
parece centrar-se apenas em dar notícias, mas em oferecer contexto às histórias e criar
narrativas. Além disso, existem atualmente vários atores que partilham a
responsabilidade pela verdade em lugares de transição: os atores envolvidos no conflito,
os media e, devido à emergência dos media sociais e outras novas tecnologias, os
cidadãos também. Nos últimos anos, surgiram novas plataformas e aplicações móveis
para ajudar os cidadãos a descobrir estes tipos de abuso, tais como a Inteligência Popular
(PI) e a Testemunha Ocular, que procuram encriptar vídeos e proteger os autores para
poderem utilizar estes dados como prova em processos judiciais.
5. Rumo à sociedade: responsabilidade e liberdade de imprensa
Dois dos aspetos críticos num processo de justiça transitório são as iniciativas para
desvendar a verdade e os mecanismos de responsabilização. A justiça transicional
geralmente olha para os atores tradicionais nos conflitos, tais como grupos armados e
forças controladas pelo Estado, mas também pode olhar para terceiros, tais como
empresas comerciais e os meios de comunicação social. À medida que o campo se
expande, o desempenho destes atores terceiros também está a ser responsabilizado.
Além disso, existem alguns precedentes desta prática nos anos 90, na África do Sul e no
Ruanda. Uma das audições institucionais realizadas na TRC na África do Sul estudou o
papel dos media, e o caso dos media no Ruanda (The Prosecutor v. Nahimana,
Barayagwiza e Ngeze) é um dos casos mais conhecidos de responsabilização dos meios
de comunicação social. Neste caso, três indivíduos ligados à Radio Télévision Libre des
Mille Collines (1993-4) e ao boletim informativo Kangura (1990-95) foram processados,
alegadamente como sendo os mentores por detrás de uma campanha mediática para
dessensibilizar a população Hutu e incitá-los a assassinar a população Tutsi. Em 2003, a
Câmara de Julgamento considerou os três arguidos culpados de genocídio, conspiração
para cometer genocídio, incitação direta e pública a cometer genocídio, perseguição e
extermínio como crimes contra a humanidade (Thomson 2007). Contudo, após vários
recursos e erros processuais, a Câmara de Recursos inverteu alguns aspetos do
Julgamento e absolveu os três da conspiração para cometer genocídio e extermínio como
um crime contra a humanidade. Dois dos acusados ainda foram considerados culpados
de incitação direta e pública à prática de genocídio. Embora a maioria dos casos de